Os desafios da Sonae Sierra, proprietária de 35 centros comerciais, são enormes, diz Elsa Monteiro, diretora de Sustentabilidade. Na Península Ibérica, toda a eletricidade que compram é 100% renovável
Na Sonae Sierra, o compromisso com a sustentabilidade e o ambiente é uma “longa história”, garante Elsa Monteiro, diretora de Comunicação Corporativa e Sustentabilidade. Começou há 25 anos, em 1995, quando a empresa internacional de imobiliário, proprietária de mais de 35 centros comerciais com um valor de mercado de cerca de 7 mil milhões de euros, foi uma das fundadoras do World Business Council for Sustainable Development.
Até 2018, a empresa reduziu as emissões de gases com efeito de estufa em 79%, o consumo de eletricidade em 47%, o consumo de água em 23% e a taxa de reciclagem de resíduos cresceu 239%.
Agora, com a Europa a garantir que chegará à neutralidade carbónica em 2050 e que reduzirá as emissões poluentes em 55% até 2030, o setor imobiliário está, tal como outras indústrias, “sob enorme pressão para se tornar cada vez mais sustentável e é chamado a tornar-se um player mais dinâmico no campo da ação climática e levado a harmonizar, cada vez mais, os seus objetivos de negócio com as suas metas de sustentabilidade. Os investidores e os operadores imobiliários são, por isso, induzidos a estabelecer requisitos ambientais mais ambiciosos do que a própria legislação”, refere Elsa Monteiro.
Em Portugal, a Sonae Sierra arrancou o ano de 2020 com dois dos seus centros comerciais — Colombo e Vasco da Gama — a aderirem ao Compromisso Lisboa Capital Verde Europeia 2020 para implementar medidas sustentáveis adicionais, de modo a contribuir para a sustentabilidade ambiental, a adaptação e a mitigação das alterações climáticas e a eficiência energética e hídrica. Em junho, a empresa anunciou que foi uma das 155 multinacionais a assinar a declaração “Recovery Better”, promovida pela iniciativa Science Based Targets, pelo Global Compact das Nações Unidas e pela We Mean Business Coalition, que pretende instar os governos de todo o mundo a integrar a ação climática nos seus planos de recuperação económica pós-pandemia de Covid-19.
“A sustentabilidade está no centro da estratégia da Sonae Sierra e empenhamo-nos para que as nossas operações em todos os mercados onde estamos presentes minimizem o impacte ambiental e sejam seguras”, acrescentou a diretora de Comunicação Corporativa e Sustentabilidade.
Até 2025, a empresa quer: reduzir das emissões de âmbito 1 e 2 para 16,78 kg de CO2 equivalente por m2; aumentar a eficiência elétrica para 311 kWh por m2 dos ativos operacionais; garantir a aplicação de uma estratégia de adaptação às mudanças climáticas; e garantir o fornecimento de energia, reduzindo a dependência de serviços públicos e aplicando tecnologias de energia renovável em ativos próprios.
Já há uns anos que desenvolvemos um projeto – o Bright – que permite que para cada empreendimento se calcule o que é um consumo ótimo ou ideal face ao tipo de edifício, ao tipo de clima em que está inserido com toda a operação que tem, se está aberto todos os dias, qual é horário de funcionamento, até dos lojistas que tem, e comparando com o real, nós conseguimos identificar as medidas mais eficazes.
Aos dias de hoje como é que a sustentabilidade está no negócio?
Inicialmente, focámo-nos mais nas questões ambientais, de eficiência energética, resíduos, poupança de água, entre outras. Eram o principal foco das operações. Nos últimos anos, a nossa estratégia tem-se focado na criação de valor partilhado, ou seja, criar um valor para o negócio, enquanto ajudamos a resolver desafios sociais e ambientais que se colocam. Esta é a forma de conseguirmos, a longo prazo, aumentar a resiliência do próprio negócio. Nós pretendemos que essa criação de valor partilhado tenha tradução em todas as áreas do nosso negócio. Atua desde a fase de conceção de projetos, a sua produção e também na componente de prestação de serviços.
A eficiência energética é um tema muito importante para nós, porque é um dos que tem mais impacto em termos de organização. Já há uns anos que desenvolvemos um projeto – o Bright – que permite que para cada empreendimento se calcule o que é um consumo ótimo ou ideal face ao tipo de edifício, ao tipo de clima em que está inserido com toda a operação que tem, se está aberto todos os dias, qual é horário de funcionamento, até dos lojistas que tem, e comparando com o real, nós conseguimos identificar as medidas mais eficazes. Com o projeto Bright, que já ganhou prémios internacionais, conseguimos resultados interessantes nos centros comerciais em que o estamos a implementar.
Portugal já tem este projeto Bright?
Sim, temos vários exemplos, nomeadamente em alguns centros comerciais, como o Colombo, em que implementamos o projeto Bright e conseguimos resultados através de um dos principais sistemas que contribuiu para o consumo energético de um centro comercial: o ar condicionado e a renovação do ar. E só por fazermos este upgrade no centro Colombo, em que otimizamos os horários de funcionamento, definimos um modelo que gere a ventilação, a renovação do ar, a gestão da temperatura com as condições externas do ar e também com o nível de ocupação, conseguimos uma poupança anual de 56 mil euros só em custos de eletricidade. No Leiria Shopping também fizemos várias melhorias. Primeiro, este centro comercial foi concebido cumprindo os nossos standards ambientais e por isso foi logo à partida classificado como nível A no certificado de eficiência energética. Mas mesmo assim, sendo do nível A, nós conseguimos depois implementar medidas que ainda reduziram em 27% o consumo de energia anual. A nossa filosofia é procurar todos os edifícios que são projetados e construídos já adotem as melhores práticas, incluindo todos os sistemas de ar condicionado e de iluminação mais eficientes.
Apostam na instalação de painéis solares nas coberturas dos centros comerciais, para autoconsumo?
Temos alguns exemplos. As coberturas dos nossos centros comerciais têm diferentes ocupações, por exemplo o Norte Shopping tem o parque de estacionamento, o Colombo tem a parte do ginásio, tem as duas torres de escritório e irá ter ainda uma terceira torre. Portanto, a área disponível para fotovoltaicos não é muito grande. Até uma determinada altura, há cerca de 2 anos, como era imposta a venda de energia à rede, de cada vez que instalávamos painéis fotovoltaicos o investimento não compensava. A partir do momento em que há autoconsumo, o que já estamos a estudar, neste momento temos já um projeto em curso em Portugal. Mas exige uma grande área disponível. Só para ter uma ideia, por exemplo, no centro Vasco da Gama se quiséssemos contribuir para uma parte de consumo de eletricidade precisávamos de 40 mil metros quadrados de área fotovoltaica. Portanto, não é possível instalar.
Qual é o consumo médio de energia de um centro comercial?
Nós não falamos em consumos médios ou totais, mas sim em consumos por metro quadrado. Os centros comerciais têm um consumo significativo de energia. Não só aquela energia das áreas comuns, que nós controlamos, mas também o consumo de energia de cada uma das lojas que é da responsabilidade de cada lojista. No conjunto, um centro comercial como o Colombo consome energia equivalente a uma cidade pequena.
Para edifícios grandes como os nossos é muito mais eficaz ter um produção de energia renovável que forneça energia a uma área, do que ter edifício a edifício a produzir energia. Nós estamos a explorar essa via. De qualquer maneira, para a nossa atividade ou para as nossas empresas não há nenhum financiamento ou apoio. São investimentos grandes.
Onde estão a estudar a instalação de painéis fotovoltaicos?
Nós estudamos essa possibilidade em todos os nossos imóveis. Neste momento, ainda não está completamente decidido avançar. Temos parceiros em vários centros, por isso a decisão de investimento tem de ter o acordo de todos. Mas estamos a estudar em todos os centros que temos em Portugal. O nosso foco principal foi a eficiência energética e agora estamos a tentar complementar com a questão dos fotovoltaicos. Além disso, toda a energia elétrica que compramos na Península Ibérica é 100% renovável, tanto que a nossa pegada ecológica de âmbito 2 nesses centros comerciais já é zero. Nós temos no âmbito 1 a energia que produzimos diretamente, é uma percentagem muito pequena, e é essa que estamos a tentar agora ver se conseguimos compensar com os fotovoltaicos, seguindo a linha de orientação da Europa e compensar a eficiência energética com a produção.
Pessoalmente, não sou grande apologista da produção eletricidade on site, porque acho que é menos eficiente ter produções de nível 1, porque Nós estamos a explorar essa via. De qualquer maneira, para a nossa atividade ou para as nossas empresas não há nenhum financiamento ou apoio. São investimentos grandes. Claro que o mercado está a evoluir e o preço desse tipo de equipamentos também está a evoluir, mas a situação é diferente, mesmo quando o foco principal, pelo menos do que eu percebi do Governo, é a habitação e não edifícios comerciais, o que no meu ponto de vista em termos individuais somos os que mais contribuem ou mais consomem.
A nível de novos projetos, de investimentos que estejam a fazer em novos empreendimentos imobiliários, há algum topo do gama na parte energética que queira destacar?
Quando fazemos um novo edifício procuramos sempre que cumpra os standards ambientais ou de sustentabilidade mais avançados. Por exemplo, a nova torre que esperamos avançar junto ao Colombo irá ser o mais eficiente em termos energéticos e queremos que seja certificada com um rating Very Good, pelo menos. Isso significa que já incorporará tudo o que são as práticas mais recentes de sustentabilidade, não só ao nível de energia mas também ao nível da gestão da água, proteção de trabalho na torre, garantir condições de qualidade na área interior, as condições de segurança. Tudo isso são requisitos que nós temos no âmbito da sustentabilidade. Não é só a energia. Também a ligação à mobilidade, veículos elétricos. Tudo isso contribui para o que vai ser, por exemplo, a nova torre. O Norte Shopping, por exemplo, foi o primeiro a ter o certificado Green Building em Portugal, logo quando foi construído. Por isso, procuramos manter atual o seu estatuto de edifício sustentável. No Colombo fazemos a renovação de ar de forma natural. Não é só fazer bem os edifícios, é também saber geri-los e nesse ponto de vista a Sonae Sierra tem muitos anos de experiência e um grande track record em termos de gestão.
Sentem que o vosso setor imobiliário está um pouco sob pressão para se tornar mais sustentável, para ter melhores práticas?
Eu julgo que o imobiliário é um dos focos de intervenção de todas as políticas europeias em termos de sustentabilidade. Mas também temos de ter consciência de que o peso dos edifícios é significativo, mas compará-lo a outros setores é relativo. Portanto, as políticas de intervenção têm sido mais ao nível de setores da indústria e transportes, nos quais o contributo para as emissões é muito mais significativo do que o dos edifícios. Mas os edifícios estão sob pressão. Sempre procurámos estar à frente e vamos querer continuar estar.
Isso traz constrangimento ao negócio?
É uma oportunidade para o negócio. Claro que vai requerer grandes investimentos. Queremos ter um sistema de ar condicionado mais eficiente, e o custo de o renovar é alto e há coisas que não se resolvem ao nível da gestão. Há coisas que é preciso fazer, como substituir equipamentos e isso vai acontecer. Nos nossos é menos, porque vamos atualizando progressivamente, mas para outros operadores ou outros proprietários de edifícios que há 30 anos que não renovam estes sistemas, o investimento vai ser grande. Há estimativas a nível europeu de investimentos muito avultados que serão necessários para responder àquilo que são as mudanças necessárias devido às alterações climáticas. No nosso caso, consideramos que é uma oportunidade de alavancarmos ainda mais o que temos vindo a fazer e de podermos alinhar todas as partes alinhadas nisso, porque já não vamos ser os únicos a puxar a carroça.
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“Um shopping como o Colombo consome energia equivalente a uma cidade pequena”
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