Só a construção resistiu à crise pandémica. Comércio, alojamento e restauração arrasados
O setor da construção foi o único que conseguiu crescer no ano passado, em contraciclo com a crise. Já o setor do comércio, alojamento e restauração foi o mais afetado pela pandemia.
O setor da construção cresceu 3,3% no mesmo ano em que a pandemia ditou uma quebra história de 7,6% da economia nacional. Segundo os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), o VAB (valor acrescentado bruto), que traduz a riqueza criada por cada setor, da construção foi o único a crescer em 2020. Os restantes registaram fortes quedas com destaque para o setor do comércio, alojamento e restauração com uma quebra de 12,7%.
“O VAB do ramo Construção foi o único que aumentou em 2020, com uma taxa de variação de 3,3% (5,1% no ano anterior), o que resultou num contributo de 0,1 pontos percentuais para a variação do VAB total”, revela o gabinete de estatísticas no destaque divulgado esta sexta-feira em que confirma a maior contração do PIB da democracia. No seu conjunto, o VAB caiu 6,4% em 2020.
O INE também nota que apenas o investimento em construção aumentou (+4,8%, o que se traduziu em mais 835,3 milhões de euros). Contudo, esta subida foi ofuscada pelas quedas expressivas do investimento em equipamento de transporte e máquinas e equipamentos pelo que no total o investimento na economia portuguesa desceu 4,9%. O investimento em produtos de propriedade intelectual também caiu ligeiramente no ano passado.
A evolução do setor da construção em 2020 poderá ser explicada por vários fatores, entre eles o menor nível de restrições para este setor (que nunca fechou, mesmo durante os confinamentos mais apertados) e o crescimento nos últimos anos dos projetos em preparação fruto do aumento da procura por habitação (e dos preços do imobiliário).
Num momento em que o mercado de trabalho também é afetado pela pandemia (ainda que menos do que o esperado), o dinamismo deste setor provocou uma subida de 3,7% dos salários dos trabalhadores da construção para uma média de 1.010 euros brutos, segundo os dados do Gabinete de Estratégia e Planeamento (GEP) do Ministério do Trabalho relativos a julho do ano passado.
Construção e turismo reagem de forma diferente à crise pandémica e à financeira
O crescimento do setor da construção foi positivo, principalmente por ser em contraciclo com o resto da economia, mas o seu efeito é limitado em 2020: os 244,6 milhões de euros que adicionou ao VAB foram “esmagados” por quedas históricas nos outros setores da economia portuguesa. Desde logo, o setor do comércio, alojamento e restauração “destruiu” 4,49 mil milhões de euros de riqueza em 2020, atingindo um mínimo de 2014.
Esta reação dos setores à crise pandémica contrasta completamente com o que tinha acontecido há dez anos. Pela sua natureza, com o distanciamento social a afetar mais a atividade económica presencial, o comércio, alojamento e restauração (normalmente considerados como “turismo”) foi o setor mais impactado pela pandemia quando no pós-crise financeira de 2008/2009 tinha sido o setor mais dinâmico, com um contributo decisivo para a recuperação da economia portuguesa.
Já o setor da construção foi o mais afetado na anterior crise com o fecho da torneira do crédito no sistema financeiro português e a queda dos preços do imobiliário provocado por uma menor procura e, consequentemente, houve menos construção num mercado em que a oferta abundava. Além disso, o país quase que parou de construir infraestruturas novas, como estradas, o que aprofundou a quebra do VAB da construção. Desde 2016 que essa tendência inverteu, mas continua bem abaixo dos valores de 2000 a 2010.
Evolução do VAB por setor entre 2019 e 2020
Atividades de serviços e indústria mais penalizados pela pandemia
Logo a seguir ao comércio, alojamento e restauração surgem as outras atividades de serviços que englobam variados setores da economia, como por exemplo os ginásios, os cabeleireiros, a reparação de bens e até as funerárias. O VAB deste agregado registou uma quebra de 6,4%, o que corresponde a menos 3,3 mil milhões de euros num só ano.
A terceira maior queda é protagonizada pela indústria com uma quebra de 7,7%, menos 1,97 mil milhões de euros face a 2019. Este setor, na sua maioria, também nunca esteve fechado, mas foi mais afetado pela crise do que a construção uma vez que a queda histórica do consumo privado teve impacto nas encomendas das fábricas. O setor dos têxteis e calçados, por exemplo, foi dos mais afetados com a menor necessidade de roupa nova num período em que as pessoas ficaram muito mais tempo em casa.
Seguem-se os transportes e armazenamento e as atividades de informação e comunicação com uma redução de 5,7%, menos 883 milhões de euros. E depois a energia, água e saneamento com uma queda de 7,3%, menos 465 milhões de euros, o que deverá refletir a redução do consumo de eletricidade no país como um todo — o consumo residencial aumentou, mas o da indústria e comércio desceu.
Por último, surge a agricultura, silvicultura e pesca contraiu 9% (menos 363,9 milhões de euros) e as atividades financeiras (banca), de seguros e imobiliárias com uma queda ligeira de 0,1% (menos 34 milhões de euros).
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
Só a construção resistiu à crise pandémica. Comércio, alojamento e restauração arrasados
{{ noCommentsLabel }}