Metade da conta da luz são impostos? “É falso”, diz Galamba
O Eurostat diz que as taxas e impostos pesam 47% na fatura elétrica em Portugal. Galamba contesta o gabinete de estatística da UE, diz que são apenas 19% porque os CIEG não contam como carga fiscal.
O secretário de Estado da Energia, João Galamba, contesta a forma como o Eurostat contabiliza os Custos de Interesse Económico Geral (CIEG) — onde se inclui o sobrecusto com as renováveis, os CMEC — para a componente de taxas e impostos que pesa sobre a fatura de eletricidade dos consumidores portugueses.
De acordo com a análise publicada pela Entidade Reguladora para os Serviços Energéticos (ERSE), na sequência do mais recente boletim da OCDE divulgado no final de abril, sobre os preços da eletricidade na União Europeia, salta à vista que quase metade, ou 47%, da fatura de luz das famílias portuguesas diz respeito a taxas e impostos.
“A componente de taxas e impostos publicada pelo Eurostat apresenta para Portugal um peso de 47% do preço total pago pelos consumidores. É a terceira mais elevada da Europa, essencialmente devido aos designados Custos de Interesse Económico Geral (CIEG), que resultam de opções de política energética e que representam 28% do preço final no segmento doméstico. A componente de energia e redes mantém-se entre as mais reduzidas da União Europeia, correspondendo a 53% do preço final”, sublinha a ERSE no seu boletim.
“É falso”, defendeu João Galamba na sua intervenção durante a apresentação do estudo “Uma nova política fiscal para a transição energética de Portugal”, realizado pela consultora Deloitte, em parceria com a APREN e com diversas empresas do setor energético.
E explicou porquê: “Os CIEG não são taxas nem impostos sobre o consumo de energia elétrica, como o IVA ou a Contribuição Audiovisual, que são cobrados na fatura de eletricidade. Inserem-se numa categoria de custos mais complexa mas estão erradamente incluídos na dimensão de fiscalidade energética”.
De acordo com a ERSE, os CIEG “são os custos com a política energética do país”, nos quais se incluem as rendas pagas pelas empresas de eletricidade aos municípios, os sobrecustos com a produção de eletricidade através de fontes de energia renováveis e não renováveis ou ainda com a convergência tarifária entre Portugal continental e as Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira. Na prática “não são custos regulados pela ERSE, mas são repercutidos no preço final a pagar pelos consumidores, na fatura de eletricidade”, frisa o regulador.
Olhando para as contas do Eurostat, e para a decomposição de preços de eletricidade dos consumidores domésticos, caso os CIEG não estivessem então integrados na componente de taxas e impostos, como defende João Galamba, Portugal não surgiria no contexto europeu com metade da fatura tomada pela carga fiscal. Nesse caso, seria apenas um quinto (19%) da conta da luz para impostos e taxas, muito abaixo da média europeia (41%), da Dinamarca (67%), da Alemanha (52%) e de Espanha (45%), que ocupam o pódio.
Sobrecusto das renováveis pode virar sobreganho em 2021, diz Galamba
Sobre o polémico sobrecusto com as renováveis (que em 2020 representaram a maior fatia — 26,7% — dos CIEG, de acordo com a ERSE), o governante diz que “é uma espécie de seguro” que os portugueses pagam todos os meses na fatura e que “sai em seu benefício” nos anos, como parece ser o caso de 2021, em que os preços da eletricidade no mercado grossista estão mais altos.
Os números da ERSE mostram, no entanto, que em 2020 mais de um terço do valor que as famílias pagaram todos os meses na sua fatura de eletricidade disse respeito aos CIEG. De acordo com o regulador, estes custos pesam assim 37% nos preços pagos pelos clientes. Só nos últimos oito anos, os portugueses já pagaram nas suas faturas quase 11 mil milhões de euros por causa deste sobrecusto, revelou a ERSE ao ECO/Capital Verde.
Apesar disso, João Galamba faz uma análise bem diferente: “Ao contrário de outros países, como a Polónia, por exemplo, que quase não tem renováveis, Portugal tem uma almofada que protege o país do aumento dos preços da eletricidade. Com os preços atuais acima dos 80 euros — e no verão vão subir ainda mais –, com estas fortes subidas do preço da eletricidade, o sobrecusto da PRE vai reduzir este ano e vai acabar por impactar o valor final a pagar pelos consumidores. E não houve aqui nenhuma alteração fiscal”, disse Galamba. E frisou que “podemos ter pela primeira vez em 2021 o cenário de o sobrecusto das eólicas tornar-se num sobreganho”.
Em 2020, no entanto, o cenário foi precisamente o oposto. Com os preços da energia elétrica em forte redução no mercado grossista no ano passado (a rondar os 40 euros), e as tarifas garantidas aos produtores de renováveis a manterem-se inalteradas, o sobrecusto aumentou e fez disparar em “10,3% a tarifa de Uso Global do Sistema, resultado do aumento dos Custos de Interesse Económico Geral (CIEG), acentuado pelo forte acréscimo do diferencial de custos com a aquisição de energia a produtores em regime especial”, ou seja, o sobrecusto com as energias de origem renovável.
Na prática, é em grande parte este sobrecusto com as renováveis, que os consumidores de eletricidade pagam todos os meses na sua fatura, que está a impedir que os preços da luz sigam a tendência de descida dos últimos anos. Neste momento está ainda por pagar uma dívida acumulada com a chamada Produção em Regime Especial (PRE) no valor de 2.374 milhões de euros, mostram os números do regulador. Para 2021, o valor total do sobrecusto PRE previsto pelo regulador é de 1,8 mil milhões de euros.
Depois de ter proposto, em outubro de 2020, que as tarifas de eletricidade não deviam mexer um cêntimo em 2021, dois meses depois a ERSE veio afinal propor uma descida de 0,6% nos preços de venda a clientes finais para famílias e pequenos negócios. A descida não foi além deste valor por causa do aumento considerável dos Custos Económicos de Interesse Geral (CIEG), com especial destaque para o sobrecusto das renováveis.
Há ainda a somar à fatura da luz um outro diferencial de custo: o das centrais com CAE, que resulta da diferença entre a diminuição do preço de energia elétrica em mercado e da menor produção dessas centrais, principalmente da central a carvão do Pego, gerando uma forte quebra das receitas, que também é compensada pela tarifa de uso global do sistema. E paga pelos consumidores nas faturas mensais.
Estes dois “custos são fixos por representarem garantias de receitas ou de preços, independentes do contexto económico e financeiro.
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