Mais de 100 mil empresas beneficiaram do lay-off simplificado, mas pouco mais de 300 aderiram ao plano de formação que lhes daria uma bolsa extra de 132 euros, revela presidente do IEFP ao ECO.
Apesar de mais de 100 mil empregadores terem aderido ao lay-off simplificado, só 343 — abrangendo “12.000 participantes” — aderiram ao plano de formação que garante uma bolsa complementar de 132 euros. Este número é adiantado pelo presidente do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP), que, em entrevista ao ECO, admite que “muitas empresas de menor dimensão possam ter tido pouco conhecimento da medida” e que os outros apoios possam ter suscitado “maior interesse” junto dos empregadores em crise.
O lay-off simplificado foi uma das grandes medidas lançadas pelo Governo em reação à pandemia. A medida tem possibilitado aos empregadores em crise suspenderem os contratos de trabalho ou reduzirem os horários, ao mesmo tempo que lhes garante um apoio para os salários e a isenção de contribuições sociais. Ao longo de 2020, o lay-off simplificado foi sinónimo de cortes salariais para os trabalhadores, daí que o Executivo tenha previsto a possibilidade desta medida ser acumulada com um plano de formação aprovado pelo IEFP, sinónimo de uma bolsa complementar de 131,64 euros, repartida em iguais partes por empresa e trabalhadores. Essa medida tem tido, contudo, pouca adesão, indica o presidente do IEFP, em entrevista por escrito.
Por outro lado, António Valadas da Silva adianta ao ECO que foram recebidas 55 mil candidaturas ao incentivo à normalização da atividade empresarial, medida desenhada para suceder ao lay-off simplificado. Em 70% dessas candidaturas, a decisão foi proferida em menos de seis dias.
O responsável do IEFP fala também do programa Ativar.pt e da evolução do desemprego, além de salientar que as medidas extraordinárias lançadas pelo Executivo de António Costa têm revelado, “sem dúvida, uma grande eficácia”.
Entre março de 2020 e fevereiro de 2021, mais de 308 mil indivíduos inscreveram-se no IEFP, após terem visto o seu trabalho não permanente terminar. As medidas desenhadas para “salvar” postos de trabalho deveriam ter tomado particular atenção aos trabalhadores precários, já que são, tipicamente, as situações mais frágeis?
Deixe-me referir que o “fim de trabalho não permanente” tem sido o principal motivo de inscrição nos serviços de emprego. Se olharmos para a situação no ano de 2019, ainda sem o impacto da Covid-19, verificamos que o “fim de trabalho não permanente” já representava 46% das novas inscrições de desempregados, situação que ganhou maior expressão sobretudo por via dos setores mais atingidos pela pandemia.
Infelizmente, em momentos de conjuntura desfavorável, os trabalhadores com contratos a termo são os primeiros a sair do mercado, o que explica que o “fim de trabalho não permanente” tenha passado a ter uma expressão mais significativa no conjunto das inscrições nos serviços de emprego (54% no total das inscrições registadas entre março de 2020 e março de 2021). Sublinhe-se que as medidas extraordinárias adotadas foram e continuam a ser muito importantes para as empresas e para os trabalhadores que delas beneficiaram, permitindo manter a sua atividade ainda que reduzida e, bem assim, manter os postos de trabalho.
As medidas adotadas no nosso país para minimizar os efeitos desta crise sem precedentes revelaram sem dúvida uma grande eficácia.
O segundo motivo mais recorrente para as inscrições no IEFP, nos primeiros 12 meses de pandemia, foram os despedimentos. Isto apesar de os vários apoios extraordinários ao emprego terem como condição a proibição de despedimentos coletivos, por extinção do posto de trabalho e por inadaptação. Poderia ter sido feito mais para “salvar” postos de trabalho e evitar o agravamento do desemprego?
Importa referir que a pandemia afetou toda a economia mundial, foi um acontecimento imprevisível e excecional de que não havia memória recente e obviamente nas diferentes fases da sua evolução teve inevitáveis consequências a todos os níveis quer na Europa, quer no resto mundo. Ora, julgo que é hoje consensual que as medidas adotadas no nosso país para minimizar os efeitos desta crise sem precedentes revelaram, sem dúvida, uma grande eficácia, designadamente na contenção de uma situação em que o risco de aumento do desemprego era muito elevado.
Importa, no entanto, referir que o peso dos despedimentos nas novas inscrições aumentou de facto nos meses de março, abril e maio de 2020, mas regressou, entretanto, a variações observadas habitualmente, o que sugere que o acesso às medidas extraordinárias de apoio às empresas e à manutenção do emprego e a aplicação dos respetivos condicionalismos teve efeito na mitigação dos despedimentos.
A propósito do lay-off simplificado, estava prevista a possibilidade desse regime ser acompanhado de planos de formação organizados pelo IEFP. Quantas empresas contaram com esses planos de formação?
Até ao passado 19 de abril, tinham sido deferidas 343 candidaturas, abrangendo cerca de 12.000 participantes.
Advogados e contabilistas têm dito que esses planos de formação foram sendo esquecidos. O que justifica a fraca adesão a esta medida?
A divulgação desta medida às empresas contou com uma sessão de apresentação específica, em articulação com a Ordem dos Contabilistas, em que participou uma vasta audiência de contabilistas, que aliás tiveram um papel muito importante na divulgação da medida junto das empresas. Apesar de tudo, admite-se que muitas empresas de menor dimensão possam ter tido pouco conhecimento da medida, mas estamos em crer que a razão primeira se ficou a dever à existência simultânea de outras medidas para apoio às entidades e que num dado momento suscitaram o seu maior interesse.
Certamente que o aumento das ofertas de emprego captadas pelo IEFP ultimamente são um indício positivo da recuperação económica.
Portugal está a desconfinar. Antecipa uma recuperação do emprego ou uma vaga de despedimentos, uma vez que as empresas estão a perder agora acesso ao lay-off simplificado?
As principais previsões sobre a economia portuguesa apontam para uma retoma gradual da atividade económica. Estima-se que esta retoma se possa iniciar já com algum vigor em 2021, embora a recuperação plena não seja esperada antes de 2024/2025. A evolução das taxas de desemprego acompanhará de perto esta tendência.
Quer isto dizer que se espera que, após o confinamento, a progressiva retoma da atividade económica, sobretudo nos setores mais afetados, deverá ocorrer numa situação de maior normalidade que, tudo o parece indicar, dispensará medidas de apoio como por exemplo o lay-off simplificado e o incentivo à normalização. Certamente que o aumento das ofertas de emprego captadas pelo IEFP ultimamente são um indício positivo da recuperação económica que necessitamos e procuramos potenciar.
Considera que estão criadas as medidas suficientes para segurar o emprego nesta nova fase de luta contra a crise pandémica?
Estão em vigor diversas e importantes medidas de apoio aos empregadores, para fazer face ao difícil contexto que atravessamos. Relativamente às medidas de apoio à manutenção de postos de trabalho, estou certo que as mesmas se manterão enquanto se justificarem, porventura ajustadas à nova fase da evolução da pandemia.
O IEFP já pagou 97% do valor aprovado [no âmbito do incentivo extraordinário à atividade empresarial].
A bastonária da Ordem dos Contabilistas Certificados chegou a alertar, no início de 2021, que o pagamento da segunda tranche do incentivo à normalização estava atrasado. A situação já está regularizada? O que justificou esses “atrasos”?
O IEFP tem mantido uma cooperação institucional com a Ordem dos Contabilistas Certificados que só tem sido possível com a enorme vontade que ambas as partes demonstram em contribuir para a melhoria dos níveis de emprego. A medida que refere teve um volume muito elevado de candidaturas: Tivemos mais de 55 mil candidaturas e, destas, mais de 11 mil entraram mesmo no fim do ano. Acresce que o pagamento da segunda tranche, que envolveu quase 39 mil empresas, implicou a verificação do cumprimento das obrigações a que as entidades se encontravam vinculadas, nomeadamente a manutenção do nível de emprego e a proibição de desencadear despedimentos coletivos, por extinção do posto de trabalho ou por inadaptação. Ora, como calcula, este é um trabalho complexo e moroso e que muitas vezes implica o pedido de esclarecimentos, quando a informação suscita dúvidas.
Recordo que o IEFP mobilizou uma equipa técnica muito significativa para garantir que a análise, decisão e pagamento seriam efetuados com a maior celeridade – e assim aconteceu. Após a entrada da candidatura, a decisão foi proferida em menos de seis dias em 70% das candidaturas e o pagamento foi efetuado em menos de 11 dias a 62% das empresas e em menos de 20 dias a 87% das empresas.
Em síntese, o IEFP já pagou 97% do valor aprovado (cerca de 439 milhões de euros). As situações em que o pagamento ainda não foi efetuado são pontuais e correspondem a casos em que ainda não se atingiu a data para o pagamento da segunda tranche ou em que se aguardam elementos adicionais para poder prosseguir com o pagamento.
O Governo prepara-se para lançar um novo incentivo à normalização da atividade empresarial. Quantas empresas estima o IEFP irão pedir esta medida?
Em 2020 tivemos uma adesão muito significativa de mais de 55 mil empresas. O contexto pandémico, a evolução do confinamento e da crise económica que caracterizam estes primeiros meses aconselham equacionar um cenário com uma adesão semelhante, embora o universo de potenciais beneficiários deste novo incentivo possa vir a ser distinto do primeiro bem como as próprias condições de elegibilidade.
De acordo com os últimos dados [do Ativar.pt], tinham sido aprovadas cerca de 8.700 contratações e, destas, cerca de 6.400 estavam já concretizadas.
Até ao momento, quantos contratos já foram celebrados ao abrigo do incentivo Ativar.pt? E em que setores foram celebrados mais contratos?
Esta é uma informação que está em constante mutação todos os dias, porque as aprovações são diárias. Em qualquer caso, sabemos, de acordo com os últimos dados, que tinham sido aprovadas cerca de 8.700 contratações e, destas, cerca de 6.400 estavam já concretizadas.
Há uma relativa dispersão pelos diferentes setores, mas tomando como referência estes cerca de 6.400 contratos já celebrados, aqueles em que proporcionalmente se celebraram mais contratos foram o Comércio a Retalho (9,7%), com exceção dos veículos automóveis e motociclos, a Indústria do Vestuário (9,3%), o Comércio por Grosso (6,9%), com exceção dos de veículos automóveis e motociclos, e Restauração e Similares (6,7%).
Que avaliação faz dessa medida e entende que tem potencial para se tornar definitiva de modo a fomentar a conversão de contratos a termo em contratos sem termo?
A execução da medida Incentivo Ativar.pt tem-se revelado muito interessante. Esta medida teve um primeiro período de candidatura em 2020 e tem agora a decorrer, de 5 de fevereiro até 30 de junho, um segundo período de candidaturas, sendo que, em ambos os períodos, a adesão tem sido muito expressiva – tanto assim que tivemos de reforçar a dotação no primeiro período de candidaturas.
Aliás, se compararmos a procura do Incentivo Ativar.pt nestes dois períodos com os períodos de candidatura similares da medida de apoio à contratação que a antecedeu, o Contrato-Emprego, pode dizer-se que o número de candidaturas recebidas e o número de postos de trabalho aprovados no âmbito do primeiro concurso do Incentivo Ativar.pt atingiu valores mais elevados.
A medida dispõe de apoios financeiros muito interessantes, que foram reforçados em face do que se encontrava previsto na medida Contrato-Emprego, além de que há empresas para quem a crise atual não representou uma diminuição da sua atividade, até pelo contrário. Mas na verdade, a forma como a medida está desenhada e o valor dos apoios previstos tem justamente o objetivo de estimular a contratação sem termo, tanto mais que a grande maioria dos apoios aprovados são direcionados para este tipo de contrato. Tenho a maior expectativa que a medida se possa constituir como um excelente instrumento no apoio à contratação por tempo indeterminado.
O lay-off simplificado terá contribuído de forma decisiva para atenuar os efeitos desta crise e limitar o crescimento do desemprego.
A taxa de desemprego de 2020 ficou abaixo de todas as estimativas. O que explica essa evolução menos negativa do que se esperava?
O conjunto de medidas já elencado anteriormente, com destaque para a medida Apoio Extraordinário à Manutenção de contrato de trabalho (lay-off simplificado), terá contribuído de forma decisiva para atenuar os efeitos desta crise e limitar o crescimento do desemprego. Também a medida gerida pelo IEFP, o Incentivo Extraordinário à Normalização da Atividade Empresarial, teve um papel muito importante no apoio à economia e na manutenção do emprego.
Por outro lado, a possibilidade de recurso ao teletrabalho e a rápida adesão de empresas e trabalhadores a esta mobilidade de organização do trabalho também contribuiu para manter a continuidade da atividade de muitas empresas e até mesmo a sua adaptação a modelos organizacionais e de negócio diferentes, como por exemplo as vendas online ou para as entregas ao domicílio.
Acresce que muitos empreendedores e empresas exploraram novas oportunidades de negócio, reconvertendo-se para o exercício de outras atividades (por exemplo, para a produção de equipamentos de proteção) ou criando pequenos negócios e o seu próprio emprego. Da mesma forma, houve setores essenciais que durante a pandemia continuaram a contratar, contribuindo para a absorção de muitos trabalhadores que perderam o emprego em resultado da situação pandémica.
Ainda assim, de com os dados do INE, tem crescido, desde o início da crise pandémica, o universo de pessoas que, não tendo emprego, até estão disponíveis para trabalhar, mas não fazem essa procura ativa. O pode ser feito para reverter essa tendência?
Num contexto pandémico, marcado pelo receio de contágio da Covid-19, pelo encerramento de muitas atividades económicas, por medidas restritivas às deslocações e pelo dever geral de permanência no domicílio, torna-se particularmente difícil a procura de emprego, sobretudo num quadro em que a oferta é limitada – e a procura ativa de emprego é fundamental para que uma pessoa seja classificada como “desempregada”.
Neste momento, com o plano de desconfinamento e com a retoma progressiva das atividades económicas, estão reunidas as condições para que a procura ativa de emprego possa ser retomada, sendo que Serviços de Emprego continuarão de forma proativa a sua missão de apoiar os desempregados e a sua colocação no mercado de trabalho.
Estão previstas prioridades de investimento e modernização nos serviços de formação profissional, nas várias áreas de atividade, com especial relevo no âmbito dos setores de atividade ligados ao ambiente e à transição digital, mas também em setores considerados mais tradicionais.
O Governo apresentou, recentemente, o Livro Verde sobre o Futuro do Trabalho. Uma das linhas mestras identificadas nesse âmbito é lançar uma agenda estratégica de modernização e reforço da formação profissional, e em particular da formação contínua. No âmbito do IEFP, o que entende que pode ser modernizado e reforçado?
O mundo está confrontado com profundas mudanças sociais, económicas e culturais, que afetam a forma como trabalhamos, produzimos e comercializamos, sendo que a resposta a dar passa necessariamente por conferir uma nova prioridade à formação profissional.
Para os próximos anos, estão previstas prioridades de investimento e modernização nos serviços de formação profissional, nas várias áreas de atividade, com especial relevo no âmbito dos setores de atividade ligados ao ambiente (energias renováveis, eficiência energética e descarbonização) e à transição digital, mas também em setores considerados mais tradicionais, mas de extrema importância na economia nacional.
Por outro lado, importa promover uma cultura organizacional que permita aliar o planeamento estratégico da organização a uma cultura colaborativa que valorize os trabalhadores, desenvolva as competências internas e externas da organização alinhando a sua missão, visão e valores ao desenvolvimento contínuo das competências funcionais. Em síntese, há que continuar a melhorar e a modernizar as nossas respostas aos setores sobre os quais assente a nossa economia.
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