Mais de 40% dos profissionais ponderam deixar emprego. O que explica o “boom” das demissões
Temas que a pandemia trouxe para cima da mesa, como o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional, os projetos pessoais ou o burnout, estão a levar os profissionais a repensarem as suas carreiras.
Depois de um período de instabilidade, as pessoas tendem a manter-se no mesmo trabalho. Mas, passado um ano do estalar da pandemia da Covid-19, os profissionais, pelo menos nos Estados Unidos, começaram a dar sinais de que não estavam tão realizados profissionalmente como desejavam.
Em abril, quatro milhões de americanos, o que representa 2,7% dos trabalhadores ativos, deixaram os seus empregos. É um recorde no que toca a demissões, apenas ultrapassado pelos números registados em 2000.
Já a nível mundial, os números são também bastante expressivos: 41% dos profissionais estão a considerar deixar o seu emprego atual. Os dados pertencem a um inquérito realizado pela Microsoft e divulgado pela pela Morning Brew.
Estes número reforçam aquilo que tem vindo a ser apelidado de “boom” das demissões. “A época das demissões está a chegar. Há demissões reprimidas que não aconteceram no ano passado”, considera Anthony Klotz, professor na Texas A&M University.
Os especialistas indicam os temas que a pandemia da Covid-19 trouxe para cima da mesa, desde o equilíbrio entre a vida pessoal e a vida profissional às deslocações, passando também pelos projetos pessoais ou pelas questões de saúde, como os principais motivos que estão a levar as pessoas a repensar as suas carreiras.
Tudo isto pode fazer com que os profissionais virem as costas aos mais tradicionais empregos das 9h às 18h nos escritórios e procurem novas oportunidades e desafios, considera Anthony Klotz.
“Os trabalhadores que não gostavam dos seus trabalhos, mas que decidiram mantê-los durante a pandemia não vão mantê-los por mais tempo. As pessoas reavaliaram os seus percursos profissionais após um ano sem precedentes, o que permitiu uma maior reflexão“, pode ler-se na publicação norte-americana.
Outro dos fatores que os estudos revelam é a maior importância que os trabalhadores passaram a dar ao equilíbrio entre a vida pessoal e a vida profissional. “Muitos colaboradores não querem realmente demitir-se. Se as empresas os deixarem continuar a trabalhar a partir de casa ou fazer menos horas, manter-se-ão”, considera Anthony Klotz.
Regresso ao escritório? Wall Street divide-se
Mas nem todas as empresas estão a mostrar-se flexíveis em manter o teletrabalho ou aderir a modelos híbridos. Em Wall Street as empresas estão divididas, entre as que fazem pressão para os profissionais regressarem ao escritório e as que, à boleia disso, aproveitam para captar e reter talento com base nas políticas de flexibilidade.
Gigantes como o Goldman Sachs, a Morgan Stanley ou o JPMorgan têm mostrado serem mais severos no que toca aos modelos de trabalho. Querem as pessoas de volta ao escritório, mesmo que isso possa significar perder talento.
O CEO do Goldman Sachs, David Solomon, já está a chamar os funcionários de volta para o local de trabalho, alegando que a cultura de colaboração, inovação e aprendizagem só “prospera quando as pessoas se reúnem”. Já James Gorman, CEO da Morgan Stanley, enviou uma mensagem forte aos colaboradores do banco de investimento norte-americano: “Se podem ir a um restaurante, podem vir ao escritório”.
Enquanto grandes empresas do setor financeiro decidem o regresso e pressionam os funcionários, empresas como o Citigroup aproveitam as posturas mais rígidas dos seus rivais para se posicionarem como uma abordagem mais progressiva, híbrida e flexível, acreditando que tal os ajudará a caçar o melhor talento, avança o The Wall Street Journal.
Redefinir o sucesso
Mais do que demitir-se, as pessoas estão a redefinir o sucesso. As pessoas estão claramente a reavaliar as suas opções e o esgotamento é um dos motivos que, normalmente, é mencionado nas investigações para explicar este fenómeno. Um estudo realizado pela Asana, que envolveu 13 mil trabalhadores de oito países, descobriu que 71% tinha teve um esgotamento em 2020.
“Basicamente demos cabo da nossa força de trabalho no ano passado”, afirma Melissa Swift, líder global de transformação da força de trabalho na consultora de gestão Korn Ferry, citada pela Inc. “E uma das formas que as pessoas têm para lidar com o esgotamento é mudar de empregador.”
No entanto, o esgotamento não chega para explicar o “boom” das demissões. E acrescentar a todos os temas relacionados com os novos modelos de trabalho, Melissa Swift fala de uma redefinição coletiva de sucesso.
"Quando tantas partes das nossas vidas foram isoladas do mundo exterior – o que era verdade quer tivéssemos ou não a sorte de poder trabalhar em casa – também nos tornamos menos ligados à definição de sucesso do mundo.”
“O que a pandemia fez foi dar-nos tempo – muito tempo – para pensarmos sobre o que realmente valorizamos, e qual o lugar que assume o trabalho nas nossas vidas. Há algo mais profundo: uma redefinição coletiva do sucesso. Quando tantas partes das nossas vidas foram isoladas do mundo exterior – o que era verdade quer tivéssemos ou não a sorte de poder trabalhar em casa – também nos tornamos menos ligados à definição de sucesso do mundo.”
Segundo a especialista, estamos a assistir a um definição de sucesso mais satisfatória, intrínseca e sustentável, que acrescenta ao estatuto e ao dinheiro uma terceira métrica: o bem-estar, o que inclui resiliência e a capacidade de explorar a paz interior, a alegria e a satisfação.
“Saindo desta pausa forçada, os intangíveis da vida que fazem valer a pena tornaram-se muito mais tangíveis. Se as pessoas se ligaram a esta terceira métrica no último ano e meio, não estão dispostas a desistir. E, se o seu atual trabalho não o permite, estão dispostas a procurar outro”, finaliza a líder global de transformação da força de trabalho da Korn Ferry.
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