Com grande parte da população vacinada, centros de vacinação preparam desativação. Em Alcântara, "Expo" e Oeiras, o silêncio impera e, em alguns casos, há horários reduzidos e menos funcionários.
Portugal prepara-se para atingir a meta de ter 85% da população com a vacinação completa, pelo que há várias autarquias a prepararem a desativação dos centros de vacinação contra a Covid-19. Com grande parte da população vacinada, longe vão os tempos em que os enfermeiros não tinham mãos a medir para as enchentes de utentes. Nos centros de vacinação de Alcântara, do Parque das Nações e de Oeiras, a pouca afluência levou, em alguns casos, à redução de horários de funcionamento e de funcionários e o silêncio impera.
“Ultimamente tem estado pouca gente. São mais funcionários do que pessoas”, brinca uma funcionária da Proteção Civil, no centro de vacinação de Alcântara. Esta tendência, é, aliás, confirmada por uma das responsáveis deste centro. “Nós passámos por muitas fases. Passámos uma fase que o ritmo de vacinação foi crescendo consoante as vacinas que havia e, obviamente, atingimos um pico e depois fomos de alguma maneira decrescendo face às necessidades e ao número de população que ainda havia para vacinar”, explica Paula Ramos, ao ECO.
Com capacidade para 1.200 pessoas, no “pico” o centro de vacinação de Alcântara “esticou-se” ao máximo e chegou a vacinar 1.900 pessoas num só dia. Agora, com mais de 78% da população totalmente vacinada, a realidade é bem diferente. “Foram situações pontuais, quando houve aquela pressão em que se vacinou um milhão de pessoas numa semana. Nessa altura tivemos esses números, agora não temos”, conta António Sousa, também responsável pela gestão deste centro, acrescentando que na última segunda-feira vacinaram 472 pessoas.
Com o país na reta final do processo, em Alcântara houve já uma redução dos horários e de pessoal. Se em tempos o pavilhão da Ajuda chegou a funcionar até às 21h, agora não vai além das 17h e começou também a fechar aos domingos. Além disso, tanto a equipa de enfermagem como os colaboradores da autarquia foram reduzidos. Se no “pico” chegaram a ter 12 a 15 enfermeiros espalhados por 10 postos de vacinação, atualmente não vão além dos 10 enfermeiros para quatro postos de vacinação abertos. ” E a tendência será para reduzir cada vez mais até ser desmantelado o centro de vacinação”, aponta António Sousa.
Depois da azáfama provocada pela enchente de utentes, os últimos dias têm sido bastante calmos, com muitas cadeiras vazias no pavilhão da Ajuda. Perante este cenário, os profissionais deste centro sinalizam que a ideia será fechar portas a 25 de setembro, um dia antes das eleições autárquicas, isto apesar de não haver confirmação oficial. Questionada pelo ECO sobre o desmantelamento dos centros de vacinação, a task force referiu que “está a ser desenhado um plano para a desativação gradual dos CVC cujo início deverá coincidir com a meta dos 85% com esquema vacinal completo“, sem adiantar mais detalhes.
A situação é semelhante no centro de vacinação de Oeiras. Com capacidade para receber entre 3.000 a 3.500 utentes e 14 postos de vacinação disponíveis, no pico chegaram a vacinar 3.200 pessoas. Contudo, a escassez de “clientes” fez como que passassem a utilizar apenas 8 a 10 postos de vacinação, que “vão abrindo ou fechando de acordo com a afluência”, conta a enfermeira Helena Costa e Silva, ao ECO.
A redução começou há “cerca de 15 dias” e além do horário de funcionamento, que foi reduzido em duas horas (passou a fechar às 20h), teve também efeitos nos voluntários, bem como no pessoal administrativo e de enfermagem. “Tínhamos à volta de 30 enfermeiros e agora continuamos com dois turnos, mas temos 10 enfermeiros“, exemplifica a responsável.
A menor afluência é justificada pela alta percentagem de população vacinada, sendo que é mais sentida durante a semana. “Ontem [quarta-feira] vacinámos cerca de 800 pessoas. Comparativamente com as semanas anteriores está a ser mais fraco, mas é bom virem sempre pessoas para vacinar”, sublinha a enfermeira Helena, acrescentando que ainda aguardam diretrizes sobre o eventual desmantelamento.
Jovens, recuperados da Covid e pessoas para segundas doses são os maiores “clientes” desta altura
Ao contrário do que acontece em Alcântara e Oeiras, no centro de vacinação da Altice Arena, no Parque das Nações, os horários de funcionamento ainda se mantêm, ainda que seja o único centro dos quatro pertencentes ao agrupamento Lisboa Central a fazê-lo. Além disso, também a equipa de enfermagem e o pessoal administrativo se mantêm de pedra e cal, com oito a dez enfermeiros prontos a receber quem quiser aparecer.
Não obstante, e tal como sucede com os outros centros, os utentes que vão aparecendo durante a visita do ECO contam-se pelos dedos das duas mãos, pelo que as 100 cadeiras disponíveis estão praticamente vazias. “No pico, chegámos a vacinar mais de mil pessoas por dia. Ultimamente depende. Ao fim de semana, como ainda são segundas doses de faixas etárias mais jovens ainda temos algumas pessoas… Só no fim de semana passado administrámos cerca de 700 vacinas”, destaca a enfermeira Isabel Correia, responsável pela coordenação, ao ECO.
Nesse sentido, a responsável nota que “tem havido um decréscimo significativo” da afluência, que é especialmente sentido durante a semana. Atualmente, as pessoas que aparecem neste centro, são pessoas “que deixaram andar ou vieram agora porque estiveram de férias”, afirma. Este é, aliás, o caso de Ricardo Ferreira. “Estive fora de Portugal e só voltei agora. Por isso, vim agora tomar a vacina”, conta o jovem de 36 anos. Sobre o pouco movimento, diz, entre risos, que está “calmo, muito calmo, mas eficiente”. Uns metros mais à frente, também Tiago Ivo nota “uma diferença”. “Está muito menos gente do que na primeira dose”, sinaliza o adolescente de 16 anos que veio tomar a segunda dose da vacina, acompanhado pelo pai.
À semelhança deste centro, também em Alcântara e em Oeiras a maioria dos utentes que vão aparecendo são pessoas que estiveram de férias e não conseguiram tomar a segunda toma na data agendada, recuperados da Covid e jovens, muitos jovens. “Na altura, como não me encontrava em Lisboa, estava noutro local do país tentei levar a vacina no sítio onde estava, mas não era permitido à data levar noutro centro de vacinação e, portanto, só tive disponibilidade de vir hoje”, confessa Francisco Matias, ao ECO. Ainda no recobro, o jovem de 27 anos sente uma diferença face ao movimento que estava quando tomou a primeira dose. “Logo na sala de espera notou-se menos gente e agora aqui no recobro há muito menos também. Estou aqui na segunda fila, mas quando tomei a primeira dose estava ali nas últimas”, aponta, entre risos.
Vão também aparecendo algumas grávidas, uma vez que só no início de julho a DGS decidiu recomendar a administração da vacina a partir das 21 semanas de gestação. É o caso de Ilícia Mendes, que depois de muitas dúvidas e duas consultas veio tomar a primeira dose da vacina. “.Antes de vir para cá fui a duas consultas, perguntei se era realmente necessário e seguro porque a minha intenção era tomar a vacina depois do nascimento do bebé”, explica a grávida de 26 semanas, acrescentando que depois de a sua médica como as enfermeiras lhe explicarem as “vantagens”, uma vez que terá contacto com várias pessoas durante o parto e o internamento, decidiu tomar a vacina. “É sempre um risco elevado portanto mais vale prevenir do que remediar”, conclui.
Não desperdiçar doses é um dos desafios face à pouca afluência
O Governo estima atingir a meta de 85% da população totalmente vacinada daqui a três semanas, segundo revelou a ministra de Estado e da Presidência, Mariana Vieira da Silva, no último Conselho de Ministros. Até lá, os centros de vacinação deverão continuar a funcionar, ainda que com pouca afluência. Se no início um dos grandes entraves ao progresso da campanha de vacinação era a escassez de vacinas, agora o desafio é precisamente o contrário.
Como cada frasco dá para um determinado número de doses (a título de exemplo um frasco da Moderna dá para 11 doses e pode ser utilizado até 19h após a abertura, já o da Pfizer dá para seis doses, mas o prazo de utilização é bem mais curto), um dos grandes desafios elencados pelos profissionais é não desperdiçar doses.
Por isso, em Alcântara a partir das 16h começaram a “fazer grupos de pessoas” e quando têm pessoas suficientes começam a vacinar. Se não for possível angariar utentes suficientes, “negoceiam” com os utentes para que voltem no dia seguinte. “Não aconteceu muitas vezes, geralmente vai aparecendo sempre alguém e as coisas resolvem-se e assim não desperdiçamos doses, que também é importante”, conclui o enfermeiro António Sousa.
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Centros de vacinação estão às moscas. “São mais funcionários do que pessoas para vacinar”
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