O abraço de urso do presidente dos afetos
Marcelo desfaz Mário Centeno. Não é preciso ler nas entrelinhas, basta ler a última linha da nota da Presidência.
Na véspera do dia de São Valentim, o ambiente era propício a um clima de amor e fraternidade entre São Bento e Belém. Mário Centeno faz uma conferência de imprensa a tentar fazer as pazes com António Domingues. Desde a República Centro-Africana, António Costa emitiu um comunicado em que jura amor eterno ao seu ministro das Finanças. Às altas horas da noite, Marcelo Rebelo de Sousa publica uma nota no site da Presidência em que aparentemente sai em defesa de Mário Centeno.
Mas só aparentemente. Porque a carta de Marcelo Rebelo de Sousa é arrasadora para o ministro das Finanças. Não é preciso ler nas entrelinhas, basta ler a última linha da carta. Vamos por partes.
Há uma semana, Marcelo Rebelo de Sousa fazia esta defesa excessiva e despropositada de Mário Centeno: “Ou há um documento escrito pelo senhor ministro das Finanças em que ele defende uma posição diferente da posição do primeiro-ministro ou não há. Se não há, é porque ele tinha a mesma posição do primeiro-ministro, para mim é evidente”.
Só que afinal não era assim tão evidente. Marcelo não encontrou nenhum documento escrito, mas depois da conferência de ontem do ministro das Finanças, ficou por demais evidente que Mário Centeno não tinha a mesma posição do primeiro-ministro.
O secretário de Estado das Finanças confirmou no final da conferência que pelo menos até 26 de outubro, nas Finanças, estavam todos convencidos de que António Domingues não tinha de entregar as declarações de rendimento e património junto do Tribunal Constitucional. O próprio Mário Centeno admitiu “conversas informais” com o presidente da Caixa a propósito do tema. E acabou por confessar um “eventual erro de perceção mútuo” que terá feito António Domingues acreditar que estava dispensado desse dever de transparência.
Marcelo, que se tinha atravessado por Mário Centeno, sentiu-se traído. E nestas coisas de política, amor com amor se paga. Na última linha do comunicado de Belém, lê-se o seguinte: “Ouvido o Senhor Primeiro-ministro, que lhe comunicou manter a sua confiança no Senhor Professor Doutor Mário Centeno, [o Presidente da República] aceitou tal posição, atendendo ao estrito interesse nacional, em termos de estabilidade financeira”.
O que Marcelo acabou de dizer é que Mário Centeno é um ministro a prazo. Só não sai agora para evitar alguma turbulência nos mercados e nos juros da dívida pública. Se antes já se tinha percebido que Mário Centeno não estava de pedra e cal no Governo, agora fica claro que está pendurado por arames, ou melhor, pelos juros.
Esta é uma história de amor, de enganos, de traições e mal-entendidos. E termina com Marcelo Rebelo de Sousa, o presidente dos afetos, a dar a Mário Centeno um abraço, um apertado e ternurento abraço de urso. Provavelmente igual àquele que Mário Centeno tinha dado a António Domingues.
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