Costa tenta resolver OE no Conselho de Ministros desta quinta-feira

O primeiro-ministro aponta para este Conselho de Ministros como o desbloqueador das negociações do OE 2022. Costa tenta conquistar esquerda com a agenda para o trabalho digno e estatuto do SNS.

Perante a ameaça de chumbo do Orçamento do Estado para 2022 (OE 2022), com o PCP e o Bloco a anunciarem o voto contra a proposta tal como está, António Costa tirou dois trunfos da cartola e anunciou na reunião com o grupo parlamentar do PS que iria levar a Conselho de Ministros a agenda do trabalho digno, incluindo uma mexida na caducidade da contratação coletiva, e o estatuto do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Essa reunião acontece esta quinta-feira, a menos de uma semana da votação do OE 2022 na generalidade, cujo desfecho continua em risco.

O que vai estar em cima da mesa dos ministros? Comecemos pela agenda para o trabalho digno e a referida mexida na caducidade da contratação coletiva: o Governo prepara-se para prolongar por mais um ano, até 2024, a suspensão da caducidade das convenções coletivas e para reforçar o mecanismo de arbitragem de modo a prevenir a caducidade dos contratos coletivos. Este pacote legislativo de 70 medidas, que ainda terá de ficar em discussão pública, focava-se no combate à precariedade e não estava nas negociações do Orçamento até a esquerda o exigir.

O outro tema “caro” ao PCP e ao Bloco é a concretização do estatuto do SNS, na sequência da já aprovada Lei de Bases da Saúde, para dar maior autonomia ao sistema. “O objetivo é criar as regras próprias para que as carreiras sejam atrativas e condições que permitam atrair e fixar duradouramente profissionais que se sintam realizados no serviço que prestam à comunidade através do SNS“, afirmou António Costa sobre essa legislação que também terá de estar em consulta pública antes de ser lei. Porém, a ministra da Saúde já tinha dito que apenas incluirá “uma parte” dos médicos, excluindo outras profissões do SNS, e que esse processo “não se fará numa legislatura”.

Em reação, tanto os comunistas como os bloquistas desvalorizaram os anúncios do primeiro-ministro. Primeiro foi Mariana Mortágua a desdenhar as ofertas: “Já depois da apresentação da lei orçamental, foram divulgadas publicamente duas propostas destinadas a criar confusão: uma que cria um mecanismo para manter a caducidade da contratação coletiva que o Bloco quer eliminar, e outra [estatuto do SNS] que pretende impor um regime muito limitado de exclusividade e que até já existe”, escreveu num artigo de opinião no Jornal de Notícias.

Já o líder parlamentar do PCP, João Oliveira, disse em entrevista à Antena 1 que “se isso não significar compromissos concretos, serve de pouco”. O comunista desvalorizou o “anúncio de intenções” por não servir “de muito”, exigindo “compromissos diretos e claros” ao Governo para que haja respostas “no imediato”, mas também com um olho no futuro. “Ou há uma clarificação por parte do governo exatamente sobre o caminho que quer fazer ou é muito difícil que essa hipótese [viabilizar OE para a especialidade] possa ser colocada”, concluiu.

Acresce que, mesmo que ganhe o apoio da esquerda com a viabilização do Orçamento para o próximo ano, o primeiro-ministro deverá ter de enfrentar outro problema: os patrões. Após a reunião da concertação social esta quarta-feira, a CIP anunciou que vai pedir aos grupos parlamentares, ao Presidente da República e à Provedora de Justiça para enviarem para o Tribunal Constitucional os novos travões à caducidade das convenções coletivas, os quais dizem ser inconstitucionais.

Reuniões com Costa não desbloquearam negociações

Esta semana houve uma nova ronda de negociações entre o Governo e o PCP e o Bloco, mas estes dois partidos continuam sem dar sinal de que o sentido de voto mudará. E, face ao que já foi dito, não parece que este Conselho de Ministros irá ser o desbloqueador que Costa esperava, a não ser que faça mais cedências mais do que se espera. O braço-de-ferro continuará nos próximos dias e, no máximo, até à próxima quarta-feira, dia em que o documento terá mesmo de ser votado na Assembleia da República.

Durante esta contagem decrescente ainda muito há para negociar e tudo está em aberto. O próprio primeiro-ministro já contempla a imprevisibilidade da ex-geringonça, apesar de confiar na “racionalidade” dos partidos, e decidiu marcar uma reunião de urgência da comissão política do PS, que não estava prevista, para esta sexta-feira, segundo o Observador. A hipótese de eleições antecipadas está em cima da mesa se os partidos da esquerda não se abstiverem, sendo já certo que o PSD não irá “salvar” o Orçamento.

No caso do Bloco, ainda haverá pelo menos mais uma reunião, mas o partido revelou que no caso da Segurança Social o Governo “não trouxe qualquer proposta” e no da legislação laboral o Executivo recusou as reversões exigidas pelos bloquistas, “ficando por medidas simbólicas que não concretizou por escrito” — um acordo político escrito é uma exigência do BE. Onde existe alguma esperança é no SNS com o Bloco a aguardar por “novas redações com eventuais aproximações”.

À Lusa, uma fonte do Governo contrapôs com uma versão diferente, garantindo que “apresentou avanços em vários domínios”, incluindo na legislação laboral e na Segurança Social, ainda que admita que “há pontos em que subsistem divergências já conhecidas”.

No caso do PCP, a lista de exigências é maior e não é claro o que avançou ou não. “Não quero precipitar a apreciação da atitude do Governo“, disse João Oliveira, notando apenas que a reunião foi uma oportunidade para abordar temas “de forma mais alargada” e com “maior profundidade”. Mas também acusou o Governo de estar menos flexível do que em anos anteriores — no ano passado, o PS teve de viabilizar uma em cada cinco das propostas do PCP para viabilizar o OE2021. No dia da reunião, Jerónimo de Sousa disse ainda em público que o PS continua a estar “longe da solução”.

Na sua última intervenção pública, António Costa apelou à racionalidade dos partidos e voltou a falar da legislação que irá a Conselho de Ministros. “O que seria absolutamente irracional era juntar dramas políticos” aos dramas da pandemia e da crise económica, afirmou, concluindo que “não seria racional” chumbar a proposta do OE na próxima semana. Em vez de definir “linhas vermelhas”, Costa disse procurar por “linhas verdes” para contornar “bloqueios”, como tem feito desde 2016 perante “sucessivos bloqueios”.

Porém, não se afasta da mensagem de “contas certas” — o PCP critica duramente a cedência do Governo à União Europeia neste objetivo — que tem sido repetida insistentemente desde que a proposta do Orçamento foi entregue no Parlamento, tanto para consumo interno como para consumo externo. “Limitar o crescimento da despesa pública, em particular a que tem caráter permanente, é uma premente preocupação do Ministério das Finanças“, escreveu também o Ministério de João Leão na proposta de Orçamento entregue na Comissão Europeia. Falta saber se as “contas certas” serão, desta vez, compatíveis com um acordo político para as viabilizar.

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