Refinaria da Galp em Matosinhos vai ser Innovation District e acolher polo universitário

Galp, Câmara de Matosinhos e CCDR-N assinam acordo para assegurar “enquadramento jurídico e económico” ao projeto de reconversão dos terrenos da refinaria, que prevê criar até 25 mil empregos.

Uma cidade dedicada à inovação e às energias do futuro (Innovation District) e um polo universitário. Estas são as primeiras ideias concretas sobre o que vai surgir nos valiosos terrenos da antiga refinaria da Galp em Leça da Palmeira (Matosinhos), com um total de 237 hectares, assim que fique concluído o processo de desmantelamento e de descontaminação da unidade industrial que deixou de produzir a 30 de abril do ano passado. A empresa prevê a criação de 20 a 25 mil postos de trabalho diretos ou indiretos num prazo de dez anos.

O anúncio oficial surge ao abrigo de um protocolo de cooperação com a Câmara de Matosinhos e a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte (CCDR-N), com a petrolífera a falar da “criação de um Innovation District, potenciado por um ecossistema urbano, social e ambientalmente sustentável, incluindo comércio e serviços, hotelaria, restauração, indústria 4.0, habitação, equipamentos culturais e de lazer, com destaque para um Green Park”.

O acordo de parceria prevê também a cedência de parcelas de terreno no perímetro da refinaria para a construção de um polo universitário. Como o ECO adiantou em setembro, a proposta da autarca matosinhense, Luísa Salgueiro, é que aquele espaço venha a acolher o Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental (CIIMAR), ligado à Universidade do Porto, que “já não tem condições para continuar onde está”, no edifício do Terminal de Cruzeiros do Porto de Leixões.

O protocolo assinado esta quarta-feira, no Porto, foi apresentado como um “ponto de partida” para densificar e concretizar as soluções em análise para reconverter aquele espaço e posicionar esta iniciativa “no topo dos projetos mundiais de tecnologia associada a energias sustentáveis”. Para já, vai ser criada uma equipa técnica conjunta para “delinear, em articulação com as demais entidades competentes, todos os procedimentos necessários para o cumprimento dos enquadramentos jurídicos e económicos associados ao projeto”.

Perante a inevitável e necessária transição energética para um mundo mais sustentável, a Galp pretende assegurar e perpetuar o seu contributo social e económico, criando ainda mais valor para Matosinhos.

Paula Amorim

Presidente da Galp

Em paralelo, para desenvolver o projeto de requalificação urbanística de toda a área até aqui ocupada pela unidade industrial, a empresa liderada por Andy Brown recrutou a antiga secretária de Estado da Indústria, Ana Lehmann. Esta especialista em internacionalização e inovação vai chefiar uma equipa multidisciplinar que conta com nomes como Celeste Amorim Varum e José Sequeira para reforçar as áreas da atração de investimentos e do planeamento urbano.

“O Norte e a cidade de Matosinhos abraçaram durante meio século uma atividade industrial estratégica, pioneira e estruturante para o desenvolvimento da região e a transformação energética do país. Perante a inevitável e necessária transição energética para um mundo mais sustentável, a Galp pretende assegurar e perpetuar o seu contributo social e económico, criando ainda mais valor para Matosinhos, para o mercado e participando ativamente no progresso do país”, destaca Paula Amorim, presidente do conselho de administração da Galp, numa nota distribuída aos jornalistas.

Fábrica 2030 - Portugal e a Reindustrialização Europeia - 24NOV20
Ana Lehmann lidera a equipa que vai desenvolver o projeto de requalificação urbanística de toda a área até aqui ocupada pela unidade industrial da Galp.Hugo Amaral/ECO

Enquanto o presidente da CCDR-N, António Cunha, fala no “maior e mais estruturante projeto de desenvolvimento regional de Portugal no horizonte da próxima década”, a presidente da Câmara de Matosinhos destaca a “ambição de transformar uma área contaminada num ativo que contribua para o crescimento do emprego qualificado e da competitividade da região”. “Esta nova cidade do conhecimento contará com o envolvimento da academia na construção de centros de investigação e de aceleração de excelência nos domínios da indústria 4.0, energia e mar, com recurso a verbas do Fundo para uma Transição Justa”, acrescenta a autarca.

60 milhões a caminho de Matosinhos

Um estudo socioeconómico realizado pela Universidade do Porto estima que o encerramento da refinaria nortenha representa uma redução de 1.600 postos de trabalho em Matosinhos e de 5.000 na Área Metropolitana do Porto. A análise, citada pela Lusa, calcula também perdas equivalentes a 5% do PIB no concelho e de 1% na Área Metropolitana do Porto.

Ora, os trabalhadores são precisamente os primeiros destinatários dos 60 milhões de euros do chamado Fundo para a Transição Justa da UE que serão atribuídos a Matosinhos para “atenuar o impacto” do fecho da refinaria. “O centro de emprego está a gerir esse processo, em conjunto com o gabinete que a Câmara criou para fazer o acompanhamento individual”, destacou a autarca.

Outra fatia desta verba, que será gerida em parceria com a Universidade do Porto, irá para a criação de um “grande polo de investigação e conhecimento” que vai ser instalado naquele local, nos referidos terrenos cedidos pela Galp, assim como para a “criação de economia alternativa, baseada em inovação e no fomento de empresas de base tecnológica”, descreveu o presidente da CCDR-N.

Porto de LeixõesWikimedia Commons

Em conferência de imprensa, António Cunha, ex-reitor da Universidade do Minho, avançou ainda que haverá um conjunto de medidas para a APDL, que foi o organismo mais diretamente afetado, em termos de faturação, pelo encerramento da refinaria. Em causa está, entre outras, a reconversão do molhe norte do Porto de Leixões, que deixou de ter atividade ligada à transfega de combustíveis fósseis.

O líder da região Norte detalhou que o programa operacional Norte 2030 “ainda está em discussão”, que a situação política fez deslizar a primeira perspetiva de fechar este dossiê no primeiro semestre deste ano, mas que “ainda este ano podem chegar essas verbas”. “Logo que o nosso plano operacional esteja concluído, podemos ativá-lo, mas estamos a trabalhar neste processo”, argumentou.

Da “lição” de Costa ao “coração de pedra” de Matos

O encerramento da refinaria acabou por entrar no debate político na campanha eleitoral para as autárquicas, em setembro do ano passado, quando António Costa criticou o processo e prometeu dar uma “lição” à Galp. Dias depois, o ministro da Economia, Pedro Siza Vieira, concretizou que “a lição a tirar deste processo é que é necessário planear melhor” estes dossiês, “não apenas na perspetiva dos agentes económicos que têm de tomar decisões, mas nos impactos que tem nas suas comunidades e nos territórios em que se inserem”.

Já o ministro do Ambiente, João Matos Fernandes, chegou a acusar a petrolífera de ter tido um “coração de pedra” pelo modo como conduziu o processo – “é inaceitável comunicar o encerramento de uma instalação como esta antes do Natal” – defendendo que a empresa “tinha de ir além da lei”, já que tem “como clientes todos os portugueses”. Ainda assim, sublinhou que “isso não retira a relevância que a Galp tem na transição energética em Portugal”.

O CEO da Galp, Andy Brown, acabou por admitir em novembro, à margem da Web Summit, que o encerramento da refinaria de Matosinhos “podia ter sido gerido de melhor forma” pela empresa. Admitiu que “foi uma decisão difícil”, em que se perderam muitos empregos, mas, simultaneamente, frisou que o fecho era “inevitável” porque aquela “já não era uma refinaria viável” economicamente.

(Notícia atualizada com informações sobre o Fundo para a Transição Justa da UE)

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