Uma Justiça ao serviço dos cidadãos

  • Luís Menezes Leitão
  • 17 Março 2022

O principal problema da justiça reside nas elevadas custas judiciais. Temos hoje um sistema de justiça que só está acessível aos muitos ricos, que têm dinheiro para pagar as elevadas custas.

Qualquer Estado democrático tem obrigação de garantir aos cidadãos dois valores fundamentais: a justiça e a segurança. Infelizmente, no entanto, no nosso país a justiça está longe de ser assegurada aos cidadãos.

O principal problema da justiça reside nas elevadas custas judiciais. Efectivamente, temos hoje um sistema de justiça que só está acessível aos muitos ricos, que têm dinheiro para pagar as elevadas custas, e aos muito pobres, que têm acesso ao apoio judiciário. A classe média está assim fora dos tribunais, o que não é admissível. Não se pode aceitar a proposta do Governo de remeter os cidadãos para os meios alternativos de resolução de litígios. A justiça é um serviço público e tem por isso que ser realizada nos tribunais.

Outro problema no sector da justiça reside nas portas giratórias entre o governo e os tribunais, o que atenta contra a separação de poderes e a independência dos tribunais, e determina uma governação na justiça exclusivamente orientada para as magistraturas. No anterior governo, a prioridade governativa foi aumentar significativamente os ordenados dos magistrados, enquanto que os advogados que trabalham no acesso ao direito assistiram a uma actualização da sua remuneração de apenas oito cêntimos, depois de uma década de remunerações congeladas. Deveria ser instituída a regra existente noutros países de que, se um magistrado quiser assumir funções políticas ou administrativas, não deve poder regressar à magistratura.

Verifica-se igualmente um sério problema de gestão na justiça. É muito preocupante a falta de meios de investigação criminal, o que tem especiais repercussões na criminalidade financeira a nível global. O caso recente da dificuldade de obter em tempo útil uma simples tradução para inglês num processo de extradição faz pensar a quantidade de vezes em que essa situação se pode ter verificado em relação a crimes cuja investigação abranja vários países. Por isso o Ministério Público leva anos a apresentar as acusações em muitos processos, o que constitui um sério problema, não só para a eficácia da investigação criminal, mas também para os arguidos que ficam muitos anos envolvidos num processo penal. Infelizmente, no entanto, e apesar de o Director do DCIAP ter denunciado publicamente a falta de meios de investigação criminal nesse Departamento, nada foi feito pelo Governo a este propósito.

Também se verifica uma enorme falta de escrutínio público na actuação da nossa justiça. Noutros países, o Ministério Público costuma apresentar explicações públicas, caso as acusações que apresenta sejam rejeitadas pelos Tribunais. Em Portugal têm-se, no entanto, verificado muitos casos em que as acusações são julgadas totalmente improcedentes, sem que seja dada qualquer explicação para a razão por que cidadãos inocentes foram acusados.

Outro problema complexo é a fulanização que se tem verificado no sector da justiça, especialmente no Tribunal Central da Instrução Criminal. O país tem assistido a um confronto público de dois juízes, que levou ao ponto de a questão mais discutida ser a forma como se verifica a distribuição de processos. Procurou-se resolver o assunto aumentando o quadro de juízes nesse tribunal através da absorção do Juízo de Instrução Criminal de Lisboa, mas essa situação não tem impedido que os problemas se mantenham.

A Ordem dos Advogados defende por isso uma reforma profunda da nossa Justiça que a coloque verdadeiramente ao serviço dos cidadãos.

Nota: O autor escreve ao abrigo do antigo acordo ortográfico.

  • Luís Menezes Leitão
  • Bastonário da Ordem dos Advogados

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