François Baudienville, CEO da Mudum, seguradora portuguesa da Crédit Agricole Assurances, uma das maiores de França, explica os passos que vai dar para fazer negócios para além da rede do Novobanco.
A seguradora Não Vida Mudum é o braço português do Credit Agricole Assurances (CAA), um dos maiores grupos seguradores de França com mais de 37 mil milhões de euros em negócios anuais. Depois de uma associação com o Grupo Espírito Santo adquiriu a GNB Seguros a 100% em 2020 e mantém um contrato de distribuição com o Novobanco até 2042. O CEO François Baudienville chegou a Portugal em 2018 e quer expandir negócios para além do Novobanco. Em entrevista a ECOseguros explica, já em português perfeito, como vê o futuro da seguradora.
O Credit Agricole está em Portugal desde 1996, mas só agora se começa a criar uma vida própria. Qual a estratégia?
Começámos em 1996 e nos primeiros dez anos foi uma história de apoio, de acompanhamento, partilha de boas práticas e recursos boas práticas. A partir de 2006 começou a ser uma joint venture 50%/50%, com o grupo Espírito Santo. Depois foi a decisão estratégica de ter o controlo da companhia concretizada em duas fases, em 2018 e 2020. No momento da minha chegada a estratégia era continuar a trabalhar fortemente com o nosso principal parceiro Novobanco. Queremos continuar neste caminho e temos muitas coisas para fazer. Começamos a ganhar novas oportunidades de negócio porque o grupo Crédit Agricole Assurances está a achar que o Portugal é um mercado que tem peso e relevância. Queremos investir em Portugal e acreditamos na competência da gente que está cá e no potencial de crescimento da companhia.
O objetivo do grupo Crédit Agricole Assurances é crescer para além do parceiro Novobanco e temos imensas oportunidades.
Crescer organicamente ou através de aquisições? Há pressa?
O Credit Agricole é um investidor de longo prazo, não faz sentido falar em pressa. Dito isto, ao nível da companhia Mudum – outra coisa poderá ser o grupo Crédit Agricole – o foco está no crescimento orgânico e para isso acreditamos que temos um bom modelo com o Novobanco em termos de relacionamento e taxa de equipamento. Sabemos que ainda há imenso potencial para crescer com o novobanco. Na base da experiência que temos noutros mercados, como França e Itália, sabemos que – com o grupo Novobanco ainda não chegámos ao nível do que podemos ambicionar e isso vale na parte dos particulares e na parte das pequenas e médias empresas, onde há espaço para crescer com o Novobanco.
Existem projetos para além do Novobanco?
O objetivo do grupo Crédit Agricole Assurances é crescer para além do parceiro Novobanco e temos imensas oportunidades. Uma das grandes conquistas da companhia durante os últimos anos foi capacitar a Mudum, que estava desenhada para trabalhar com um parceiro único no modelo de banca seguros, para ir além de uma parceria única. É isso que estamos a fazer. Primeiro queremos passar a mensagem aos mercados, que é esse o nosso caminho que temos valor para trazer a outros parceiros. Segundo, capacitar a companhia para que seja possível um bom marketing e um modelo diferenciador em termos de fluidez do relacionamento com o parceiro. Em 2024 já estamos preparado para o fazer e estamos a responder ativamente às oportunidades que podem surgir no mercado. É só uma questão de tempo antes de abrir novas oportunidades, novas parcerias para que a companhia possa crescer além do grupo Novobanco.
Haverá maior interesse na captação de corretores e agentes?
Agentes e brokers podem fazer parte do caminho, mas o nosso foco é verdadeiramente o modelo do B2B2C, ou seja, acompanhar a estratégia de um parceiro e construir com ele um modelo de negócio que aproveite a possibilidade de ter seguros na proposta de valor aos clientes dele.
É visível nas estatísticas de produção que a aposta da Mudum tem sido o segmento particulares…
Não só, mas sim. Faz parte do desejo de crescimento do nosso negócio com o Novobanco. Temos um modelo de negócio muito equilibrado, o que é uma força, no meu entender, em termos de capacidade de monitorização dos riscos. Isso é um tema muito forte do nosso modelo, quer em termos de capacidade de distribuição, quer em termos de gestão dos equilíbrios técnicos da companhia. Há um segmento do mercado que começámos a abrir de maneira mais ativa no final de 2018, o dos profissionais e das pequenas empresas. Ainda não estamos a explorar em todo o potencial que acreditamos ter, vamos ser mais visíveis a partir de 2024.
Além do Novo Banco, e não sendo a mediação o novo canal a explorar, qual será o caminho?
Há um leque de parceiros potenciais que é importante e devemos explorar ao máximo como as instituições financeiras. Muitos acordos já existem, mas ainda podem existir oportunidades do lado das empresas de crédito ao consumo. Pode ser uma especialista de crédito ao consumo ou ligada a um mercado em particular e é claro que há uma oportunidade nos sistemas de mobilidade em Portugal, e aqui a Mudum pode ter um papel no mercado.
Existe alguma operação do Credit Agricole Assurances na Europa que seja um modelo a seguir em Portugal?
A força do grupo é aproveitar o que funciona bem em cada entidade. Temos um modelo de funcionamento que é muito descentralizado, ou seja, o modelo do Credit Agricole é muito virado para os entrepreneurs. A ideia é termos conhecimento dos mercado locais e termos capacidade de atuar neles. Dito isto, há uma força incrível de ter uma experiência do que está a acontecer em França do que está acontecer em Itália, do que está a acontecer na Polónia, nos mercados todos onde o grupo está a operar. Portugal está a passar boas práticas aos colegas dos outros países e eles estão a passar boas práticas a Portugal.
Há uma equipa Mudum ao lado das equipas do banco para ajudar a perceber os produtos e confirmar que isso corresponde ao que o cliente precisa. O nosso papel é ser útil.
Uma das críticas ao bancassurance é a falta de preparação dos colaboradores dos bancos a falar de seguros. Sente reclamações e desapontamentos dos segurados?
Acompanhamos de perto os indicadores de satisfação, e identificamos os pontos de melhoria porque ainda não somos perfeitos. De maneira geral, é algo que não estamos a sentir e temos já 27 anos a trabalhar ao lado do Novobanco Há uma equipa Mudum ao lado das equipas do banco para ajudar a perceber os produtos e confirmar que isso corresponde ao que o cliente precisa. O nosso papel é ser útil. Fazemos isso porque acreditamos que é uma oportunidade de propor coberturas mais ajustadas ao que o cliente precisa, ele deve perceber o que está a comprar. Eu quero que o Novobanco seja feliz com o que estamos a propor e não quero criar uma dificuldade do relacionamento com o cliente final. Os seguros devem ser uma fonte de satisfação e uma fonte de fidelização, de melhoria da relação entre o meu parceiro Novobanco e o cliente final.
Em 2023 o volume de prémios ficou perto dos 80 milhões de euros e os resultados líquidos foram 3,8 milhões. Como está rentabilidade da Mudum? Há dois anos o rácio combinado estava bem, nos 84%…
É rentável, o rácio combinado (indicador em que um valor menor que 100% significa rentabilidade técnica positiva e mais de 100% prejuízo) hoje está perto dos 95% que é o nosso objetivo. O acionista aceitou ter maiores despesas de funcionamento porque acreditávamos que era necessário investir para criar um melhor negócio com o Novobanco. E um dos investimentos fortes que fizemos com o Novobanco, foi na solução Omnicanal.
O que mudou com essa solução?
O cliente pode começar a fazer uma simulação ou a querer comprar algum produto na rede física, no digital, com uma conversa com a equipa do call center. E alguns vão acabar um processo na rede física, no digital ou acabar como um telefonema como o call center. Foi uma das maiores conquistas que conseguimos obter com o Novobanco e nesta altura os produtos core saúde, automóvel e casa são 100% omnicanal. Então o cliente pode fazer tudo de maneira 100% omnicanal. Se preferir a rede física está perfeito. Esta solução fez parte dos investimentos “escondidos” nas contas de 2023, mas que já teve um impacto no negócio em 2024 e terá nos anos seguintes.
Ainda quanto aos resultados 2023, considera satisfatórios?
Sofremos um impacto que não estava previsto, a evolução muito forte dos custos na saúde, para além de estarmos no caminho de evolução e crescimento da companhia. Investimos, não só para servir ainda melhor o Novobanco, mas também para ter a capacidade de nos abrirmos a outros parceiros. Para isso precisamos de organização, ferramentas e equipas. Estamos a criar uma capacidade adicional para podermos ter capacidade de fazer essas propostas com o time to market que devem ter.
Há dois anos, a Mudum eram 76 pessoas. Hoje são quantas? Como vai evoluir o quadro de colaboradores?
Como disse, o Credito Agricole é um investidor de longo prazo. Em termos de evolução do investimento, fazemo-lo nas pessoas, o que inclui qualidade da vida e a sua capacitação. E por isso, uma das maiores conquistas do ano passado foi obter o Great Place to Work, que é uma fonte de orgulho dos colegas da companhia e dá-nos capacidade de atrair também talentos quando for necessário.
A Mudum segue uma lógica marca branca. Se o parceiro da distribuição tiver uma necessidade diferente, trabalharemos uma necessidade diferente…
A Mudum vai continuar a ser marca branca ou quer criar alguma marca? Vão continuar a deixar os clientes terem a sua marca à frente?
Por iniciativa própria não está previsto outra marca, mas vai depender da evolução do modelo de negócio. Para já, a Mudum atua no modelo B2B2C exceto se houver uma vontade diferente do parceiro de distribuição. A lógica é valorizar a marca do parceiro de distribuição, é isso que fazemos com o Novobanco e podemos fazer com outros parceiros. É mais uma lógica marca branca. Se o parceiro da distribuição tiver uma necessidade diferente, trabalharemos uma necessidade diferente…
E se tiverem essa necessidade?
A Mudum não é uma marca conhecida, mas é uma empresa que está presente para apoiar os portugueses no dia a dia e temos 330 mil clientes. De uma maneira ou outra, há um relacionamento com a companhia mas, para já, a nossa convicção é trabalhamos pelos parceiros e somos especialistas no relacionamento com os parceiros. Queremos perceber a estratégia deles, ajudar a desenhar a estratégia, ajudar a desenhar os produtos que respondam à estratégia, ajudar a desenhar os processos, que respondam à estratégia para que no final do dia existam clientes felizes com a marca dos nossos parceiros.
A Inteligência Artificial (IA) está na moda ou funciona?
Não há dúvida que é um tema de moda e a palavra IA corresponde a várias tecnologias que são completamente diferentes. Na minha anterior função no Credit Agricole estava a trabalhar na área de compliance e, há cinco ou seis anos, já estávamos a trabalhar de maneira operacional concreta e aplicar modelos de inteligência artificial para ajudar a tomar decisões relacionadas com decisões de compliance. Não era para fazer decisão final, ainda não estávamos lá, mas era para propor uma decisão fundamentada ao gestor que no final do dia tinha de escrever uma resposta. Esse é um tema de eficiência operacional, não é nada teórico.
Então acha útil a sua aplicação?
Acho que há verdadeiramente valor. Mas há que saber exatamente o que queremos. Sou muito pragmático. No final do dia, o que serve a IA para o cliente ou o que permite melhorar num conjunto de objetivos da companhia? Pode haver impactos positivos na aceleração da resposta, é típico tema de triagem de emails que estão a chegar para acelerar alguma resposta, ou até automatizar uma parte da resposta, isso está a funcionar. A capacidade de apoiar a rede de venda tipo Q&A para ter uma resposta mais rápida funciona. A capacidade de analisar padrões de fraude na gestão de sinistro, sim. Há ferramentas. A vantagem de pertencer a um grupo maior como o grupo CA e CAA é que há casos concretos a funcionar com inteligência artificial.
A quota de mercado da Mudum é 1,2% e é a 13ª maior seguradora Não Vida em Portugal. Onde pretende chegar?
Fica claro para nós que temos uma capacidade de crescer de maneira orgânica. O nosso trabalho diário é com o Novobanco, mas iremos para além da parceria Novobanco. A ambição é crescer e temos espaço para o fazer.
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