Secretário de Estado das Finanças garante, em entrevista ao ECO, que o objetivo é evitar "a todo o custo" um precipício económico com retirada de apoios de forma "súbita e dramática".
Há 44 mil milhões de euros em empréstimos bancários cujo pagamento está suspenso. É este o montante das moratórias públicas (a esmagadora maioria) e privadas concedidas desde o início da pandemia, de acordo com o Secretário de Estado das Finanças. João Nuno Mendes explica que o Governo não pensa ainda em eventuais alterações, mas garante que será evitada “a todo o custo” uma retirada brusca dos apoios.
Numa entrevista por ocasião do Dia Mundial da Poupança, que se celebra este sábado, o governante defende a medida, dizendo que foi a melhor que poderia ter sido tomada no prazo e com a informação que o Executivo tinha. Mas deixa um aviso aos bancos de que é preciso acautelar o risco, alertando que “cada um tem de fazer o seu trabalho de casa”.
As moratórias de crédito foram uma das medidas adotadas pelo Governo que permitiram às famílias terem mais liquidez e poupar. É uma medida que admitem prolongar?
Tínhamos um prazo que era de 30 de setembro para fazer as últimas alterações para que pudessem ser aceites do ponto de vista prudencial pela autoridade bancária europeia. Fizemos a alteração que fizemos, de extensão, até 30 de setembro passado. E foi uma alteração de grande alcance portanto não gostaria de fazer mais comentários. Acabámos de fazer uma extensão que é significativa, que vai até 30 de setembro de 2021.
A partir de 31 de março do próximo ano, a generalidade dos setores vai começar a pagar juro, continuando em moratória de capital até 30 de setembro. Depois temos um conjunto de setores de atividade que vão ter uma moratória plena de capital e juros, que são os setores mais afetados pela crise. Sobretudo os setores como o turismo, transportes, saúde, educação, cultura, que são áreas que se constatou que são as mais afetadas, em que o elemento de distanciamento social mais afeta a prestação de serviços. Esses vão ter uma moratória total.
Qual é o valor das moratórias concedidas?
A moratória legal anda na casa dos 37 mil milhões de euros e é substancialmente superior à moratória privada que anda na casa dos 7 mil milhões. Estamos a falar de stock de crédito. O peso relativo dos particulares é sensivelmente um terço do total e as empresas representam dois terços. Estes são os números em termos globais.
"A moratória legal anda na casa dos 37 mil milhões de euros e é substancialmente superior à moratória privada que anda na casa dos 7 mil milhões.”
Não podemos esquecer que, de acordo com a Autoridade Bancária Europeia, as moratórias andavam com um prazo entre seis e 12 meses. Nós levamos até 18 meses, mas achamos que tomámos uma decisão que posteriormente o Banco Central Europeu (BCE) veio dar sinais aos vários países europeus de que esse era o caminho: não tirar os apoios demasiado cedo, abrindo o que se chama de cliff edge, ou seja, o precipício económico. Gerar momentos de cliff edge, em que criamos o precipício por tirarmos os apoios de forma súbita e dramática, é aquilo que se tem de evitar a todo o custo.
Considera que estão a conseguir fazê-lo?
Dada a informação que temos, parece-nos uma opção muito razoável esta que foi tomada e que é uma opção que tem uma larga escala. As prestações evitadas de capital e juros nos primeiros seis meses da moratória — entre finais de março e finais de setembro — andavam na casa dos sete mil milhões. Portanto é um instrumento de grande apoio à economia. Temos consciência das implicações da decisão, que foram muito ponderadas. Fizeram-se muitas análises de impacto.
Quais são as implicações?
Subsequentemente, já depois de 30 de setembro, o BCE veio alertar para que na Europa não se retirem apoios demasiado cedo e referiu expressamente a questão das moratórias bancárias. Existe um receio grande que haja uma convergência em determinados momentos no início de 2021 de retirada dos apoios e das moratórias.
O BCE disse isso já depois de nós termos tomado essa decisão e já depois do prazo dado pela Autoridade Bancária Europeia para estas decisões fossem aceites do ponto de vista prudencial, sendo que estas são decisões que não têm impacto do ponto de vista do que são as provisões dos bancos só pelo facto de se realizarem. Nós achamos que as opções que foram tomadas estão corretas.
Consideram a possibilidade de medidas de transição?
Tem de haver sempre uma leitura da situação económica e social, que estamos a viver a cada momento. Do ponto de visto das necessidades de financiamento e capitalização das empresas, é uma matéria que naturalmente temos de procurar dar respostas. A matéria do financiamento às empresas, a forma como estão a enfrentar a crise e as suas necessidades de capitalização são matérias que para o governo são muito importantes e que procuraremos dar resposta na medida do que são as nossas capacidades.
A banca tem de estar conhecedora dos riscos de cada um dos seus clientes, caso a caso. Cada um tem de fazer o seu trabalho de casa.
Hoje, quando olhamos para os instrumentos que temos disponíveis, temos um conjunto de medidas com muito impacto, como as garantias públicas. Se pensarmos nas garantias que são prestadas através do fundo de garantia mútuo, temos aqui também mais um pilar de apoio à economia. O fundo de contragarantia mútuo em termos de garantias vivas, desde 2007/2008, andaram na casa dos 2,5 mil milhões a 3 mil milhões de euros. Em setembro, o mesmo fundo de contragarantia estava a prestar garantias na casa dos 7,5 mil milhões e vai evoluir até ao final do ano.
No decurso do próximo ano, o Orçamento do Estado também consagra 6 mil milhões de garantias a financiamentos de empresas. Se conjugarmos moratórias com garantias públicas — ambas têm a ver com o sistema financeiro –, temos aqui um quadro de apoios ao tecido económico e empresarial e às suas condições de financiamento, numa fase em que enfrentam as dificuldades que conhecemos, de dimensão extraordinária.
O Conselho de Finanças Públicas teme que as moratórias levem a mais injeções do Estado na banca. Vê este cenário como provável? Sem as moratórias, acontecia mais cedo?
Penso que tomámos excelentes decisões, as melhores que podíamos ter tomado com as informações que tínhamos. Como lhe disse, tivemos de decidir até 30 de setembro. O alerta do BCE foi precisamente sobre demasiado cedo se terminarem com as moratórias bancárias. Naturalmente que é fundamental estarmos atentos aos riscos. A banca tem de estar conhecedora dos riscos de cada um dos seus clientes, caso a caso. Cada um tem de fazer o seu trabalho de casa. Um apoio desta magnitude, no nosso entender, justificava-se pelo impacto brutal que estamos a sofrer na economia. Há decisões que têm de ser tomadas em determinados momentos e penso que o Governo tomou essas decisões no momento certo. Agora, naturalmente é preciso sempre um quadro de vigilâncias e estarmos todos atentos aos riscos envolvidos.
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Já foram concedidas moratórias sobre 44 mil milhões de euros em crédito
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