“O nosso combate deve ser salvar a economia e os postos de trabalho e isso consegue-se salvando empresas”

Saraiva diz que o Governo errou ao não ter perspetivado a "avalanche de pedidos" de lay-off, que acabou por entupir a Segurança Social. E garante que a máquina poderia ter sido mais bem preparada.

António Saraiva acredita que teria sido possível evitar a confusão, os atrasos e até o “defraudar das expectativas” dos empresários, no que diz respeito ao lay-off simplificado. Em entrevista ao ECO, o presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP) afirma que a máquina da Segurança Social poderia ter sido preparada com mais eficiência para a “avalanche de pedidos” que já se perspetivava, dada às características do tecido empresarial português.

No novo lay-off, tal como nas linhas de crédito lançadas em resposta à pandemia de coronavírus, o patrão dos patrões critica a velocidade e a dificuldades de acesso, face à “enorme burocracia”. Sobre a discórdia semeada entre o Governo e o Parlamento a respeito da proteção social dos sócios-gerentes, Saraiva não antecipa uma crise política, nem uma repetição do desfecho que sofreu a polémica questão da recuperação do tempo congelados dos professores.

Tudo somado, o presidente da CIP deixa claro que a prioridade deve ser salvar a economia. E isso passa, diz, por salvar empresas, já que só assim se conseguirão proteger os postos de trabalho.

A CIP enviou ao Governo um pacote de propostas para apoiar as empresas neste momento de crise. Uma dessas propostas é o lay-off em grupos empresariais. Na prática em que é que essa medida se traduziria e que falha no regime atual está por detrás desta vossa proposta?

O lay-off simplificado não contempla as chamadas holdings e é nesse sentido que sugerimos que o regime seja alargado. Os grupos empresariais têm, por vezes, pela sua dimensão, um conjunto significativo de trabalhadores ao seu serviço; e agora por redução das “filhas”, passo a expressão, eles próprios [os grupos empresariais] ficaram sem volume de trabalho para ocuparem a mão de obra para o qual tinham necessidade anteriormente. É nesse sentido que surge a nossa proposta, para que também este tipo de entidades possa estar abrangido. As chamadas sociedades gestoras de participações sociais.

As medidas que o Governo tem lançado, seja o lay-off simplificado, sejam as linhas de apoio à tesouraria das empresas têm de respeitar três grandes objetivos: têm de ser rápidas, têm de ser de fácil acesso e têm de ser eficazes e eficientes. São as duas primeiras variáveis que não se têm cumprido.

No que diz respeito ao lay-off, este último mês e meio foi marcado por alguma confusão e atrasos. Considera que a máquina da Segurança Social falhou ou quem deve ser responsabilizado é o Governo?

Estando a Segurança Social integrada no Ministério do Trabalho, a responsabilidade é sempre do Governo. A questão é: porque é que isto [os atrasos] aconteceu? Não deixamos de reconhecer o mérito da medida. Todas as medidas que o Governo, até agora, tem lançado são meritórias e merecem a nossa aderência. O que se passa é um atraso… As medidas que o Governo tem lançado, seja o lay-off simplificado, sejam as linhas de apoio à tesouraria das empresas têm de respeitar três grandes objetivos: têm de ser rápidas, têm de ser de fácil acesso e têm de ser eficazes e eficientes. O problema é a morosidade. São as duas primeiras variáveis que não se têm cumprido. Elas não têm sido rápidas e têm sido de difícil acesso pela enorme burocracia que contêm.

No lay-off, tinha que existir a perceção do Governo da situação em que estávamos a cair, com o fecho obrigatório das unidades empresariais pela necessidade de conter a pandemia. Houve um erro, diria, de avaliação do Governo ao não ter percecionado que o número de solicitações ia ser desta ordem de grandeza. Claro que seria uma avalanche. 81% das empresas que recorreram ao lay-off simplificado são microempresas. Temos um milhão e 200 mil microempresas. Bastaria que metade delas recorresse à figura do lay-off simplificado…

Mas teria sido possível preparar a máquina da Segurança Social de forma mais eficiente?

O que não houve, na minha opinião, foi a antevisão da realidade que ia ocorrer. Não se preparou a máquina, não se lubrificou a máquina para o fluxo que se perspetivava que iria receber e, ao não se fazer essa preparação, a máquina afunilou.

Durante o primeiro mês as empresas ficaram aflitas e necessitadas de uma resposta. Admito que se tivesse planeado esta questão, a máquina teria respondido de outra maneira.

Portanto, defende que teria sido possível preparar melhor esta “avalanche de pedidos”, como diz? Bastava mais planeamento da parte da parte Governo?

Diz-nos o bom senso que sim, teria sido possível fazê-lo, se previamente, atendendo àquilo que já era perspetivável, se tivessem preparado os meios humanos e as respostas informáticas conjugadas para uma eficiente resposta a este elevado e repentino número de pedidos. Ao não se ter feito isso… foi-se fazendo gradualmente e a máquina foi ficando cada vez mais eficiente, mas durante o primeiro mês as empresas ficaram aflitas e necessitadas de uma resposta. Admito que se tivesse planeado esta questão, a máquina teria respondido de outra maneira.

Em relação ao apoios aos sócios-gerentes, que avaliação faz da solução lançada pelo Governo e acha que essa medida preferível às propostas que entretanto foram aprovadas na Assembleia da República?

Lamentavelmente, o [apoio] que hoje existe não existiu logo desde o princípio. Foi injusto e discriminatório. Aquilo que hoje existe já vem dar uma resposta, diria, cabal a esta situação. Pode ser sempre melhorada, há sempre margem para progressão, mas o que hoje existe já satisfaz as nossas solicitações.

Está preocupado com uma eventual crise política por causa desta questão dos sócios-gerentes, talvez à semelhança do que aconteceu com os professores, até com uma ameaça de demissão por parte do Governo?

Acho que não, até porque a dimensão é incomensuravelmente menor. O facto do PS, em sede parlamentar, se ter oposto à medida é a posição do PS. O Parlamento é soberano. Em democracia as maiorias submetem as minorias. É, por isso, que temos estabilidade parlamentar, porque as maiorias que aí se estabelecem, em geometria variável, dão uma possibilidade de governabilidade do país. As regras devem ser cumpridas e é isso que esperamos com a serenidade da democracia que já levamos, com a maturidade que já temos; que se garanta a estabilidade política e que pequenos faits divers não venham a prejudicar a governabilidade do país.

Crise política é o que menos desejaríamos agora, porque estamos numa situação de emergência, estamos numa terrível situação em termos da nossa economia e todos temos de nos esforçar, mesmo que tenhamos de adotar posições inéditas, inovadoras e algumas respeitando maiores de vontade. Temos de jogar em seleção, cada vez mais, e deixarmo-nos de interesses de jogos de equipas.

O país não deseja, não quer e tudo fará para evitar uma crise política.

Por falar em crise política, como é que viu o desentendimento no seio do Governo por causa do Novo Banco?

O país não deseja, não quer e tudo fará para evitar uma crise política. Aquilo que aconteceu foi o bom senso a imperar, sendo certo, como o senhor ministro das Finanças demonstrou, a existir erro, foi na negociação de venda do Novo Banco e não agora. O Estado tem de honrar os seus compromissos. Podemos criticar a forma do compromisso, mas, depois de o estabelecermos, temos o honrar. É isto que, num Estado de direito, os cidadãos devem fazer: honrar os seus acordos, honrar os seus compromissos. Houve eventualmente falhas desta ou daquela natureza, de comunicação no seio do Governo, mas deixaria isso para os analistas políticos.

António Costa deu o pontapé de saída desta legislatura com um objetivo: valorizar o emprego, os salários e a competitividade. Podemos dar esse objetivo por perdido?

Neste momento, aquilo que nos deve preocupar a todos é salvarmo-nos em termos de saúde pública e salvarmos, o mais possível, a economia. O nosso combate deve ser salvar a economia e os postos de trabalho e isso consegue-se salvando empresas. Tudo o resto, sendo importante, não é prioritário.

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