“Tem de se detalhar com rigor os temas de conflitos de interesses e sigilo das entidades multidisciplinares”, diz Cristina Cabral Ribeiro

Cristina Cabral Ribeiro é Legal Lead Partner da PwC Portugal. É uma advogada com experiência na área de Fusões e Aquisições (M&A), Societário e Contratação Comercial.

Cristina Cabral Ribeiro é Legal Lead Partner da PwC Portugal. É uma advogada com experiência na área de Fusões e Aquisições (M&A), Societário e Contratação Comercial. Tem vindo a trabalhar na assessoria societária a operações nacionais e internacionais de complexidade, incluindo fusões, aquisições, joint-ventures e restruturações. Assessora regularmente empresas familiares e presta aconselhamento jurídico a Ultra High Net Worth Individuals (UHNWI) e High Net Worth Individual (HNWI). Leia a entrevista à Advocatus, na semana do rebranding em que a CCR Advogados passa a PwC Legal.

Se ‘googlarmos’ o nome do escritório CCR, somos direcionados para a página da PwC. Já está tudo em marcha no legal da Pwc?

Somos a área legal da PwC. Os nossos advogados atuam hoje de forma plena sob a marca PwC, sem restrições e completamente integrados com os demais Colegas, transmitindo aos nossos clientes uma segurança de oferta multidisciplinar integrada e madura tendo em conta os seis de anos de ligação que já nos une à network PwC. Dito isto, a marcha está ainda longe do seu destino final. A ambição é continuar no caminho de criar uma prática que ombreie com os maiores players da advocacia em Portugal.

O legal da PwC só era ‘CCR Legal’ devido às limitações da lei. Agora, com a multidisciplinaridade, alguma coisa vai mudar no vosso dia a dia?

A principal mudança consiste em deixar de forçar um conceito de segregação a que o mercado era alheio e, na maior parte das vezes, indiferente. Se recordamos os princípios de direito pelos quais a proibição da multidisciplinaridade terminou, perceberemos que a inexistência de prestadores de serviços globais e transversais era considerada um obstáculo ao desenvolvimento da economia e dos negócios.

Daí que a mudança principal resida na forma como nos apresentamos ao mercado. Na substância, no perímetro legalmente admissível, o nosso trabalho procurava já ser articulado entre as diferentes áreas e equipas PwC de forma a que o cliente não percecionasse qualquer tipo de inconsistências. Essa foi a experiência que acumulámos nos últimos anos, que nos distingue da concorrência e que continuaremos a colocar à disposição dos nossos clientes.

Alguma lacuna que pode apontar a estas novas regras?

Relativamente à legislação sobre sociedades multidisciplinares, creio que terá de ser efetuada uma análise crítica sobre o regime dos atos próprios dos advogados à luz da maturidade que o mercado e os seus operadores vierem a revelar face à flexibilização operada. Ademais, cumprirá detalhar com rigor os temas de conflitos de interesses e sigilo das entidades multidisciplinares. Em Firmas profundamente conscientes da sua reputação, auto e hetero-reguladas como a PwC, em que preservamos os interesses dos nossos clientes como um valor crucial, tal está assegurado. É importante garantir que o mesmo sucederá de forma transversal em todas as entidades multidisciplinares e que, por exemplo, o segredo profissional, que é fundamental numa relação Advogado-Cliente, permaneça preservado.

Há clientes que procuram apenas a prática legal. Mas cada vez menos isso é relevante, porque não sentimos nem promovemos essas barreiras no dia-a-dia. Convocamos todos os profissionais relevantes para abordar o tema suscitado pelo Cliente. E isso poderá representar convocar a presença de um Advogado(a), Fiscalista, Engenheiro(a) Ambiental, Contabilista, Economista, Gestor(a), Programador(a), Matemático(a), Sociólogo(a), Arquiteto(a), etc. E é com sensação de dever cumprido que constato que o Advogado é cada vez mais chamado nas Equipas PwC pelo valor que acrescentamos.”

Como vê o facto de, com a Pérez- Llorca a chegar a Portugal, ter-se assistido a uma debandada de sócios da EY de volta aos escritórios de advogados. Isso é um sinal de que é menos interessante estar uma consultora?

Em primeiro lugar é a sinalização de que há players a acreditar no potencial do mercado português e dos seus profissionais. Isto só pode ser uma boa notícia. Em segundo lugar, é a demonstração que negócios que querem crescer de forma rápida não têm tempo para crescimentos orgânicos. Na PwC constituímos também a nossa Equipa com recrutamento de excelentes advogados de outras casas. É o mercado a funcionar.

Sobre extrapolar conclusões desse movimento sobre o sucesso da prática Legal nas Big4, não vejo qualquer diferença entre as saídas que refere e outras em práticas mais tradicionais. Todos nos recordamos de fusões em escritórios de advogados que foram menos conseguidas e mudanças estrondosas de profissionais de relevo entre escritórios tradicionais. Principalmente, não vislumbro diferenças do sítio onde estou sentada: uma sociedade de advogados orgulhosamente enraizada numa Big4, alinhada com a sua estratégia e com um plano arrojado de crescimento.

Falando na sua carreira e experiência, qual é a diferença de ser Managing Partner do legal da PwC versus o estar num escritório de advogados?

A diferença é colossal. É uma viagem que dificilmente é percecionada por quem nunca comprou o bilhete. Na PwC temos mais de 360.000 colegas em mais de 150 países, 2500 dos quais na PwC Portugal. Costumo referir nas entrevistas de Colegas que trabalhar na PwC é a melhor proteção diplomática que se pode ter! Temos escritórios em quase todas as capitais do mundo. A riqueza de recursos e a aprendizagem que dela pode resultar é, portanto, incomensurável.

Do lado dos clientes, poucas serão as entidades que em Portugal nunca trabalharam com a PwC e as Big4 estão na fase de incepção de qualquer negócio ou plano de investimento. Por isso, como profissional, sinto que estou cada vez mais próxima da iniciativa económica, e menos ao puro serviço de identificação de problemas on demand. Soluções com sentido para o negócio ponderados todos os ângulos, jurídicos incluídos. Até porque, face à integração com os demais profissionais, os nossos clientes esperam que as soluções apresentadas tenham sido já ponderadas por todas as equipas contratadas da PwC. Eleva a fasquia e acelera o ritmo e profundidade das nossas conclusões. E, com isso, o desafio e a qualidade do trabalho!

Finalmente, e alinhada com o que disse: a curva de aprendizagem de todos os nossos profissionais (eu incluída) é impressionante pela exposição permanente de desafios dos nossos clientes e da nossa própria organização. Como uma das maiores prestadoras de serviços a nível mundial, a PwC repensa-se todos os dias da sua jornada e também nesse sentido o passo é muito mais acelerado.

A posição das consultoras em relação à abertura à multidisciplinaridade é visto, por si, como é algo do género “chegamos agora a um sítio onde já estavámos”? Vai mudar alguma coisa?

Os nossos clientes foram inexcedíveis na confiança que depositaram nos nossos profissionais independentemente da marca sob a qual atuávamos. Sem prejuízo, não nego a perspetiva de crescimento ainda mais acelerado após este momento. Para isso, temos previsto sermos 50 advogados a partir de setembro, distribuídos nos nossos escritórios de Porto e Lisboa. E continuaremos a nossa trajetória de recrutamento. Esperamos também expandir para áreas em que presentemente não atuamos, embora à data tenhamos já todas as áreas essenciais na advocacia de negócios.

Quando as consultoras começaram a investir em escritórios de advogados, achava-se que os escritórios desapareceriam e isso não aconteceu…Como explica isso?

Nunca pensei assim e, seis anos volvidos, não é essa a minha opinião. Aliás, não é esse o exemplo que temos noutros mercados estrangeiros. Por vários motivos, nem todas as Big4 em Portugal têm área legal, e ninguém poderá assumir que o mercado se irá concentrar de forma que apenas as Big4 permaneçam como prestadores de serviços. O que acredito, e sentimos de forma crescente, é que num número muito relevante de trabalhos em que há necessidade de profissionais de diferentes áreas, a força das entidades multidisciplinares associadas às Big4 será cada vez mais predominante.

Quando se abre esta possibilidade de abrir os escritórios a consultoras, os advogados vão continuar a ser apenas advogados ou o mundo vai mudar?

Eu mudei. E quem não mudar a forma clássica de praticar o direito terá dificuldades em satisfazer as necessidades dos clientes. Como em tudo, terá de existir um exercício do profissional que quero ser, que clientes quero assistir e como quero ser recordada pelos mesmos. A essas perguntas, a minha resposta é simples: quero trabalhar com clientes exigentes, resolver problemas complexos e que os clientes se recordem de mim como a pessoa que os ajudou de forma expedita e competente.

É relevante o trabalho da PwC que entra pela via PwC, há lógica de captação de clientes para a PwC?

Se me perguntar dos fatores que mais me orgulham no nosso caminho, e falo reconhecendo o mérito de toda a Equipa do Legal da PwC, tem sido a capacidade de ganhar presença PwC nos clientes e com isso permitir incluir novas áreas e explorar oportunidades que antes não eram possíveis no universo PwC. Há clientes que procuram apenas a prática legal. Mas cada vez menos isso é relevante, porque não sentimos nem promovemos essas barreiras no dia-a-dia. Convocamos todos os profissionais relevantes para abordar o tema suscitado pelo Cliente. E isso poderá representar convocar a presença de um Advogado(a), Fiscalista, Engenheiro(a) Ambiental, Contabilista, Economista, Gestor(a), Programador(a), Matemático(a), Sociólogo(a), Arquiteto(a), etc. E é com sensação de dever cumprido que constato que o Advogado é cada vez mais chamado nas Equipas PwC pelo valor que acrescentamos.

A integração de profissionais com backgrounds diferentes é um desafio em termos de encaixe de diferentes perfis e egos. Na PwC somos uma casa com várias dezenas de áreas de negócios, com tradição de integração das diferenças. Considero por isso que já dominamos a fórmula de gerir a nossa Torre de Babel, suportados nos nossos valores e princípios muito fortes”

No recrutamento de captação de talento, ainda há o estigma de advogados irem para consultoras?

Nos talentos under 45, que são o core da nossa Equipa, não creio. Pelo contrário. Somos altamente concorrenciais pelo ambiente e oportunidades que proporcionamos. Esta realidade é bastante diversa da prática em escritórios muito amadurecidos, alguns com problemas de sucessão e muitos com limites à progressão nas carreiras. O nosso contexto é diverso e promove o entrosamento entre várias áreas e países de forma muito rigorosa, e por isso apelativa.

Onde estão os selling points no recrutamento?

Para além do referido, a informalidade do ambiente e o reconhecimento da marca no mercado pelos clientes são fatores muito valorizados. Um último que me deixa particularmente orgulhosa é o feedback dos nossos Colegas e alumni, dando nota da qualidade dos projetos em que estamos envolvidos e qualidade do ambiente de trabalho.

Como vê a multidisciplinaridade nos grandes escritórios a materializar-se? Em que áreas de negócio?

Vejo como uma possibilidade de execução lenta, com risco de erros de casting. A célebre frase a “cultura come a estratégia ao pequeno-almoço” é real. A integração de profissionais com backgrounds diferentes é um desafio em termos de encaixe de diferentes perfis e egos. Na PwC somos uma casa com várias dezenas de áreas de negócios, com tradição de integração das diferenças. Considero por isso que já dominamos a fórmula de gerir a nossa Torre de Babel, suportados nos nossos valores e princípios muito fortes. Casas sem essa cultura de integração e consistência de valores e princípios poderão ter dificuldades nesse caminho e choques culturais relevantes. Termino, porém, com a nota positiva da imensa vantagem da oferta multidisciplinar!

 

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