Da TAP à saúde, os dossiês urgentes que aguardam o novo Governo

O 2º Governo de Luís Montenegro vai tomar posse nos próximos dias e terá pela frente temas urgentes, uns que vêm de trás e outros que entretanto aceleraram. Veja as prioridades identificadas pelo ECO.

Luís MontenegroLusa

O chumbo da moção de confiança apresentada por Luís Montenegro atirou o Governo para modo de gestão e levou à suspensão de processos como a venda da TAP. Ganhas as eleições de 18 de maio, a AD regressa agora com um novo Executivo, mas com dossiês urgentes como a nomeação do governador do Banco de Portugal, mas também com maiores exigências políticas nas questões da AIMA, do drama na saúde e da prevenção dos incêndios.

Veja aqui as prioridades:

Mandato de Centeno termina em julho. Quem se segue ?

A nomeação do próximo governador do Banco de Portugal (BdP) é um dos dossiês mais urgentes para o Governo. O mandato de Mário Centeno termina em julho e o Executivo de Luís Montenegro terá de tomar rapidamente uma decisão sobre a recondução ou não do ex-ministro das Finanças, com quem mantém uma relação tensa, num processo que, regra geral, demora cerca de um mês.

A nomeação do governador é essencialmente uma escolha política, feita por resolução do Conselho de Ministros, sob proposta do ministro das Finanças. Ainda que não seja obrigado, o Governo pode consultar os partidos antes de formalizar a indicação. Obrigatória é sim a audição parlamentar prévia à nomeação na Comissão de Orçamento, Finanças e Administração Pública (COFAP), da qual resulta um parecer sem caráter vinculativo.

Em janeiro, após Mário Centeno ter anunciado que não iria concorrer à Presidência da República e ter reiterado a disponibilidade para um segundo mandato, o Governo considerou ser extemporâneo tomar uma decisão. Um mês antes, o governador garantiu estar a cumprir o mandato da “melhor forma” que sabe, afastando a ideia de estar a fazer oposição ao Governo, numa altura em que os seus alertas não caíram bem junto do Ministério das Finanças.

Na ocasião, Mário Centeno saiu ainda em defesa dos técnicos do regulador que assinaram um estudo sobre o impacto económico do IRC, criticado pelo ministro das Finanças. O antigo ministro das Finanças de António Costa foi nomeado governador pelo anterior Executivo (PS) em 2020, o que originou críticas da oposição.

O Governador do Banco de Portugal, Mário Centeno, faz a sua intervenção durante o encontro anual do Conselho da Diáspora Portuguesa na Cidadela de Cascais, 20 de dezembro de 2024. TIAGO PETINGA/LUSA TIAGO PETINGA/LUSA

Resolver os atrasos na AIMA

A gestão da imigração não foi tema que tivesse sido suspenso pela queda do Governo. Antes pelo contrário, esteve no centro da campanha eleitoral e poderá – segundo várias análises – ter sido um dos principais fatores por detrás de um resultado que levou o Chega à condição de principal força da oposição, com o segundo maior número de deputados.

A 3 de maio, na véspera da campanha eleitoral, o ministro da Presidência, António Leitão Amaro, trouxe logo o assunto para cima da mesa, dizendo que a Agência para a Integração, Migrações e Asilo (AIMA) ia notificar cerca de 18 mil imigrantes em situação ilegal para abandonarem o país.

A AD foi o alvo de crítica da esquerda à direita, com acusações de “eleitoralismo” e “propaganda” numa disputa pelos eleitores do Chega. No contra-ataque, Luís Montenegro responsabilizou o PS e os governos de António Costa pela situação a que o país chegou.

Já depois das eleições, a 22 de maio, o ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, disse que o Governo decidiu alargar imediatamente os horários de funcionamento dos serviços da Direção-Geral dos Assuntos Consulares e Comunidades Portuguesas, além de reforçar as equipas em Lisboa e no Porto, numa tentativa de aliviar o caos vivido nos dias anteriores, com longas filas de imigrantes nas instalações do Porto, à procura de conseguirem a regularização da sua situação.

A 29 de maio, o presidente da AIMA disse que a organização já analisou os 440 mil pedidos referentes a manifestações de interesse que estavam pendentes há um ano, quando entrou em vigor o Plano de Ação para as Migrações, havendo ainda perto de 130 mil a aguardar decisão. Resolver este problema será uma das prioridades do novo Governo, especialmente tendo em conta a sensibilidade política do tema.

Lusa

Retomar a privatização da TAP

O processo de privatização da TAP já foi interrompido por duas vezes pela queda de um governo. Primeiro em novembro de 2023, com a demissão de António Costa, e novamente em março último com o chumbo da moção de confiança apresentada pelo Executivo de Luís Montenegro.

O decreto-lei estava a semanas de ser aprovado em Conselho de Ministros, mas o Governo apressou-se a esclarecer que não avançaria com a venda da transportadora aérea estando em gestão, mas continuaria com os trabalhos preparatórios, a cargo da Parpública. O Ministro das Infraestruturas, Miguel Pinto Luz, afirmou em finais de março que o “trabalho de backoffice” para a venda da companhia aérea “continua a ser feito e será vertido para a pasta de transição”.

Desde que o Governo caiu, a TAP apresentou os resultados para a totalidade do ano de 2024 e o primeiro trimestre de 2025, e em ambos os períodos os números pioraram. A transportadora fechou o ano passado com lucros de 53,7 milhões, uma redução de 69,7% face a 2023. Nos primeiros três meses de 2025 registou um prejuízo de 108,2 milhões, mais 18,1 milhões do que no mesmo período do ano passado, e foi a única a baixar as receitas entre as principais companhias. Já o endividamento caiu para quase metade.

Os grupos IAG, Lufthansa e Air France – KLM estão interessados na operação e exprimiram uma certa frustração com o atraso. Este deverá ser, por isso, um dos dossiês a que o novo Governo dará prioridade após tomar posse, até porque o trabalho preparatório vai bem avançado.

TAP Lusa

Relançar o concurso da Alta Velocidade entre Lisboa e Porto

O concurso para a segunda parceria público-privada (PPP) para a linha de alta velocidade entre Porto e Lisboa teve como único concorrente o consórcio de sete construtoras portuguesas, liderado pela Mota-Engil, que já tinha garantido a primeira PPP.

Só que a proposta apresentada não respeitava na íntegra o caderno de encargos, acabando por ser chumbada pelo júri. Entretanto deu-se a queda do Governo mas, ao contrário da TAP, o entendimento foi que mesmo em gestão seria possível avançar com um novo concurso, o que ainda não aconteceu.

A Infraestruturas de Portugal publicou em abril um anúncio de pré-informação no suplemento do Jornal Oficial da União Europeia (JOUE), com uma linha mais curta. Em vez de ir de Oiã (Oliveira do Bairro, distrito de Aveiro) até Soure (distrito de Coimbra), o segundo troço terminará em Taveiro, no concelho de Coimbra, cerca de 10 quilómetros a norte.

De forma a que os prazos não derrapem mais, a aprovação do lançamento do novo concurso deverá ser uma das primeiras decisões do novo Governo.

Wikimedia commons 29 setembro, 2016

Novobanco espera pela Lone Star, mas Governo tem palavra a dizer

O processo de venda do Novobanco conheceu desenvolvimentos importantes desde a queda do Governo em março, nomeadamente quanto a possíveis interessados e a uma potencial entrada em bolsa, as duas opções que estão em cima da mesa e cuja decisão continua nas mãos do acionista americano, a Lone Star (como há dois meses).

Isto não significa que o Executivo — nota importante, 25% do Novobanco é detido pelo Estado — não tenha uma palavra a dizer no que poderá ser o desfecho envolvendo um dos cinco maiores bancos a operar em Portugal.

A 21 de maio, três dias após as legislativas, o ministro das Finanças manifestou a sua oposição em relação a um eventual aumento da importância de bancos espanhóis no mercado nacional, sinalizando claramente que não vê com bons olhos que o Novobanco seja vendido ao Caixabank. “É do interesse do país que não haja uma excessiva concentração do setor bancário de bancos de um único país, como é o caso de Espanha. (…) A banca espanhola representa talvez um pouco mais do que um terço do mercado português. Por uma questão de concentração e dependência, esse valor não deveria aumentar”, afirmou Miranda Sarmento à RTP.

O banco continua a trabalhar no seu IPO, já há versões de um prospeto a circular com o regulador do mercado, mas a Lone Star terá outras opções e que podem passar pelos franceses do BPCE (donos do Natixis) ou pela Caixa Geral de Depósitos (CGD). O CEO do banco público disse publicamente que a instituição poderia estar interessada na carteira de empresas do Novobanco, mas admitiu que fazer uma separação dos negócios do banco seria “complexo” e ficar com o banco todo iria levantar obstáculos junto da Autoridade da Concorrência.

Defesa vai exigir esforço adicional

O setor da defesa será uma das prioridades do Governo, com o Executivo obrigado a acompanhar as metas de investimento para o setor, que atualmente apontam para que os países invistam o equivalente a 2% do PIB no setor. No entanto, essa percentagem deverá ser revista em alta para 3,5% já em junho, na cimeira da NATO, que vai decorrer em Haia, o que implica um esforço orçamental ainda mais significativo. Luís Montenegro já garantiu que o país vai cumprir as metas e deu 2030 como prazo para cumprir o objetivo de 2%, mas uma revisão desta meta poderá deixar o país ainda mais longe do compromisso assumido pela Aliança Atlântica.

Ainda antes de serem conhecidos os resultados das eleições, o Executivo já adiantara que vai recorrer à cláusula da Comissão Europeia de salvaguarda para investir no setor sem afetar o défice.

“No fundo, [este procedimento] possibilita que nos próximos anos seja possível investir mais na área da Defesa, mas sem prejudicar o caminho de sustentabilidade das públicas”, justificou o chefe do Governo, após o Executivo ter adiantado que iria pedir a ativação do mecanismo que permite que excluir do cumprimento das regras orçamentais uma parte relevante do investimento em Defesa. Portugal poderá, assim, investir até 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB) na “área da Defesa” sem que essa despesa seja contabilizada “nos limites impostos pelos tetos da despesa primária líquida”.

Quanto aos números atuais, no início deste mês, o ministério da Defesa tutelado por Nuno Melo anunciou que o investimento em Defesa no ano passado ultrapassou as previsões e deverá situar-se nos 1,58% do Produto Interno Bruto (PIB), número que diverge da estimativa da NATO. Segundo o ministério da Defesa, “mesmo com uma revisão em alta do crescimento da economia nacional, a execução deverá fechar em 2024 em 1,58% do PIB, correspondente a 4.481,50 mil milhões de euros”.

Este número não coincide com as estimativas divulgadas no final de abril pela NATO, no relatório anual do secretário-geral da Aliança Atlântica, que indica que Portugal terá investido 1,46% do PIB no ano passado, sendo o sexto país da aliança que menos investiu em Defesa em 2024.”

Militares durante a sessão de abertura da edição de 2025 do Dia da Defesa Nacional presidida pelo ministro da Defesa Nacional, Nuno Melo (ausente da foto), no Regimento de Cavalaria n.º 6 em Braga, 13 de janeiro de 2025. HUGO DELGADO/LUSA HUGO DELGADO/LUSA

Cirurgias fora de horas e urgências prometem verão atribulado na saúde

A resposta do Serviço Nacional de Saúde (SNS) durante o verão, época de maior afluência às urgências com o aumento de doenças sazonais, mais turismo e aumento das temperaturas, a que se aliam as férias dos profissionais de saúde, levanta todos os anos desafios. Para dar resposta, o Plano para a Resposta Sazonal e Saúde – módulo de verão entrou em vigor no início de maio e estende-se até 30 de setembro.

O plano estipula que os hospitais só podem fechar urgências externas com autorização da Direção Executiva do SNS (DE-SNS) e as Unidades Locais de Saúde (ULS) passam a ter de comunicar diariamente a taxa de ocupação de camas e a afluência aos serviços de urgência. Devem também elaborar, atempadamente, escalas de serviço, de modo a garantir a presença de equipas adequadas às necessidades assistenciais e, sempre que necessário, reavaliá-las e remetê-las à DE-SNS com, pelo menos, dois meses de antecedência.

As urgências no verão não são o único tema a que o Governo terá de dar prioridade. A notícia de que um dermatologista do Hospital Santa Maria terá recebido 400 mil euros em 10 sábados de trabalho adicional em 2024, tendo um dos dias sido utilizado para retirar lesões benignas aos pais, abriu uma “caixa de pandora”. O Ministério Público abriu um inquérito e a Inspeção-Geral das Atividades em Saúde (IGAS) também avançou com um inquérito à atividade cirúrgica adicional realizada no SNS.

O peso das cirurgias no SNS realizadas fora do horário regular disparou nos últimos cinco anos e, em 2024, já representavam 32,6% do total das operações nos hospitais públicos, tendo superado as 239 mil intervenções, de acordo com dados da Direção Executiva do SNS disponibilizados ao ECO.

Como o ECO explica aqui, as cirurgias “fora de horas” estão previstas no Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia (SIGIC), como mecanismo para reduzir o excesso de doentes em lista de espera. O Governo criou, porém, em março um grupo de trabalho temporário para preparar o fim deste regime e do Sistema Integrado de Gestão de Acesso (SIGA) substituindo-os pelo Sistema de Informação Nacional de Acesso a Consulta e Cirurgia (SINACC).

Lusa

Verão quente nos incêndios com “Operação Torre de Controlo”

O novo Executivo recebe o dossiê quente dos meios aéreos de combate a incêndios alugados pelo Estado quando o calendário da época de incêndios já entrou na segunda fase mais gravosa da escala. A operação “Torre de Controlo” veio pôr em causa procedimentos de empresas fornecedoras do Estado. O contingente preparado pela equipa governamental em gestão é de 76 meios aéreos, mas não se sabe ainda se haverá consequências a nível de frota disponível.

Com a Fase Charlie de combate a incêndios, a segunda mais alta da escala, em vigor ao longo de junho, aspeto em que não se esperam alterações é no contingente humano, relativamente ao que foi decidido em abril pelo Governo do mesmo primeiro-ministro. É essa a convicção do presidente da Liga dos Bombeiros, António Nunes, em declarações ao ECO.

A mobilização de meios humanos subiu de 11.716 na fase Bravo (15 a 31 de maio) para 13.593 na atual. A 1 de julho, fase Delta, o dispositivo é reforçado para 15.028 efetivos, que estarão de prevenção na altura mais crítica.

De 1 a 15 de setembro, quando se regressa ao escalão Charlie, serão 12.780 os elementos humanos preparados para o combate às chamas.

Preocupação constante é a da gestão dos terrenos agrícolas, florestais e de matos em zona urbana, cuja limpeza, decidida ainda pelo Governo de gestão, foi alargada para 15 de junho.

Incêndio florestal em Aguiar do Sousa no arredores do Porto Ricardo Meireles/Lusa

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