A formação profissional dos trabalhadores a part time

  • Joana Carneiro
  • 22 Dezembro 2023

A jurisprudência tem entendido que cabe ao empregador o ónus de provar que assegurou as horas mínimas anuais de formação profissional e que a formação foi determinada por acordo ou por apenas si.

Não nos deixámos incendiar pela crise política, nem pelo que será o debate eleitoral das matérias laborais controversas; antes mantivemos a ideia inicial de explorar uma questão que tem sido frequentemente colocada pelos nossos clientes, a propósito dos trabalhadores a tempo parcial.

As empresas, de acordo com o art.º 131.º do Código do Trabalho (CT), têm o dever de formar os seus trabalhadores. A lei determina que todas as empresas devem assegurar 40 horas por ano de formação contínua a, pelo menos, 10% dos seus trabalhadores. Tratando-se de contrato a termo de duração igual ou superior a três meses, o número de horas de formação em cada ano é proporcional à duração do contrato nesse ano.

A jurisprudência tem entendido que cabe ao empregador o ónus de provar que assegurou as horas mínimas anuais de formação profissional e que a formação foi determinada por acordo ou por apenas si, mas neste caso deve coincidir ou ser afim com a atividade prestada (artigos 342.º, n.ºs 1 e 2 do Cód. Civil e 133.º, n.º 1 do CT). Assim, os empregadores devem convocar os seus trabalhadores para a formação profissional e ficar com provas de que fizeram essa convocatória, mesmo que o trabalhador não compareça na formação.

A questão é se nos contratos de trabalho a tempo parcial o cômputo das horas de formação profissional pode ser feito de forma proporcional. Esta proporcionalidade, como vimos, resulta da própria lei no caso do contrato de trabalho a termo (art.º 131º, n.º2, do CT), e há já jurisprudência a defender que a mesma também é aplicável no caso de o contrato de trabalho ficar suspenso, designadamente por incapacidade temporária para o trabalho, pelo que se a suspensão do contrato se inicia depois do início do ano, é devido o proporcional de crédito de horas à parte do ano em que não se verifica a suspensão do contrato de trabalho1.

Apesar de o simulador da ACT (Autoridade para as Condições do Trabalho) não parecer preparado para calcular corretamente as horas de formação profissional dos trabalhadores a part time, na proporção do respetivo período normal de trabalho semanal (pois apesar de conter este campo, resulta no mesmo número de horas de formação e até num montante de retribuição superior ao do trabalhador a tempo completo, numa situação comparável), existe um documento da (então) Inspeção Geral do Trabalho de 2005, elaborado à luz do CT de 2003, que admite que os trabalhadores com contrato a tempo parcial têm uma situação definida pela regra da comparabilidade aos trabalhadores a tempo completo, seja a natureza do seu vínculo por tempo indeterminado ou a termo, e que se aplicam as regras da proporcionalidade relativamente à respetiva duração do trabalho.

Por fim, há alguns autores que já se debruçaram sobre esta questão e salientam que o trabalhador a tempo parcial não pode ter tratamento menos favorável do que o trabalhador a tempo completo em situação comparável, pelo que aquele dispõe do direito à formação profissional analogamente a este, porém, o número mínimo de horas de formação profissional a ministrar anualmente a trabalhadores a part time deverá ser reduzido na proporção do seu período normal de trabalho semanal, segundo a regra vertida no art.º 154 nº3, alínea a) do CT.

Concordamos que só desta forma equitativa é possível exigir ao empregador a formação profissional adequada dos seus trabalhadores, e perceberem juntos que “a mente que se abre a uma nova ideia jamais voltará ao seu tamanho original”.

1Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, Processo: 150/21.0T8AVR.P1, de 14-02-2022.

  • Joana Carneiro
  • Sócia da JPAB – José Pedro Aguiar-Branco Advogados

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