“As sweet as a pastel de nata”
Parece que, na narrativa pública, de um dia para o outro, algo de estrutural mudou – uns estrangeiros disseram bem de nós.
Reconhecimentos internacionais espoletam em nós um certo bacoquismo patriótico que não deixa de ser enternecedor. Parece que, na narrativa pública, de um dia para o outro, algo de estrutural mudou – uns estrangeiros disseram bem de nós. Não quero, de forma alguma, retirar o significado à distinção, diminuir a relevância de vir do The Economist ou menosprezar o mérito das empresas no pós-pandemia, mas se olharmos para esta distinção como sinónimo de que devemos continuar da mesma forma, então isto foi do pior que nos aconteceu.
Segundo a revista britânica, Portugal destacou-se por “forte crescimento do PIB, baixa inflação e um mercado acionista dinâmico”. Contudo, é de realçar que, das cinco economias mais bem classificadas (para além de nós: Irlanda, Israel, Colômbia e Espanha), fomos a que crescemos menos e só nós e os espanhóis crescemos menos de 3%. E é, como sabemos, no crescimento e na produtividade que deve estar o centro do combate à pobreza em Portugal.
Bons rankings nacionais não pagam contas aos portugueses, não mudam as suas vidas. Habituámo-nos a lugares cimeiros em destinos de turismo que não significam nada e se deste primeiro lugar queremos retirar algo, deve ser que as circunstâncias para a convergência estão reunidas. A economia ibérica tem recuperado bem e de forma atrativa, é certo, mas isto não passa de uma oportunidade que podemos agarrar com reformas ou deitar fora com o nosso ‘assobia para o lado’.
Dir-me-ão que é um caminho. Não discordo, mas não deixa de ser um caminho de pedras. O atraso em muitas áreas é significativo e transformar uma economia de baixos salários numa economia similar às do centro da Europa não pode ser fácil, porque, se assim fosse, devíamos refletir sobre o que fizemos até agora.
É chocante como 9,2% dos trabalhadores em Portugal, em 2024, se encontravam em risco de pobreza. É gente que faz o que pode, trabalha, contribui para o país e o único pedido que faria era chegar ao fim do mês melhor do que remediado. No texto “Portugal e o Elevador Social: Nascer pobre é uma fatalidade?” (de Susana Peralta, Bruno P. Carvalho e Miguel Fonseca) concluía-se que uma em cada quatro pessoas que, aos 14 anos, vivia num agregado com má situação financeira é pobre.
A pobreza é uma máquina multiplicadora implacável que, com um elevador social desafinado como o nosso deixa muitas vítimas. Olhar para estes relatórios e achar que nada tem a ver com os níveis de escolaridade e com a produtividade é olhar para outro problema qualquer. A produtividade por pessoa empregada em Portugal, em 2023, era 76% da média da União, sendo a sexta mais baixa dos países analisados. Avassalador.
Sobre este tema, há pouco menos de um ano, tive a grande oportunidade de dar uma entrevista ao ECO (publicada em duas partes) com o Rui Lopes Ferreira, CEO do Super Bock Group. A ideia era colocar duas gerações de licenciados em economia pela FEP em conversa, perceber o que nos une e o que nos separa. Depois de publicada a entrevista, nunca pensei que a escolha do ECO, uma aparente banalidade, pudesse gerar tanta controvérsia.

Se estes rankings podem servir para alguma coisa, é para percebermos que pode haver esperança, que com políticas públicas capazes e reformas estruturadas podemos continuar este processo de crescimento, podemos retirar pessoas da pobreza. Os desafios são muitos, da demografia à competitividade fiscal, passando pela morosidade na justiça ou pelo desemprego jovem, por exemplo.
Contudo, hoje gostaria de terminar com uma provocação. Em 2022, o ECO publicava um texto que era ilustrado por este gráfico:

Muitas vezes tenho insistido que um dos maiores problemas da nossa economia está aqui, nestas duas linhas. Apesar de já ter perguntado a vários economistas o porquê da divergência depois de 2000, não consegui ainda obter uma resposta. Acredito que responder ao porquê será essencial para pensar na pergunta seguinte. Sobre isto, o que vamos fazer?
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