Bananas e laranjas. As frutas podres no Novo Banco
O ex-governador do Banco de Portugal disse ontem na Comissão de Inquérito que vender o Novo Banco foi como “vender um cabaz de fruta que está parcialmente apodrecida”.
É a frase que marca mais uma passagem de Carlos Costa pela Comissão Parlamentar de Inquérito ao Novo Banco. Disse o ex-governador do Banco de Portugal que a venda do Novo Banco “foi como vender um cabaz de fruta que está parcialmente apodrecida. Não posso contar com a benevolência ou generosidade do comprador para que ele me pague toda a fruta como sendo de qualidade.”
Esta afirmação é grave porque mostra que o Banco de Portugal sabia que o Novo Banco estava descapitalizado entre a data de resolução (2014) e a data da venda (2017). Questionado pelo deputado socialista João Paulo Correia do porquê de chamar o Novo Banco de “banco bom”, Carlos Costa desabafou: “Queria que eu tivesse anunciado, nessa noite [em 2014], que tinha criado uma coisa da qual deviam fugir?”
Sim, Dr. Carlos Costa, queríamos que o Banco de Portugal tivesse contado a verdade e não tivesse permitido que os portugueses continuassem alegremente a confiar e a depositar o seu dinheiro num banco com frutas podres, e com a gravidade adicional de essas frutas podres não estarem provisionadas no balanço.
As bananas
Vamos por partes. Carlos Costa tem razão quando afirma que o Novo Banco herdou muitas frutas podres do Banco Espírito Santo e a culpa não é só de Ricardo Salgado, que deu créditos mal dados e fez negociatas que levaram à falência do banco. A culpa também é de uma supervisão liderada por Carlos Costa que foi “banana”. Segundo o dicionário Priberam, banana é “um indivíduo sem energia, sem iniciativa, um molenga”.
Esta “falta de energia” foi precisamente a conclusão a que chegou Costa Pinto no tal relatório secreto que avaliou o trabalho do Banco de Portugal no caso BES. Defende o autor da avaliação que “uma atuação mais atempada, mais energética da supervisão podia ter evitado ou minimizado os problemas”.
Na Comissão Parlamentar de Inquérito ao caso BES em 2015, os deputados também concluíram que a instituição liderada por Carlos Costa fez uma supervisão “tardia”, “pouco eficaz” e que “optou por um estilo de intervenção baseado na construção de soluções por acordo e persuasão moral”. Ou seja, foi “banana”.
As laranjas
Depois de falhar na supervisão, Carlos Costa também falhou na venda do Novo Banco em 2015. Na altura, a imprensa dava contas da existência de uma proposta dos chineses do Anbang que queriam pagar 4 mil milhões de euros pelo Novo Banco. Mas tarde foi notícia que a Fosun e a Apollo estariam a pensar oferecer 2 mil milhões de euros pelo banco.
Só que o Banco de Portugal achou que era pouco e decidiu não vender. Não vendeu porque o Governador tinha acabado de ser reconduzido por Pedro Passos Coelho e não quis provocar o embaraço político ao Governo laranja de ir a eleições, em 2015, com o Novo Banco vendido abaixo dos 4,9 mil milhões injetados em 2014.
Mas os governadores não são escolhidos para fazer política. O resultado está à vista. Dois anos depois o Novo Banco não foi vendido nem por 2, nem por 4 mil milhões. Pagámos 3,89 mil milhões para que alguém ficasse com o banco.
O melão
A venda acabou por ser feita aos norte-americanos do Lone Star com um mecanismo de garantias públicas que se comprometeu a injetar até 3,89 mil milhões de euros. Este mecanismo de capital contingente foi o reconhecimento de que entre a resolução (2014) e a venda (2017), o Novo Banco esteve descapitalizado com a conivência do regulador.
Como escreveu o jornal Público no ano passado, durante três anos — em 2014, 2015 e 2016 –, o Banco de Portugal, as administrações do Novo Banco e a auditora PwC consideraram que as carteiras de créditos herdadas do BES estavam devidamente provisionadas, não colocando ênfases ou reservas às contas, nem alertas para eventuais necessidades adicionais de capital. Afinal, as contas não estavam certas, como reconhece agora o próprio Carlos Costa ao admitir que havia frutas podres no balanço do Novo Banco.
Depois de ter falhado na supervisão do BES, depois de ter falhado na venda do Novo Banco, e depois de os contribuintes já terem gasto 8 mil milhões de euros, Carlos Costa vem agora reconhecer que afinal havia frutas podres no banco. Nós, os contribuintes, com um grande melão, continuamos a pagar os desmandos de Ricardo Salgado e a incompetência de Carlos Costa.
É caso para dizer que há algo de podre no reino da supervisão em Portugal.
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