É preciso libertar o FEFSS para bem do futuro das pensões dos portugueses
A almofada das pensões alcançou um valor histórico de 35,9 mil milhões de euros em 2024 e uma rendibilidade de 5,9%. Contudo, a limitação da sua gestão está a bloquear todo o seu potencial.
Imagine o Cristiano Ronaldo a jogar com as pernas atadas. Difícil, não é? Agora imagine que, mesmo assim, o capitão da seleção das Quinas consegue correr, fazer assistências e até marcar vários golos. Parece impossível, mas é o que voltou a acontecer com o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social (FEFSS) em 2024, que fechou o ano passado com um valor histórico de quase 36 mil milhões de euros.
Apesar de todas as limitações regulamentares impostas à gestão da almofada das pensões, José Vidrago e a sua equipa foram capazes de gerar uma rendibilidade líquida de transferências de 5,9% no ano passado, que se traduziu em cerca de 2 mil milhões de euros de valor acrescentado para os cofres dos futuros pensionistas. Como grau de comparação, os Planos de Poupança-Reforma (PPR) com alocação de ativos semelhantes ao FEFSS ficaram-se por uma rendibilidade média ligeiramente acima dos 4% em 2024.
Não está mal para um fundo que é obrigado por lei a ter metade do seu património em títulos da dívida pública portuguesa, que renderam tanto em 2024 como um depósito a prazo e que voltaram a penalizar fortemente o desempenho do FEFSS no ano passado. Excluindo as obrigações do Tesouro da equação, o FEFSS teria apresentado ganhos de 8,9% em 2024, 3 pontos percentuais acima dos 5,9% a que fechou 2024.
Para bem das pensões futuras dos portugueses, ainda bem que o FEFSS pode investir em ações que, tal como tem sucedido ao longo da última década, foram os ativos que mais renderam na carteira do fundo em 2024, alcançando ganhos de 19%.
Estas discrepâncias sublinham, uma vez mais, a necessidade de se reavaliar as restrições legais impostas ao fundo em termos de alocação por ativos, para alinhar a política de investimento da almofada das pensões com as suas responsabilidades e objetivo de longo prazo.
Em 2024, o FEFSS demonstrou que pode alcançar resultados positivos mesmo com restrições consideráveis. No entanto, é fundamental repesar a sua política de investimento.
Numa entrevista ao ECO que será publicada na segunda-feira, José Vidrago reconhece que o FEFSS apresenta “um grau de aversão ao risco excessivo” e que há margem para uma maior diversificação da carteira e uma potencial melhoria do perfil risco-retorno do fundo. Mas para isso é preciso haver vontade política para fazer uma profunda reforma no FEFSS, como, aliás, o Conselho das Finanças Públicas já pediu.
Isso passa, desde logo, por uma revisão profunda do regulamento de gestão em vigor e pela revisão do estatuto do Instituto de Gestão de Fundos Capitalização da Segurança Social (IGFCSS), por forma a transformá-lo numa sociedade gestora à imagem do que já sucede com a Fundiestamo (entidade pública que gere os fundos de investimento imobiliário), para lhe conferir maior autonomia de gestão com menos “amarras” ao poder político e regras públicas padronizadas, dadas as particularidades da sua operação.
Em 2024, o FEFSS demonstrou que pode alcançar resultados positivos mesmo com restrições consideráveis. No entanto, é fundamental repensar a sua política de investimento. Basta lembrar que o desempenho histórico da “almofada” das pensões está longe de ser brilhante. A dez anos, a rendibilidade anualizada do FEFSS é de apenas 2,7%, e a 25 anos é de 3,9% que se traduz numa rendibilidade real (descontada pela inflação) de apenas 1,7%.
É crucial questionar se todas as limitações impostas à gestão do fundo que visa responder a uma situação deficitária do sistema previdencial da Segurança Social (que, segundo as previsões do Governo, só deverá ocorrer depois de 2040 se nada for feito) são apropriadas para um fundo com um horizonte de investimento tão longo. Uma revisão abrangente da política de investimento do FEFSS, alinhando-a mais com as melhores práticas internacionais, melhoraria significativamente o desempenho do FEFSS.
Tal como Cristiano Ronaldo, que mesmo com as pernas atadas conseguiria surpreender-nos com a sua habilidade e determinação, o FEFSS tem demonstrado uma resiliência notável nos últimos anos face às suas limitações. No entanto, chegou a hora de desatar os nós e permitir que este fundo vital para o Estado social e para o futuro dos portugueses, jogue em pleno no “campo”, sem restrições desnecessárias.
Imagine só o que o FEFSS poderia alcançar se lhe fosse permitido utilizar todo o seu potencial, mais livre das “amarras” regulatórias que o impedem de correr mais rápido. Talvez então, à semelhança do craque madeirense, que continua a bater recordes aos 39 anos, o fundo pudesse não só marcar golos, mas também levantar a taça da sustentabilidade financeira para as gerações futuras.
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