Estratégia: não pôr os ovos todos no mesmo cesto
Nos últimos 25 anos, o PS esteve 18 no poder, mas todo esse tempo não foi suficiente para implementar reformas. Que razões temos para acreditar que será diferente no futuro?
Numa “silly season” atípica, entre planos, estratégias e “wishful thinking” a única certeza é que os números da nossa economia continuam a não ser animadores e a ação governativa pouco clara quanto aos planos de curto e médio prazo.
No início deste mês, com uma revisão recente de duas décimas, o INE divulgou as estatísticas do PIB que apontam para uma variação homóloga de – 16,3%, em termos reais. Este é um número histórico na democracia portuguesa e que se deve sobretudo ao período de confinamento que teve efeitos económicos muito significativos, tanto do lado da oferta – com a redução da produção e vendas, devido à disrupção das cadeias de produção e distribuição – como do lado da procura, com uma quebra abrupta das compras e consumo. Mas é importante primeiro percebermos o peso dos vários componentes no cálculo do PIB que justificam uma contração tão pronunciada e preocupante.
A quebra da procura interna pesou substancialmente para a estimativa do PIB e reflete a expressiva contração do consumo privado e do investimento. À exceção dos bens de primeira necessidade, os portugueses consumiram manifestamente menos, e num cenário de grande incerteza, como aquele que a pandemia nos trouxe, o investimento contraiu. Também a paragem quase total do turismo foi determinante na procura externa. Segundo o INE, no segundo trimestre, a procura externa líquida registou um contributo de -4,4 p.p. para a variação homóloga do PIB (-1,1 p.p. no primeiro trimestre), “verificando-se uma diminuição em volume mais intensa das Exportações de Bens e Serviços (-39,6%) que das Importações de Bens e Serviços (-29,7%)”.
Ora, estes números mostram a importância do comércio internacional e o peso das exportações na nossa economia. Dependemos uns dos outros. Mas estes números também servem de alerta, porque revelam a grande dependência da economia portuguesa num só setor: o Turismo. Este setor vive de um conjunto de serviços transversal que vai dos transportes à hotelaria e restauração.
Em Portugal, de acordo com um inquérito mensal promovido pela AHRESP, 43% das empresas de restauração e bebidas pondera avançar para insolvência. São números alarmantes que levarão inevitavelmente a um aumento do desemprego. Vários especialistas, académicos e políticos tiveram já oportunidade de refletir sobre os erros do passado, as opções de modelo económico do país e as oportunidades do futuro. O Turismo é fundamental na economia portuguesa e deve continuar a ser explorado, melhorado e estimulado. Contudo, a lição é clara e muito simples: qualquer bom investidor, diversifica os seus portfolios para garantir que o risco não se concentra apenas num único investimento. O caminho trilhado pelo setor do Turismo na última década e que lhe permite hoje ter tanta relevância económica para o país deve ser seguido por outros setores.
Porém, a diversificação do investimento não deve ser entendida no sentido estrito de criar mais e mais clusters industriais. Os governos socialistas caiem, não raras vezes, no erro de procurar atrair investimentos em setores nos quais não ainda temos know-how, ou com estratégias desajustadas – veja-se o tão falado hidrogénio, sobre o qual escrevi aqui no ECO na semana passada. Portugal precisa de investir em inovação, mas no que toca a governos, mais do que inovadores, precisamos de “continuadores”. A sabedoria popular diz-nos que o segredo é a alma do negócio, mas no que toca à especialização de uma economia não há segredos, é uma combinação de conhecimento, com persistência e inovação.
Há alguns dias, foi divulgado que Portugal é o maior produtor europeu de bicicletas. Este destaque é possível porque o país, e em particular o distrito de Aveiro, aproveitando diversas sinergias da região, adquiriu capital em know-how, permitindo assim constante inovação. É sabido que as alterações climáticas, a necessidade de reduzir as emissões de carbono, a crescente tendência para o desporto, a expansão das cidades constituem um nicho de mercado para as bicicletas convencionais e para o setor premium das elétricas que deve ser fomentado. A capacidade instalada e a especialização são fatores fundamentais no acesso a financiamento ou atração de investimento.
No entanto, e a título de exemplo, se por um lado devemos continuar a apostar naquilo em que já temos vantagem competitiva, para podermos manter essa posição, por outro, devemos também considerar investir em algo novo em que nos possamos diferenciar: o mar.
Além da riqueza associada à biodiversidade, há uma variedade de atividades por explorar de uma forma sustentável. Desde as atividades tradicionais, como a pesca, à investigação científica, passando pela biotecnologia marinha (biocombustíveis, farmacêuticos entre outros) ou energias renováveis hoje mais maduras do ponto de tecnológico (eólica, ondas e marés).
Houve vários avisos sobre os riscos de uma economia muito assente no turismo, em detrimento da diversificação da sua diversificação. Estávamos demasiado expostos a qualquer contração da economia mundial. No entanto, a inércia em agir, com condições particularmente favoráveis nos últimos 5 anos, trouxe-nos onde estamos hoje. Aliás, a Visão Estratégica para a recuperação económica, em discussão pública até ao próximo dia 21, se por um lado nos traz um vasto conjunto de “lugares comuns”, isso também só acontece porque muitos deles nunca saíram do papel ao longo de anos –- como os já referidos investimentos na economia do mar, ou economia azul.
Nos últimos 25 anos, o PS esteve 18 no poder. Mas todo esse tempo não foi para o PS tempo suficiente para implementar reformas e promover o desenvolvimento do país para que nos aproximemos dos níveis de vida na restante União Europeia. Que razões temos para acreditar que será diferente no futuro?
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