
Governo AD 2.0
Será curto para o novo Governo limitar-se a ser uma continuação do anterior.
Luís Montenegro foi indigitado esta quinta-feira como primeiro-ministro, depois do Presidente da República ter recebido do PS e Chega a garantia de que o Governo será viabilizado, desde logo ao frustrar a moção de rejeição ao programa do novo Executivo já prometida pelo PCP.
A garantia não tem sequer o prazo de validade de um eletrodoméstico. Dura pouco mais de um ano, até ao sucessor de Marcelo Rebelo de Sousa poder dissolver o Parlamento e convocar eleições, o que não significa que o Governo venha a cair nessa altura.
A estabilidade saiu reforçada, não tanto pelo crescimento do número de votos e deputados da coligação mas pelo péssimo resultado do PS, que o relegou para terceira força política no Parlamento (e o deixou com uma magra vantagem de 4.313 votos sobre o Chega). O próximo líder socialista, José Luís Carneiro, até já dá como certa a viabilização do próximo Orçamento do Estado. Vêm aí eleições autárquicas e o ruído político só desajudaria o PS.
Luís Montenegro afirmou após ser indigitado que dialogará com todos, mas preferencialmente com os socialistas. “Sei quais são os que à partida denotam maior maturidade e responsabilidade política”, disse.
Na verdade não é uma opção. Consumado o seu papel de líder da oposição, André Ventura já veio dizer que o que vai fazer é opor-se, não sentar-se a negociar com Luís Montenegro.
O que significa que todos os caminhos irão dar ao PS, que um dia será confrontado com a decisão de continuar a dar a mão ao Governo, e nessa indistinção perder ainda mais eleitorado, ou romper e afirmar-se como alternativa.
A principal ameaça à coligação é mesmo o Chega. Para a conter, o novo Governo terá de ser bem mais eficaz.
Luís Montenegro esteve bem ao afirmar que a revisão constitucional não é uma prioridade do Governo, desde logo porque não é uma prioridade para os portugueses. Fazer essa discussão agora seria uma distração que só interessa ao partido de André Ventura.
O que também parece evidente, é que será curto para o novo Governo limitar-se a ser uma continuação do anterior.
É preciso ser mais audaz nas medidas que permitam resolver problemas de fundo em temas como a saúde e a educação. Em vez de pacotes de 50 medidas, mais vale focar numa dezena que podem ter um impacto transformador. Será fácil e rápido de implementar, avaliar e ajustar. A diferença faz-se pela qualidade das medidas, não pela quantidade.
“Vamos dar primazia ao crescimento da economia e à criação de riqueza”, disse o primeiro-ministro. Para isso é preciso desbloquear constrangimentos que há décadas impedem um maior aumento da produtividade do país na fiscalidade (cara e complexa), na burocracia, na justiça, na falta de incentivos à mobilização de capital para investimento na economia.
Há que dar escala às empresas e incentivar a inovação. Um estudo publicado este mês pelo McKinsey Institute conclui que o aumento da produtividade depende muito mais de um punhado de empresas terem ações estratégicas ousadas do que de milhares aumentarem a sua eficiência. Na Alemanha, Reino Unido e EUA, cerca de 100 empresas num universo de 8.300 foram responsáveis por dois terços do crescimento da produtividade.
É preciso ser mais audaz na reforma do Estado. Há ganhos de eficiência e produtividade que vão muito além da reorganização de secretarias-gerais. Quem trabalha ou tem empresas ainda sente que o seu esforço serve sobretudo para alimentar o Estado, em vez de ser o Estado que está ao seu serviço.
É obrigatório romper em definitivo com uma cultura que demasiadas vezes coloca o interesse particular de quem está no poder à frente dos interesses do país, por exemplo semeando cargos por correligionários políticos ou caindo em situações de conflito entre a esfera privada e pública.
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