O Facebook nunca foi “cool”
O Facebook um predador sem piedade. Volúpia pelo lucro já a conhecíamos, a volúpia pelo poder e pela manipulação para o alcançar foi a fava que saiu desta vez.
A crise do Facebook e a sua perda de inocência só vieram revelar a face negra da rede social mais famosa do planeta. Mark Zuckerberg perdeu num ápice a maquilhagem e o valor da empresa em bolsa. Já não é o rapazola de Harvard que queria formar uma comunidade de malta universitária, como o filme “The Social Network”, de David Fincher quis apresentar. Hoje, já todo o mundo sabe que aqui também os ídolos têm pés de barro. O que parece, não é.
A marca azul e branca facturou 40 mil milhões em publicidade, mexe nos algoritmos como lhe apetece e consoante as conveniências, semeia e amplia conteúdos que vão beliscando a notícia, valor supremo da Comunicação Social, a quem também vai secando e asfixiando ao abocanhar a maior fatia de investimento publicitário que, anteriormente, estava na imprensa e televisão. O Facebook e o Google estão a matar os media tradicionais a quem irão exigir mais receitas para os ir exaurindo.
Com isso, com o esmagamento da imprensa, acentuar-se-á a tendência já existente das pessoas lerem apenas o que aparece onde andam. E elas andam no Facebook. Será uma enorme dificuldade vislumbrar como será o consumo de conteúdos nos próximos tempos. Pois as audiências afastam-se de jornais e televisões diariamente e cada vez haverá uma maior incerteza sobre as âncoras em que nos baseamos para ter informação fiável e credível, como escrevi há semanas antes desta crise.
Ora, esta crise com a Cambridge Analytica, que comprou 50 milhões de perfis para fins eleitorais, veio provar que esta rede, pretensamente amigável e simpática, é um predador sem piedade. Volúpia pelo lucro já a conhecíamos, a volúpia pelo poder e pela manipulação para o alcançar foi a fava que saiu desta vez. No meio deste carrossel de distracções permanentes e no caleidoscópio de novas sensações constantes que parece que marcam os nossos dias, há um enorme subtexto que perpassa pelas comunidades que nem o percebem nem têm armas para se defender dele: cada vez mais perdemos o controlo dos nossos dados.
Zuckerberg, que demorou cinco dias a reagir, o que leva a crer que não sabe nada de gestão de crise nos tempos dos quais ele próprio é um dos fundadores, timidamente disse que todos tínhamos concordado com a cedência dos nossos dados. Acontece que isso não é bem assim e muito menos os utilizadores tinham a noção que poderiam estar a ser as “Guinea Pigs” nas mãos de empresas especializadas em campanhas para segmentos devidamente identificados e que os seus dados estavam a servir para condicionar eleições, campanhas negras, opiniões sobre pessoas tudo através da democracia, ou opressão, como preferirem, do “like”.
Claro que a melhor base de defesa contra manipulações continua a ser consumir imprensa, ler livros, estar informado pelos reais canais de informação, que são os tradicionais e que nunca morrerão. A Economist – um canal aconselhável de boa informação – recordava há pouco tempo uma declaração de Mark Zuckerberg: «o meu objectivo nunca foi realmente tornar o Facebook “cool”. Eu não sou uma pessoa “cool”». Já percebemos isso, tal como já sabemos que não há Pai Natal.
O autor escreve segundo a antiga ortografia
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