Rumo a um programa de recapitalização das empresas portuguesas

  • André Miranda
  • 29 Junho 2020

As circunstâncias excecionais que vivemos exigem respostas rápidas e efetivas e o nosso Governo não pode deixar de perder vista que este quadro temporário vigorará apenas até 31 de dezembro de 2020.

A Comissão Europeia tem vindo a admitir um conjunto de medidas destinadas a aliviar os efeitos nefastos da crise económica decorrente da pandemia da Covid-19.

A abordagem inicial da Comissão Europeia, plasmada numa Comunicação designada «Quadro temporário relativo a medidas de auxílio estatal em apoio da economia no atual contexto do surto de Covid-19”, virou-se essencialmente para o reforço da liquidez das empresas, visando assegurar que estas pudessem salvaguardar os seus compromissos financeiros e, mais concretamente, garantir a manutenção dos postos de trabalho.

Atendendo ao impacto estrutural que a crise irá colocar na solvência do tecido empresarial, a Comissão Europeia veio, posteriormente, ampliar a margem de ação dos Estados-Membros, com novas medidas, sendo um dos mecanismos mais relevantes a recapitalização das empresas pelo Estado, em termos que nunca foram tão vastos como agora, mais ainda assim sujeitos às seguintes condições gerais:

  1. A concessão de apoio público nacional só deve ser considerada se não puder ser encontrada outra solução adequada;
  2. Devem ser definidas condições claras no que respeita à entrada, à remuneração e à saída do Estado das empresas, bem como a regras em matéria de governação e a medidas adequadas para limitar distorções da concorrência;
  3. As recapitalizações não devem exceder o mínimo necessário para assegurar a viabilidade das empresas delas beneficiárias e não devem ir além da reposição da estrutura de capital anterior ao surto da pandemia de COVID-19;
  4. Deve ser dada preferência aos instrumentos de dívida subordinada.

Já em relação ao apoio a empresas consideradas estratégicas, a Comissão Europeia recorda que o Tratado não impede que o Estado adquira participações no capital de empresas. E se essa aquisição for feita a preços de mercado ou se o Estado intervir em condições pari passu com os sócios ou acionistas privados, então poderá nem existir qualquer auxílio estatal.

Por fim, é de assinalar que a Comissão Europeia não faz depender a aprovação das medidas de recapitalização de quaisquer planos de reestruturação ou de quaisquer condições análogas, o que é uma evolução face ao regime que foi aplicado ao sistema financeiro depois da crise de 2008.

Portugal tem todo o interesse em adotar um regime transparente que permita o acesso das nossas empresas à recapitalização. Este objetivo poderá ser assegurado através de um regime jurídico geral que defina quem, como e em que condições pode candidatar-se, sem prejuízo das obrigações posteriores de prévia aprovação pela Comissão Europeia.

As circunstâncias excecionais que vivemos exigem respostas rápidas e efetivas e o nosso Governo não pode deixar de perder de vista que este quadro temporário vigorará apenas até 31 de dezembro de 2020, sendo que as medidas de recapitalização devem ser concedidas até 30 de junho de 2021. Logo que se perceba qual o envelope financeiro disponível, o programa deve ser empreendido com a celeridade necessária.

As regras relativas a medidas de auxílio estatal nunca foram tão aliviadas como agora. Mas a magnitude da crise e o universo de beneficiários também nunca foi tão expressivo, pelo que o sucesso deste programa de recapitalização exigirá também um reforço da nossa capacidade institucional e técnica, tanto no início, com a seleção e avaliação das empresas, durante, com o acompanhamento atento da atividade, ou no fim, na defesa dos interesses do Estado no processo de saída.

  • André Miranda
  • Sócio da Pinto Ribeiro Advogados

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