Se o ECO tivesse direito de voto, votaria contra Trump
Se Donald Trump ganhar a Kamala Harris (ser mulher e negra não basta), e as probabilidades são elevadas, preparem-se. O mundo, para os europeus, vai mesmo mudar.
Se o ECO tivesse direito de voto nas eleições dos EUA, votaria contra Donald Trump, portanto, à falta de melhor, em Kamala Harris. A afirmação não é original, pode ser lida aqui, noutros termos, no The Economist, “If The Economist had a vote, we would cast it for Ms Harris“. E não é necessário procurar razões nas políticas económicas de Trump para a União Europeia e para o mundo, e muitas haveria, ou nos méritos da candidata democrata, que são poucos, mas num princípio básico de que não é possível apoiar um candidato a autocrata, que promoveu um ataque ao Capitólio, coração da democracia, quando perdeu as presidenciais de há quatro anos, e que é cúmplice de ditadores como Putin.
Obviamente, as eleições americanas vistas a partir de uma capital europeia têm um significado particular, diferente daquele que tem um americano. E muito diferente até daquele que existia quando Trump foi derrotado por Joe Biden, há quatro anos. Hoje há uma guerra na Europa, e Vladimir Putin conta com uma mudança de poder nos EUA para aproveitar a incapacidade da União Europeia de financiar os ucranianos, porque a defesa, durante anos, foi uma área ‘subcontratada’ aos americanos através da Nato.
Muitos dos leitores do ECO talvez arriscassem no voto em Donald Trump se votassem nas eleições americanas, por duas ordens de razões: O programa económico de Trump é, aparentemente, mais favorável aos negócios e aos contribuintes com rendimentos mais elevados e as instituições americanas serão suficientemente fortes para conter um Presidente que tente capturar interesses e promover redes de influência e a tomada de poder. Talvez seja melhor pensarem duas vezes.
Trump aposta no regresso acelerado do protecionismo, com tarifas elevadas para as importações chinesas, mas também para as importações europeias, a um nível muito superior aos das ajudas de Estado promovidas por Biden. É meio caminho para o regresso da inflação, e para uma gestão política da Reserva Federal americana. A somar-se a isso, os cortes de impostos anunciados vão trazer um agravamento do défice e custos mais elevados de financiamento para o país, para as empresas e para os consumidores. Promete desregulação — uma estratégia que poderá ter um impacto positivo no curto prazo –, a prioridade ao petróleo num mundo a precisar de energias renováveis e descarbonização e deportações em massa num mercado de trabalho que precisa de imigrantes. Tem tudo para correr mal numa economia que está a crescer ligeiramente abaixo dos 3%, mas com as famílias massacradas pela inflação e perda de poder de compra.
Trump já demonstrou várias vezes a sua empatia por líderes como Putin ou até o ditador da Coreia do Norte, Kim Jong-un. Tem uma visão mercantilista dos Estados, da política e das políticas públicas, tem a ambição de afirmar o poder dos EUA pela força, não pela cooperação, tem o objetivo de travar a China — Kamala Harris também –, e desdenha princípios básicos das democracias liberais. É tudo uma questão de preço, em dólares. E que o diga Jeff Bezos, o dono do Washington Post que, ironicamente, tem o slogan ‘Democracy Dies in Darkness’. Bezos travou o previsível ‘endorsement’ do jornal que revelou o Watergate a Kamala Harris. O Post assumia uma posição em eleições há mais de quatro décadas, agora, os negócios de Bezos ditaram outra posição, supostamente neutral para defender a credibilidade dos jornais. Foi apenas por dinheiro (e para não perder na luta com Elon Musk), mas quando o homem mais rico do mundo cede, percebe-se o que está em causa.
Se os americanos têm muito em jogo, os europeus têm ainda mais, e não votam. A responsabilidade é da Europa, que não percebeu os novos tempos quando Obama virou a prioridade política dos EUA para o pacífico, quando não viu o que estava a passar-se nos EUA quando Trump ganhou as presidenciais de há oito anos e quando foi complacente com as primeiras invasões de Putin. Agora, está a correr contra o tempo e o tempo será muito curto se Trump ganhar.
O que diz Trump da Europa? “A União Europeia soa tão bem, certo? Aqueles países pequenos todos juntos. Eles não levam os nossos carros. Não levam os nossos produtos agrícolas. Eles vendem milhões e milhões de carros nos EUA. Não. Eles vão ter de pagar um preço alto”, escreve aqui o jornalista Rui Barroso, no ECO.
Se Trump ganhar a Kamala Harris (ser mulher e de ascendência negra não basta), e as probabilidades são elevadas, preparem-se. O mundo, para os europeus, vai mesmo mudar.
Nota do Diretor
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