Tempo de agir para uma Europa mais justa

  • Francisca Van Dunem
  • 5 Agosto 2021

Agir, significou desbloquear decisões politicamente melindrosas, cuja aprovação requeria a unanimidade, como a proposta de alteração do Regulamento fundador da Agência dos Direitos Fundamentais.

Na área da justiça a Presidência Portuguesa procurou conjugar o seu lema “tempo de agir”, com todas as suas possíveis declinações.

Agir significou, para Portugal, enfrentar e concluir dossiers complexos. E nessa perspetiva, a conclusão do denominado dossier “cessão de créditos”, pendente há três anos, foi elucidativa. A proposta de Regulamento relativa à oponibilidade a terceiros das cessões de créditos revelava-se complexa, no plano técnico, por envolver questões jurídicas e financeiras de articulação delicada, agravadas pela dificuldade de conciliar interesses de Estados com diferenças assinaláveis nos seus sistemas jurídicos. Conseguimos ultrapassar os obstáculos.

Agir, significou desbloquear decisões politicamente melindrosas, cuja aprovação requeria a unanimidade, como a proposta de alteração do Regulamento fundador da Agência dos Direitos Fundamentais, para passar a incluir no seu âmbito de ação a cooperação judiciária e policial, dimensões que até aqui lhe eram alheias. E a Agência Europeia dos Direitos Fundamentais, na pessoa do seu Diretor, agradeceu a Portugal o trabalho desenvolvido no âmbito desse dossier, que permitiu a sua aprovação pelo Conselho.

Agir teve ainda o sentido da realização em prazo razoável, evidenciado pela rapidez da negociação, do Regulamento E-Codex , sistema de intercâmbio transfronteiriço de processos civis e penais, iniciada e concluída no espaço de três meses.

Agir significou também avançar em alguns pontos fundamentais, de que são exemplo as negociações com o Parlamento Europeu sobre o Pacote legislativo em matéria de provas eletrónicas, também pendente há três anos.

Importante foi ainda a conclusão de negociações com o Parlamento Europeu sobre um regulamento para acesso e bloqueio de conteúdos online para combate aos crimes de abuso sexual de crianças na internet.

Mas não há justiça cuja declinação não tenha ao centro os direitos fundamentais. Por isso a Presidência Portuguesa deu ênfase particular à nova Estratégia da Comissão Europeia para o reforço da aplicação da Carta dos Direitos Fundamentais na União Europeia, tornando efetivo o conteúdo desse instrumento na vida dos cidadãos. Também aqui agimos, coorganizando com a Comissão Europeia uma sessão orientada para magistrados no Centro de Estudos Judiciários e participámos numa conferência, em Lisboa, sobre a proteção contra a discriminação racial e a intolerância relacionada.

Trazer para a formação em Justiça as discussões sobre o Estado de Direito nas componentes que relevam especificamente da cooperação judiciária – no caso, independência dos sistemas de justiça nacionais –, constituiu também uma forma de ação diferenciada, favorecendo a aproximação, pelo conhecimento, pelo diálogo, pela compreensão.

Deixámos a mensagem sobre a necessidade de proteção do Estado de Direito na Europa, numa conferência internacional realizada em Coimbra, e numa outra organizada pelo CEJ, em Lisboa.

Foi também sob o lema da ação que a Presidência Portuguesa introduziu na agenda política e alcançou conclusões a matéria da proteção dos adultos vulneráveis, tema cuja centralidade encontra justificação no crescente envelhecimento populacional da União, em que alguns Estados-membros revelam prevalências significativas de doenças incapacitantes.

E porque agir é também prevenir, a Presidência portuguesa introduziu na agenda política um outro tema que, pela relevância que assume já no presente, e pelas perspetivas de agravamento futuro, merecia atenção das autoridades europeias responsáveis pela articulação do combate ao crime: a luta contra a contrafação nas suas conexões com o crime organizado, em particular a contrafação de medicamentos, materiais de proteção, componentes de material médico, peças de automóveis e/ou aeronaves. O EMPACT e o SOCTA refletem essas preocupações.

A ação útil pressupõe um movimento contínuo e simultâneo de todas as variantes que confluem para o progresso ou para um dado resultado. Por isso, o enfrentamento dos conteúdos ilegais online (do incitamento ao ódio ou ao terrorismo, e à violência contra pessoas ou grupos, aos abusos sexuais e a pornografia infantil) mantiveram-se sempre no centro da agenda.

O mesmo aconteceu com a transição digital na justiça. A digitalização dos sistemas de justiça, as questões associadas à falta de literacia digital e a proibição de exclusão de acesso à justiça; as novas realidades em matéria de transição digital, em particular as formas de integração das vantagens da inteligência artificial, sem risco de desumanização da justiça, foram temas intensamente debatidos numa conferência de alto nível que, ao longo de dois dias, misturou reflexão com mostra, com análise de riscos e formas de os esconjurar.

A ação esteve também presente numa visão clara da posição da UE, na sua relação com o mundo, na dimensão da cooperação judiciária e policial. O lançamento de um processo de diálogo político na área da Justiça e Assuntos Internos com alguns países do Norte de África, particularmente os países da faixa mediterrânica fez parte dessa visão.

Foi a ação tempestiva que viabilizou a integração da América Latina e, em particular do Brasil, entre as prioridades de cooperação da Eurojust; que permitiu realizar em Lisboa, sob o patrocínio da PPUE, o II Encontro das Instituições de Justiça da UE e da América Latina, organizado pelo El Pacto, no qual foi produzida a Declaração de Lisboa, ou o seminário “Cooperação Judiciária na Era Digital: o Tratado de Medellín como Ferramenta para Agilizar as Relações entre Estados”, organizado pela COMJIB .

Foi também na perspetiva da ação prática consistente que decorreu em Lisboa a reunião ministerial UE-EUA em que foram relançadas as bases de aproximação em matéria de cooperação judiciária e policial em temas como o extremismo violento e o discurso de ódio, a obtenção de prova em ambiente digital; a inteligência artificial e a responsabilidade das plataformas online ou o ramsomware e a criminalidade associada ao contexto de pandemia.

Foram seis meses profundamente exigentes, que implicaram também um trabalho intenso de planeamento e preparação, mas que valeram a pena, pela reafirmação da posição de Portugal no espaço da União e pelos resultados alcançados.

Continuamos a cooperar com a Eslovénia, no quadro do trio de presidências. A 16 de julho participámos na reunião informal de Ministros da Justiça, em Brdo Pri Kanju, arredores de Liubliana, e a 20 de julho marcámos presença na sessão de abertura da conferência sobre a Regulação da Inteligência Artificial – aspetos éticos e de direitos fundamentais, realizada em formato híbrido.

  • Francisca Van Dunem
  • Ministra da Justiça

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