Um dilema Nowo

A Vodafone avançou para a compra da Nowo, eliminando um concorrente no futuro mercado do 5G. O negócio cria um dilema novo no setor telecomunicações, que terá de ser resolvido pelos reguladores.

A Vodafone quer comprar a Nowo, mas a alma do negócio não está na rede fixa, nem sequer na base de clientes. A lógica da operação está na concorrência e no futuro mercado do 5G. E é por isso que vai dar trabalho aos reguladores nos próximos meses.

O leilão do 5G, que terminou há quase um ano, abriu as portas do setor a duas novas empresas com rede própria: a Nowo, que já vende serviços 4G com rede de outra operadora, e a Digi, que não tinha presença em Portugal. A Vodafone entende que o mercado português dificilmente tem dimensão para acomodar quatro operadoras (Meo, Nos, Vodafone e Nowo), quanto mais cinco (Digi).

Vista por esse prisma, a fusão Vodafone+Nowo seria quase um favor que Mário Vaz faria ao setor. Mas a ideia não é consensual, sobretudo para a Anacom e a Autoridade da Concorrência, que acreditam que há margem para aumentar a concorrência. Também não é líquido que Meo e Nos tenham celebrado quando souberam desta intenção.

As restantes operadoras vão ter uma palavra a dar em todo este processo, quando o dossiê chegar à sede da Autoridade da Concorrência (ainda não chegou). E, assim como a Anacom, poderão ter dúvidas sobre alguns aspetos relacionados com as licenças 5G, noticiou o ECO esta sexta-feira.

O primeiro diz respeito à quantidade de espetro que a Vodafone passaria a controlar, direta e indiretamente. Vodafone e Nowo concorreram com estratégias independentes no leilão do 5G, que impunha um limite à compra de lotes. Depois da fusão, esse limite é teoricamente ultrapassado na faixa dos 3,6 GHz, uma das mais relevantes para o 5G.

O segundo aspeto diz respeito ao facto de a Nowo ter concorrido ao leilão com o estatuto de “novo entrante”. Como tal, pôde adquirir dois lotes numa faixa que não estava disponível às três maiores operadoras (1.800 MHz), e que agora, em teoria, passa para a chancela da Vodafone. Como irão reagir os concorrentes?

O terceiro aspeto tem a ver com um artigo do regulamento, que determina que os direitos (licenças) “só podem ser transmitidos ou locados pelos respetivos titulares […] decorridos dois anos da data de início da oferta de serviços de comunicações eletrónicas acessíveis ao público”. Aqui, importa ter em conta um detalhe: a Vodafone não vai comprar diretamente a Nowo, mas sim a Cabonitel S.A., a empresa que detém a Nowo. Vai ser importante conhecer a estrutura da operação para perceber se há ou não alteração à titularidade dos direitos.

Tudo isto será escrutinado pela Autoridade da Concorrência, ela própria numa fase de transição – o mandato da atual presidente, Margarida Matos Rosa, termina em novembro. O regulador não quis comentar o negócio, mas é fácil de imaginar um cenário em que a Vodafone fica sujeita a “remédios” para poder levar a operação a bom porto.

Já a resposta da Anacom ao ECO deixa claro que as licenças vão estar debaixo de olho: “Na análise da operação e na definição do seu posicionamento em relação à mesma, a Anacom não deixará de ter em consideração a estrutura do mercado e a dinâmica concorrencial existente, incluindo a quantidade de espetro detida pelos envolvidos.”

A Vodafone espera concluir a operação no primeiro semestre de 2023. Depois de toda a controvérsia em torno do leilão do 5G, o setor enfrenta agora um dilema novo.

PS: A Vodafone completou 30 anos esta semana. Aproveito a ocasião para congratular todos os responsáveis e colaboradores da empresa ao longo destas décadas.

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