Um novo paradigma de regulação: a autoridade consensualizada no contexto ESG

  • Joana Coelho
  • 28 Novembro 2023

É inegável que se está a trilhar um novo modelo regulatório: o da autoridade consensualizada, que promove o envolvimento dos agentes económicos como motor para o cumprimento das normas.

A atuação regulatória está tradicionalmente associada ao exercício de poderes de autoridade pelas entidades reguladoras, especialmente no campo da supervisão inspetiva e da punição de infrações.

Contudo, a regulação está necessariamente inserida numa determinada conjuntura económica e social e deve adaptar-se para responder adequadamente aos permanentes desafios dos setores regulados. Neste contexto, discutem-se novos planos de interação com os agentes económicos, em que o regulador calibra a oportunidade e a intensidade da sua atuação em face do comportamento e da resposta das empresas.

À boleia da regulação responsiva, que pugna por uma intervenção regulatória predominantemente persuasiva, tem-se defendido um papel mais efetivo dos agentes setoriais: é-lhes conferida uma participação mais ativa, mas também se lhes exige a consequente responsabilização.

Numa aplicação prática da teoria dos jogos e da racionalidade cooperativa, a partilha entre reguladores e regulados da definição e implementação da política regulatória, ao apostar na auto conformação e na auscultação e envolvimento ativo dos regulados, tende a favorecer o cumprimento das regras setoriais.

Também no campo específico do sancionamento de infrações, campo tradicional do imperium regulatório, se encontrou espaço para configurar soluções que remetem para a cooperação do regulado na aplicação e na execução da sanção.

Com efeito, os regimes sancionatórios setoriais – e há que destacar nesta sede o regime jurídico da concorrência e o regime sancionatório do setor energético – vêm consagrando modelos de ação concertada, admitindo soluções consensualizadas como alternativa à decisão unilateral. Em especial quanto à colaboração dos agentes económicos na eliminação de práticas ilícitas e na reparação dos danos, mas também na (re)orientação da empresa para a implementação de medidas corporativas que garantam a aplicação das normas do setor.

Em suma, é inegável que se está a trilhar um novo modelo regulatório: o da autoridade consensualizada, que promove o envolvimento dos agentes económicos como motor para o cumprimento das normas.

Esse novo paradigma vem sendo necessariamente influenciado pelo tema, discutido a várias velocidades e com diferentes sensibilidades, do ESG (Environmental, Social and Corporate Governance). Mas a inspiração é recíproca, na medida em que a nova dinâmica regulatória também impacta decisivamente na adoção pelas empresas de boas práticas e sistemas eficazes de controlo interno, indispensáveis para que as empresas não sucumbam às próprias falhas e não percam a batalha da competitividade.

Vejamos o círculo virtuoso: a eficácia da ação regulatória prende-se com o objetivo de obter dos agentes económicos o cumprimento mais permanente possível dos deveres fixados. Assim, o regulador orienta a sua ação – e calibra os mecanismos ao seu dispor -para que as empresas que atuam nos setores por si regulados adotem condutas corporativas sustentáveis e eficientes, que as capacitem para enfrentar os riscos ambientais, sociais e corporativos inerentes à sua atividade.

Para que tal eficácia seja alcançada, é, contudo, necessária a adesão simbiótica por parte dos agentes económicos, quer na adoção proactiva de mecanismos preventivos de controlo interno, quer na correção de falhas identificadas. As empresas com estratégias efetivas de ESG serão, então, não só as melhores preparadas para enfrentar a competitividade do setor, mas também as que alcançam melhores níveis de cumprimento normativo e, consequentemente, melhor reputação setorial.

Em jeito de conclusão, e porque todas as novas realidades trazem consigo a necessidade de reflexões críticas, há que trazer para o debate a necessidade de criar mecanismos que mitiguem as assimetrias entre agentes económicos e garantam a independência efetiva das entidades reguladoras. O sucesso da renovação depende da promoção da igualdade de oportunidades e da capacitação dos vários intervenientes.

Nota: esta é a coluna da iniciativa cívica Women in ESG Portugal para o ECO, e por meio deste canal pretendemos trazer conteúdos ligados ao ESG de forma descomplicada para a sociedade, na voz de mulheres que detêm expertise técnica na área. Para mais informações, aceda ao site: www.winesgpt.com

  • Joana Coelho
  • ERSE - Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos

Assine o ECO Premium

No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.

De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.

Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.

Comentários ({{ total }})

Um novo paradigma de regulação: a autoridade consensualizada no contexto ESG

Respostas a {{ screenParentAuthor }} ({{ totalReplies }})

{{ noCommentsLabel }}

Ainda ninguém comentou este artigo.

Promova a discussão dando a sua opinião