Vem aí mais dinheiro do BCE. Para quê?
Draghi é um inconformado. Daí que, anos depois de mostrar como se sai de uma crise, queira agora voltar a brilhar perante a inversão do ciclo. Acena com dinheiro, mas quem o quer?
Mario Draghi é um “mãos largas”. Tem-no sido desde que se sentou na cadeira do poder do euro, cortando juros sucessivamente, cedendo dinheiro à banca a taxa zero e, até, gastando milhares de milhões de euros com a compra de dívida pública. Medidas excecionais justificadas com uma promessa feita em pleno verão de 2012.
“Dentro do nosso mandato, o BCE está preparado para fazer o que for preciso para salvar o euro. E, acreditem, será suficiente”. Foi com esta frase, que está ainda na memória de muitos, que o presidente do BCE arrancou para um programa de estímulos como nunca visto na Zona Euro.
Juros? 0%. Dinheiro para a banca? Muitos milhões. Para os países (através da compra de obrigações do Tesouro)? Milhares de milhões de euros. Com esta bazuca de dinheiro, Draghi fez o que os políticos não conseguiram fazer. Deu o impulso necessário para que a economia da região saísse da recessão. Trouxe o crescimento de volta, garantindo a sobrevivência do projeto da moeda única.
Foi uma jogada de mestre. Super Mario — como carinhosamente é apelidado — mostrou como se faz, levando a Zona Euro a passar para o nível seguinte, mas com menos ‘vidas’ do que se poderia pensar. A economia cresce, mas os problemas do passado continuam a fazer sombra. E a potência da região só resiste enquanto as superpotências o fizerem.
Com os EUA e a China a darem sinais preocupantes — a guerra comercial instigada por Donald Trump não ajuda nada –, a Zona Euro volta a mostrar a sua fraqueza. Iludidos pelo dinheiro fácil, os países pouco fizeram para implementarem reformas que ajudem a acelerar em momentos de inversão de ciclo. E esse momento chegou.
A Zona Euro cresce, mas pouco. Vai pouco além de 1%, um ritmo que não augura nada de bom para os anos que aí vêm. Com uma população envelhecida, uma expansão morna e (perspetivas de) dificuldades em abandonar políticas altamente expansionistas, há quem veja na Zona Euro um novo Japão.
Draghi não esconde os números. Mas é um inconformado. Daí que, anos depois de mostrar como se faz, queira agora tentar continuar a ser a “máquina de dinheiro” que alimenta o euro. Quer, mas não vai ser fácil. A bazuca está gasta. Não há muito mais munições para usar… O BCE tem um balanço gigante, que não pode crescer muito mais.
O que resta? A taxa de juro não mexe. Draghi não vai subir depois do verão, como se previa, conseguindo a proeza de abandonar a cadeira do poder sem nunca subir os juros. E tenta acrescentar alguma pólvora para dar chama à economia, mas sem grande inovação. Já fez dois, agora vai para o terceiro pacote de empréstimos de longo prazo para a banca.
Vem aí um TLTRO III, com mais milhares de milhões de euros a custo zero para os bancos da região que, acredita o BCE, serão utilizados para financiar as empresas na expectativa de que estas procurem investi-los para crescerem, levando consigo o PIB. É, pelo menos, esse o sonho…
Mas os TLTRO já não são o que eram. Se a primeira versão foi bastante concorrida, a segunda já não contou com tanto entusiasmo. Poucos bancos participaram nesta operação, sendo a maior “fatia” do dinheiro arrebatada pelas instituições de países com maiores dificuldades, casos de Portugal (apesar de só o Novo Banco), Espanha e Itália.
Agora, neste terceiro pacote, dificilmente haverá uma corrida. Porquê? Dinheiro, os bancos têm. Têm muito, mesmo. E barato. Querem emprestá-lo, mas a grande questão é a quem. Essa é uma realidade em vários países, entre os quais Portugal. Apesar das sucessivas críticas à atuação da banca portuguesa, nomeadamente no que toca à concessão de créditos às empresas, a verdade é que não há muitas empresas a baterem à porta dos bancos. E a conjuntura atual pede cautela perante grandes voos.
As que batem à porta, muitas vezes não o fazem pelos melhores motivos. Estão em situações débeis, não em busca de crescimento, antes de salvação. E aí, os bancos, escaldados com o passado, ainda com um fardo gigante às costas, trancam as portas. Há dinheiro, mas só para bons negócios. Mario Draghi pode acenar com os euros que quiser, mas sem boas empresas a quem emprestar, quem quer dinheiro emprestado, mesmo à “borla”?
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