Oito vezes mais rápida e três vezes mais barata, a construção de casas com recurso a impressoras 3D já chegou a Portugal para "solucionar" a crise da habitação. T2 da Havelar custa 150 mil euros.
O alemão Patrick Eichiner, que está ligado à área do imobiliário, e os portugueses Rodrigo Vilas-Boas (arquiteto do grupo OODA) e José Maria Ferreira (Ecosteel) juntaram-se para mudar o paradigma da construção. O trio de empreendedores, que fundou a Havelar no ano passado, apresentou em Vilar do Pinheiro, no concelho de Vila do Conde, a primeira casa em impressão 3D do país. Em apenas 18 horas, as paredes de betão da casa foram erguidas graças a esta tecnologia que já está a ser usado em todo o mundo.
A construção é oito vezes mais rápida e três vezes mais acessível, quando comparada com os tempos e custos da construção tradicional. Depois da impressa, a casa apresentada demorou cerca de duas semanas a ser montada. Isto é, a serem instaladas as portas e janelas, assim como os módulos pré-fabricados da cozinha e casa de banho. Esta casa custa 150 mil euros, mas os preços podem ir até aos 250 mil euros, dependendo da localização e acabamento final.
“Queremos criar uma solução para a crise de habitação com tecnologia que vai mudar a forma como se constroem as casas no futuro, com altos níveis de automação, sustentabilidade e design“, contou Patrick Eichiner, durante uma visita de imprensa ao local, acrescentando que a “impressão 3D é 70% mais rápida do que a construção tradicional”.
Ainda este ano, a Havelar prevê construir entre 30 a 40 casas com recurso à impressão 3D. A casa tem de ser impressa no local, sendo que a empresa precisa de um dia para o transporte e para a logística. O objetivo desta joint-venture é criar economia de escala através deste modelo de construção. “Queremos fazer parcerias com promotores e proprietários de grandes terrenos para o desenvolvimento de projetos residenciais de maior dimensão, e não apenas uma casa individual”, diz Patrick Eichiner, que também é proprietário da The Cobble Capital.
Queremos fazer parcerias com promotores e proprietários de grandes terrenos para o desenvolvimento de projetos residenciais de maior dimensão, e não apenas uma casa individual.
“Queremos estar no desafio da habitação em Portugal e acreditamos que ele passa pela escala”, nota o arquiteto Rodrigo Vilas-Boas, garantindo que já têm “várias manifestações de interesse em Portugal, especificamente em terrenos na ordem das 50/60 casas”. Por outro lado, assegura que há ainda interesse por parte de entidades públicas, como municípios, que “estão muito interessados na tecnologia, numa altura que Portugal está a sofrer uma crise na construção”.
O protótipo da segunda casa já está a ser construído em Vilar do Pinheiro, em parceria com a Saint-Gobain que forneceu a argamassa para este segundo projeto. A empresa já está a estabelecer outros acordos com arquitetos de renome como Siza Vieira, Aires Mateus e Kengo Kuma. Paralelamente, a Havelar tem parcerias com as faculdades de Engenharia (FEUP) e de Arquitetura da Universidade do Porto e com um Instituto de Arquitetura da Catalunha, o IAAC Advanced Architecture.
Na fase em que as paredes estão a ser impressas são necessárias quatro pessoas – três operadores na máquina (impressora 3D) e um operador a verificar a qualidade da impressão. O arquiteto Rodrigo Vilas-Boas explica que o material usado na impressão é betão e que a casa “foi construída com uma parede interior e uma parede exterior que não se tocam entre si, e o isolamento é recheado com aglomerado de cortiça, um material altamente sustentável e resistente”.
Numa altura que muitas empresas estão a apostar na madeira, como é o caso da Odum, e a descartar o betão, Rodrigo Vilas-Boas acredita que este material pode ser sustentável e realça que “as indústrias do betão estão muito avançadas e interessadas em reduzir a pegada carbónica do material” e que “existe muita investigação”. De acordo com o road map da empresa, o “objetivo é chegar a 2030 com casas de betão carbono zero”.
Do Japão a Portugal, há 75 impressoras de casas em 3D no mundo
Este trio de empreendedores investiu cinco milhões de euros para arrancar com o projeto. Um valor que incluiu a compra da impressora 3D ao grupo Cobod, um dos principais fornecedores mundiais desta tecnologia para a construção. Este equipamento tem capacidade para “imprimir” 50 casas ao ano, mas a empresa portuguesa já prevê adquirir uma segunda impressora à medida que o negócio ganha escala.
Foi na Dinamarca, em 2017, que nasceu a primeira casa de impressão 3D. Atualmente, do Japão à Argentina, passando pela Malásia e pela Guatemala, já há 35 países a construir casas em 3D graças à tecnologia do grupo Cobod, liderado pelo dinamarquês Henrik Lund-Nielsen.
Temos clientes que já construíram edifícios de três andares e até clientes que querem chegar aos seis andares. Pode ainda ser usada para construir tanques, torres eólicas e pontes.
O líder da Cobod destaca que este “tipo de construção ainda não é comum, mas começa a ser cada vez mais”, tendo já 75 impressoras a funcionar em todo o mundo. Henrix Lund-Nielsen realça que a construção de um piso “é apenas o princípio” e que a “impressora é capaz de construir qualquer coisa”.
“Temos clientes que já construíram edifícios de três andares e até clientes que querem chegar aos seis andares. Pode ainda ser usada para construir tanques, torres eólicas e pontes. Estamos apenas focados na habitação, neste momento, mas isso é apenas parte daquilo que a impressora consegue fazer”, disse o empresário, que marcou presença na apresentação do projeto no Norte de Portugal.
Lama, argila e palha podem ser o futuro da construção
O arquiteto e construtor Pedro Monteiro, que trabalhou vários anos no Chile, França e Suíça, na ótica da construção sustentável, integra o departamento de investigação da Havelar. O jovem arquiteto já está a estudar a utilização de materiais locais, como terra, lama, argila, palha, saibro, casca de arroz, entre outros, em alternativa ao betão, para a construção de casas em 3D. “Todos estes materiais são viáveis e basta olhar lá para fora para percebermos que já temos um atraso de dez anos relativamente ao desenvolvimento de construção sustentável“, afirma Pedro Monteiro.
Todos estes materiais (terra, lama, argila, palha, saibro, casca de arroz) são viáveis e basta olhar lá para fora para percebermos que já temos um atraso de dez anos relativamente ao desenvolvimento de construção sustentável.
A construção civil foi responsável por mais de 34% da utilização de energia e cerca de 37% das emissões de CO2 em 2021, de acordo com um relatório da ONU, apresentado na COP27. Segundo o documento, é possível alcançar até 2030 uma redução das emissões de CO2 de 50% ao longo de toda a cadeia de valor em relação a 1990. Face a estes números, o arquiteto Pedro Monteiro realça que é “urgente encontrar alternativas”.
“O objetivo passa por conseguirmos trabalhar de forma sustentável e fazer com os que os materiais locais façam parte da economia e que todos os atores da economia da construção civil consigam ter lucros recorrendo a estes materiais”, conclui Pedro Monteiro.
Além das casas, a impressão 3D está a dar cartas noutras áreas, havendo já impressoras 3D capazes de produzir vegetais frescos, bifes de lombo e até próteses dentárias.
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Empresa de Vila do Conde “imprime” primeira casa com tecnologia 3D em Portugal
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