Juan Roig transformou os talhos do pai na gigante Mercadona, que já está a ganhar dinheiro em Portugal, mas continua ‘fiel’ a Valência com projetos de mecenato que vão das startups ao basquetebol.
Meio século depois de começar a trabalhar na empresa de talhos do pai (Grupo Cárnicas Roig), que deu origem à Mercadona e que transformou em líder do retalho alimentar em Espanha – tem um total de 1.664 supermercados, 60 deles em Portugal e com planos para abrir mais uma dezena em 2025 –, Juan Roig continua a aplicar parte do património pessoal, avaliado no ano passado em 5,8 mil milhões de euros, em projetos de mecenato e filantropia na comunidade de Valência, que vão do apoio ao empreendedorismo ao financiamento a startups, passando pela formação de executivos ou pelo basquetebol.
A Marina de Empresas é um dos projetos mais emblemáticos fomentado pelo quarto mais rico de Espanha – apenas superado por Amancio e Sandra Ortega (Inditex, dona da Zara) e Rafael del Pino Calvo-Sotelo (construtora Ferrovial); e à frente dos donos da Mango (Isak Andik) e do Abanca (Juan Carlos Escotet), que detém também a vinícola portuguesa Sogevinus.
Instalada na zona portuária desde 2015, quando juntou ali os projetos até então espalhados por diferentes pontos da cidade, é o quartel-general da incubadora de startups Lanzadera, da escola de empresários EDEM e da plataforma de investimentos Angels.
“No es el momento para ponerse limites”. Em modo inspiração, esta é a frase que ocupa a parede de uma das salas em formato open space onde 350 empreendedores tentam acelerar os projetos embrionários, aproveitando o modelo colaborativo.
Numa dúzia de anos já por ali passaram 1.600 jovens empresas, num investimento calculado em 22 milhões de euros, como as portuguesas Clevermeals, Indie Seguros ou Lever tax.
O programa presencial é de seis meses, prolongável até um ano, e acaba de receber novos ocupantes. Nesta última ronda entraram a Plaspy, que tem origem colombiana, mas é gerida a partir de Lisboa; e a Volup, fundada na capital portuguesa por um espanhol que voltou ao país natal para expandir o negócio.
A responsável de comunicação da Marina de Empresas fala num espaço de “networking potente” e que, por regra, é frequentado pelos “bons empreendedores portugueses” interessados em explorar o mercado espanhol.
Com a pandemia mudou também o perfil dos participantes – “já não são apenas chavales”, comenta Neus García após cruzar-se no corredor virado ao Mediterrâneo com um antigo diretor de topo do grupo Prisa (media). Virou empreendedor na Lanzadera, que acaba de ser distinguida como a melhor aceleradora de Espanha e a sétima da Europa no ranking do Financial Times.
Tal como na EDEM, uma fundação sem fins lucrativos que funciona como escola de negócios para “promover a liderança e o espírito empreendedor”, pela qual já passaram três mil alunos em diferentes cursos e que está instalada no mesmo complexo – até 2026 terá um terceiro edifício num investimento de 15 milhões de euros e chegará aos 7.600 metros quadrados –, todos são evangelizados com “Modelo de Qualidade Total” da Mercadona, criado por Roig para satisfazer clientes, trabalhadores, fornecedores, acionistas e a sociedade civil.
É o caso de Sergio Conejo, fundador da Worksible, que entrou no programa em 2021 e acabou por ficar a arrendar um espaço de escritório. Natural de Madrid, “desde os 12 anos que sabia que queria ser empreendedor” e mudou-se para o sul de Espanha para acelerar a plataforma que conecta milhares de profissionais freelancers de várias áreas com as necessidades de contratação das empresas, com recurso a inteligência artificial.
Diz que ganha “potenciais clientes” sempre que entram novos empreendedores no ecossistema na Lanzadera. Com dez pessoas na equipa, prepara-se para fazer “um mês de retiro” deste lado da fronteira para perceber como funciona o mercado e “mergulhar na cultura portuguesa”.
No grupo de acionistas da Worksible está um fundo suíço e a Angels, uma plataforma financiada igualmente por Juan Roig e que investe nas empresas com maior potencial e “alinhadas com os valores” da Marina de Empresas, nomeadamente em matéria de sustentabilidade.
Desde que foi criada, a estrutura com meia dúzia de analistas, instalada provisoriamente num edifício vizinho, já aplicou perto 40 milhões de euros e tem atualmente 39 participadas. Por outro lado, sublinha a porta-voz Neus García, ajudam também os empreendedores instalados na Marina a ligar-se com outros potenciais investidores.

Nascido a 8 de outubro de 1949, casado com Hortensia Herrero, pai de quatro filhas e avô de onze netos, Juan Roig recebeu em 2014 a distinção de “Filho Predileto” da cidade de Valência.
Licenciado em Ciências Económicas pela Universidade de Valência, seis anos depois de começar a trabalhar na empresa do pai, em 1981, juntou-se a três dos cinco irmãos para comprar a empresa (já então designada Mercadona e que contava com oito lojas na cidade).
Mais tarde acabaria por comprar também a quota dos irmãos e erguer a pulso a gigante do retalho alimentar que emprega 110 mil pessoas e está agora a expandir em Portugal, onde já começou a ganhar dinheiro.
A Roig Arena é a mais recente peça deste puzzle do empresário valenciano para “impulsionar a região da Comunidade de Valência como um polo relevante de desenvolvimento”. Com inauguração agendada para setembro deste ano, este recinto multiusos vai acolher eventos desportivos, de entretenimento e empresariais.
Este megaprojeto iniciado ainda antes da pandemia tinha um orçamento de 280 milhões de euros, financiado integralmente por Juan Roig com o seu património pessoal. No entanto, como reconheceu o diretor-geral Víctor Sendra durante uma visita às obras, com o disparo no preço das matérias-primas e as funcionalidades entretanto acrescentadas ao projeto, o custo final vai superar os 300 milhões de euros.

Além de se tornar a nova casa do Valencia Basket, clube detido pelo dono da Mercadona, o recinto vai ter uma capacidade máxima estimada de 20 mil espectadores em modo de concerto, salas multifuncionais para eventos simultâneos e ainda várias áreas de restauração.
Em paralelo, o projeto inclui a construção de infraestruturas complementares para “revitalizar o bairro”, como a escola pública “Les Arts” que já foi inaugurada ou um parque público de 21.000 metros quadrados que ligará a Roig Arena ao novo parque de estacionamento.
(O jornalista viajou para Espanha a convite da Mercadona)
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“Filho predileto” lança boia a empreendedores e ‘encesta’ mega arena em Valência
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