Afinal, de quantos crimes é acusado João Rendeiro do BPP?
Burla qualificada, falsificação de contabilidade, desvio de prémios. Estes são alguns dos processos de que foi alvo o ex-presidente do BPP, João Rendeiro, desde que abandonou o cargo em 2008.
Uma, duas, três… já se perdeu a conta de quantas acusações já foi alvo João Rendeiro, ex-presidente do Banco Privado Português (BPP). Desde que renunciou ao cargo de presidente do conselho de administração, em 2008, o gestor teve cinco acusações. Primeiro foi o Banco de Portugal (BdP) a avançar com um processo sancionatório contra os administradores, depois foi a vez de a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) imputar 35 violações do Código de Valores Mobiliários. Mas não fica por aqui. Só no Ministério Público (MP) há três acusações em cima da mesa: burla qualificada, falsificação de contabilidade e o desvio de prémios e remunerações. Ainda estão todos a correr nos tribunais.
Voltemos um pouco atrás. Foi em novembro de 2008 que João Rendeiro, fundador, maior acionista e então ainda presidente do conselho de administração do BPP, solicita a garantia do Estado para um empréstimo de 750 milhões de euros junto do Citigroup. Quatro dias depois, o então governador do banco central, Vítor Constâncio, anuncia que o BdP vai dar parecer negativo ao pedido de garantias estatais.
Isto ao mesmo tempo que a agência de notação financeira Moody’s corta não só o rating da instituição como o indicador da solidez financeira, que mede a probabilidade de um banco vir a precisar de recorrer à ajuda de terceiros (acionistas ou instituições oficiais). Acontecimentos que levaram Rendeiro a renunciar ao cargo durante uma reunião de acionistas. Desde então, o ex-BPP não parou de somar acusações, seja por parte dos reguladores ou do MP. Ou até dos próprios clientes.
BdP acusa Rendeiro e administradores de má gestão
O banco liderado por Carlos Costa foi a primeira entidade a avançar com uma acusação contra João Rendeiro e os outros ex-administradores por ter detetado infrações na gestão do BPP, algumas especialmente graves. O BdP acusou os 11 arguidos do caso BPP em junho de 2012 a multas que ascenderam a cerca de dez milhões de euros. Mas o Tribunal de Supervisão reduziu este montante para cerca de 8,1 milhões de euros, aplicando ainda sanções acessórias de inibição de funções em instituições de crédito e sociedades financeiras para os mesmos arguidos.
Ao presente processo foi aplicada a lei vigente à data da prática dos factos, tendo sido aplicadas coimas num valor global de cerca de 11 (onze) milhões de euros.
Segundo o tribunal, o BdP acusou o BPP de ter criado um veículo, conhecido por Leaving Seagull, com sede nas ilhas Virgens Britânicas, que fez emissões “fictícias” de 50 milhões de euros. Isto porque os títulos nunca tiveram qualquer movimento de compra, venda ou transferência. Segundo a acusação, foram vários os alertas para as “graves consequências” que podiam advir da manutenção do veículo.
CMVM diz que houve violação do dever de qualidade de informação
“Violação a título doloso, do dever de qualidade de informação” e do “dever de o intermediário financeiro atuar de modo a evitar ou a reduzir ao mínimo o risco da ocorrência de conflitos de interesses” estão entre as várias infrações detetadas pela CMVM entre 2002 e 2008 na gestão do banco liderado então por João Rendeiro. Um processo que se arrastou. O gestor chegou a dizer que não tinha conhecimento da acusação, afirmando apenas que em “dois anos nunca fui ouvido sobre esta matéria, portanto não faço ideia do que seja”.
A partir do momento em que Rendeiro recebeu a acusação, a defesa iniciou uma avalanche de novos requerimentos: primeiro porque o acórdão da Relação continha diversas nulidades e violava algumas disposições constitucionais. Depois alegou, além de inconstitucionalidades, a omissão de pronúncia sobre um pedido de realização de audiência. Meses depois, a defesa de João Rendeiro insistiu nas inconstitucionalidades e na omissão de pronúncia. É na sequência deste último requerimento que os juízes Vasco Freitas e Rui Gonçalves decidem colocar um ponto final na sucessão de incidentes.
Os sete arguidos neste caso acabaram por ser condenados ao pagamento de coimas globais de 4,4 milhões de euros, dos quais Rendeiro teve de pagar um milhão. Além da coima, o gestor recebeu ainda como sanção acessória a inibição do exercício de funções na banca por um período de cinco anos.
MP acusa Rendeiro de burla, falsificação e desvio de prémios
Ao mesmo tempo que decorriam os processos contraordenacionais dos dois reguladores, o MP iniciava a sua investigação, mais conhecida por “caso BPP”. E, desta investigação, surgiram três acusações diferentes. A justiça começou por acusar João Rendeiro, Paulo Guichard e Salvador Fezas Vital de burla qualificada em regime de coautoria por alegadamente terem atraído de forma fraudulenta investidores para um aumento de capital de uma sociedade veículo do BPP chamada Privado Financeiras. Isto porque alegadamente a empresa já estaria tecnicamente falida na altura da operação de aumento do capita social. A operação terá alcançado cerca de 100 milhões de euros, tendo os investidores sido prejudicados num montante total de cerca de 40 milhões de euros.
O processo em que o ex-banqueiro foi acusado de burla qualificada está ainda à espera do recurso do MP. Em primeira instância, João Rendeiro foi absolvido. O MP recorreu nessa altura para o Tribunal da Relação que decidiu que o processo baixasse de novo à primeira instância, para que uma última testemunha fosse ouvida. Mas a decisão de absolvição manteve-se. Agora, o Ministério vai interpor um segundo recurso.
O julgamento que se seguiu prendeu-se com o chamado processo principal do BPP. Nestes autos investigou-se a alegada falsificação da contabilidade do banco. O ex-presidente executivo foi acusado, em junho de 2014, pelo Departamento de Investigação e Ação Penal, de seis crimes de falsidade informática e um crime de falsificação de documento. Um processo que teve desenvolvimentos esta sexta-feira, com o MP a pedir pena de prisão entre sete e nove anos para Rendeiro, nas alegações finais do julgamento no Tribunal Criminal de Lisboa. Para os outros ex-administradores, Paulo Guichard e Salvador Fezas, o MP pediu uma pena de prisão de sete a oito anos.
Mas não acaba aqui. Há um outro processo que diz respeito à terceira acusação produzida no âmbito do chamado caso BPP pela 9.ª secção do DIAP de Lisboa, num despacho. Estava em causa o alegado desvio de prémios e remunerações aprovadas pela Comissão de Vencimentos daquele banco, mas sem que os acionistas tivessem conhecimento. Além disso, Rendeiro e os restantes ex-administradores terão, de acordo com a acusação, utilizado fundos do banco para a concretização de investimentos pessoais.
Um conjunto de acusações a que se juntam ainda os clientes do banco. No chamado processo dos clientes estão em causa centenas de queixas por alegada burla que foram concentradas num inquérito no DIAP de Lisboa. Os clientes alegavam que tinham sido convencidos a investir em produtos vendidos como depósitos a prazo quando se tratavam na realidade de produtos estruturados de alto risco. Um capital que tem sido recuperado parcial ou totalmente, o que levou a maioria dos clientes a desistir das queixas.
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