Lucro do BCE poderá financiar orçamento da União Europeia após o Brexit
Uma das hipóteses em cima da mesa para financiar o orçamento comunitário pós-Brexit é ir buscar os lucros do Banco Central Europeu. Em causa estão as receitas com a emissão de notas na Zona Euro.
Parte dos rendimentos do Banco Central Europeu pode vir a financiar o orçamento da União Europeia. Esta é uma das várias vias que a Comissão Europeia propõe para aumentar os seus recursos próprios. A questão coloca-se desde que o Reino Unido decidiu sair do bloco: como compensar o “buraco” de 13 mil milhões de euros? A ideia de Jean-Claude Juncker é ir aos cofres da instituição liderada por Mario Draghi. Montante pode chegar aos oito mil milhões de euros por ano.
“Uma percentagem do rendimento auferido pelo Banco Central Europeu pela emissão de notas é outro exemplo de uma nova fonte de receitas para o orçamento da UE“, lê-se num documento divulgado esta quarta-feira que antecipa a reunião informal do Conselho Europeu de 23 de fevereiro, onde o assunto deverá ser debatido pelos líderes dos Governos europeus. Em causa está a senhoriagem, o lucro dos bancos centrais pela emissão de moeda que resulta da diferença entre o ‘valor’ do dinheiro e o custo de produzi-lo.
O documento da Comissão Europeia assinala que “uma vez que o rendimento monetário do Banco Central Europeu pela emissão do euro está diretamente ligado à União Económica e Monetária, poderá ser considerado como um possível novo recurso próprio”. “O Orçamento da UE poderia beneficiar, sob a forma de contributo nacional, do montante correspondente a parte dos lucros através de uma percentagem dos rendimentos monetários dos bancos centrais nacionais da Zona Euro, entregues aos Governos nacionais”, sugere a Comissão Juncker, sem entrar em pormenores de como isso será feito.
Atualmente, a receita de senhoriagem é baixa dado que a taxa de juro diretora praticada pelo Banco Central Europeu é de 0%. A Comissão Europeia diz as receitas dependem da percentagem aplicada aos lucros do BCE: 10,5 mil milhões de euros em sete anos caso seja de 10% ou 56 mil milhões de euros no mesmo período caso seja 50%. Ou seja, no máximo uma contribuição de oito mil milhões de euros por ano. Contudo, o relatório de contas de 2016 mostra que, nos últimos anos, o BCE conseguiu, no máximo, lucrar dois mil milhões de euros com a emissão de notas, como pode no gráfico sob o nome “interest income arising from the allocation of euro banknotes within the Eurosystem”.
A questão é mais complexa por causa da forma como o eurosistema funciona. Os lucros do Banco Central Europeu são distribuídos aos bancos centrais nacionais que depois os canalizam — consoante as provisões que fazem, uma discussão feita recentemente em Portugal — para os Governos nacionais.
Em princípio, uma proposta como esta da Comissão Europeia implica uma mudança na legislação atual. O texto divulgado por Bruxelas indicia que parte desses lucros distribuídos aos bancos centrais nacionais poderão ser canalizados para o orçamento comunitário como um contributo nacional suplementar ao que já é entregue todos os anos pelos Estados-membros.
Questionado pelo ECO, o Banco Central Europeu recusou comentar a proposta dado que a distribuição dos lucros não é uma decisão da instituição liderada por Mario Draghi. Esta ideia foi apenas lançada para o debate público pela Comissão Europeia, não sendo ainda uma proposta formal. Os pormenores da medida ainda terão de ser discutidos ao nível europeu caso esta avance, nomeadamente porque o orçamento é da UE, mas os lucros do BCE só se referem aos 19 países da Zona Euro.
Como é que se faz dinheiro… com o dinheiro?
Na Zona Euro, o Banco Central Europeu é responsável pela impressão do euro que depois é armazenado nos cofres dos bancos centrais. Para chegarem aos cidadãos, as notas passam pelos bancos comerciais que pagam ao respetivo banco central o valor facial das notas. É aqui que se consegue fazer lucro com o dinheiro.
“Normalmente os bancos precisam de solicitar um empréstimo ao banco central ou de apresentar alguns dos seus ativos como pagamento”, refere o BCE no seu site, explicando que, “no processo, o banco central aufere juros sobre os empréstimos que concede, ou recebe rendimentos com os ativos que adquire, sendo estes proveitos os designados ‘rendimentos de senhoriagem”.
Na Zona Euro ficou acordado que o Banco Central Europeu recebe os rendimentos de senhoriagem relativos à sua quota de 8% do total de notas em circulação. Desde 2008 que esses rendimentos registam sucessivas quedas devido à descida das taxas de juro. Em 2016, esta receita foi de apenas nove milhões de euros.
Os lucros com a senhoriagem juntam-se depois a outras fontes de receita do BCE que, atualmente, são mais expressivas — principalmente as receitas com o programa de compra de títulos de dívida que, em 2016, ultrapassaram os mil milhões de euros. Depois de feitas provisões para cobrir eventuais perdas futuras, esses lucros são distribuídos pelos bancos centrais nacionais dos países da Zona Euro.
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