Entre vacas voadoras e o diabo, deputados debateram o Estado da Nação “à espera”

No debate sobre o Estado da Nação houve duras críticas ao Governo que deixou o país "à espera" e "esmagado". Mas, apesar de "Portugal não ser um oásis nem um país cor de rosa", o "diabo não chegou".

O diabo apareceu num país cor-de-rosa onde se veem vacas a voar? É uma questão que parece vinda da boca de uma criança mas que na verdade poderia surgir na mente de quem assistiu ao último debate da legislatura sobre o Estado da Nação. Os deputados e o Executivo de António Costa discutiram, durante mais de quatro horas, no Parlamento, como está Portugal.

Coube ao primeiro-ministro o discurso inicial, onde fez um balanço sobre os últimos quatro anos da legislatura e apontou que foi o “virar da página da austeridade” que permitiu alcançar resultados positivos e contas certas. “Nem o Diabo apareceu, nem a austeridade se disfarçou”, ditou Costa.

Apesar de ter destacado as conquistas do Governo, Costa admitiu que ainda há caminho a fazer. “Não vivemos num oásis nem num país cor-de-rosa”, disse o primeiro-ministro, apresentando por isso várias medidas para combater os problemas que ainda se sentem no país, nomeadamente nos serviços públicos.

Estes problemas, para o PSD, deixam os “contribuintes esmagados e serviços públicos arrasados”. O deputado social-democrata António Leitão Amaro criticou o caminho traçado pelo Governo e reiterou que Portugal se “transformou na nação à espera”, à espera da proteção civil, do barco, da consulta.

O PSD lançou ainda acusações à execução do processo de modernização da Administração Pública, sendo que ainda na semana passada foi apresentado um novo pacote de medidas. “Prometeu que ia trazer um Simplex que ia fazer a vacas voar e os portugueses ficaram à espera”, disse Leitão Amaro.

Perante esta acusação, Costa citou vários indicadores, nomeadamente que há mais consultas e cirurgias, e garantiu que os objetivos foram cumpridos. O chefe de Governo voltou a invocar a figura com chifres e cauda pontiaguda. “Ainda bem que está sentado, porque vai ficar sentado à espera que o Diabo chegue“, atirou ao deputado social-democrata.

Mais tarde as vacas voadoras prometidas por Costa aquando da apresentação do Simplex+ voltaram à baila, enquanto se discutia a área da saúde. “Quatro anos depois, as vacas não voaram e estão cada vez mais enterradas na lama, especialmente na saúde“, atirou Ricardo Baptista Leite, do PSD.

Quatro anos depois, as vacas não voaram e estão cada vez mais enterradas na lama, especialmente na saúde.

Ricardo Batista Leite

Quando chegou a vez do CDS, regressa a história do país cor-de-rosa. Nuno Magalhães reiterou que Costa vive sim num país cor-de-rosa e que a culpa não é da troika. Face às promessas de investimento, o deputado acusa o primeiro-ministro de ser “ótimo a anunciar, péssimo a fazer”.

Costa não deixou as acusações passar em branco, que chegaram também da parte de outros partidos, mas recorreu à sabedoria popular para explicar que quer seguir o caminho certo. “Como diz o povo: quem se mete em atalhos, mete-se em trabalhos”, apontou o primeiro-ministro.

A palavra regressou à bancada social-democrata, ao seu vice-presidente António Costa Silva, que desta vez se focou sobre a “má execução” dos fundos comunitários. Para o deputado, o Executivo de Costa está a “enganar os portugueses” num momento em que a taxa de execução destes fundos estava em junho nos 40%. O “Governo Syriza à portuguesa continua em negação”, acusou, fazendo referência ao partido de esquerda grego.

Mas as críticas não vieram apenas da direita. O deputado do Bloco, Pedro Filipe Soares, lembrou o Governo que o que se alcançou nesta legislatura não se cingiu às medidas anunciadas no programa socialista. “A vida não começa nem acaba no programa do PS”, disse, acrescentando ainda que “há órfãos do programa eleitoral do PS e ciúmes”.

E se para a esquerda o pecado original foi o Executivo não ter ido mais longe, para o líder parlamentar do PSD, o problema reside no facto de o primeiro-ministro insistir “em pintar de cor-de-rosa” o país e de o “governar em permanente modo de reality show“. “Que país temos?”, questionou Fernando Negrão. “E não me refiro ao país virtual, ao país para a fotografia”, atirou.

A resposta coube ao deputado socialista, Fernando Rocha Andrade, que acusou os sociais-democratas de “entenderem que a política beneficia de suspense”, por nunca se saber que posição vão tomar, por exemplo face aos aumentos ou cortes na despesa. Fernando Negrão reconheceu que do lado do Governo não há mistérios. “Este Governo não nos cria suspense nenhum porque sabemos como governa, aumentando a carga fiscal e cortando o investimento público”, apontou.

Os portugueses trocariam certamente umas décimas no défice por medidas que melhorassem as suas vidas.

Heloísa Apolónia

O PCP optou por atacar a obsessão pelas contas certas. O Governo “meteu as metas do défice à frente do povo”, acusou o líder comunista Jerónimo de Sousa. “Os portugueses trocariam certamente umas décimas no défice por medidas que melhorassem as suas vidas”, apoiou a deputada Heloísa Apolónia dos Verdes.

Depois de quase cinco horas de muitas críticas e também elogios, o diabo voltou ainda a ser mencionado, desta vez pelo ministro das Finanças. “Os velhos, não do Restelo mas do Caldas e da Lapa, desceram a São Bento e apelaram meses a fio ao mafarrico e à impossibilidade aritmética“, ironizou Mário Centeno, numa tirada à direita, mesmo nos minutos finais do debate do Estado da Nação.

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