Portugal: Um país confiante ou uma “nação à espera”?
Dos transportes à saúde, passando pela Segurança Social e impostos. Governo e oposição usaram o debate sobre o Estado da Nação para apresentarem duas leituras de Portugal diametralmente diferentes.
Ainda que tenha admitido que Portugal não é um “oásis”, António Costa insistiu em pintar um país marcado por avanços e conquistas, em tudo contrastante com a “nação à espera” descrita pela oposição. O último debate sobre o Estado da Nação desta legislatura ficou, assim, marcado pela divergência de leituras entre a bancada do Executivo e os grupos parlamentares mais à direita, com a saúde, emprego, transportes, Segurança Social e carga fiscal em destaque.
Pelos olhos deste Executivo, Portugal é hoje um país com “mais e melhor emprego”, mais crescimento, “maior igualdade” e onde estão a ser feitas apostas nos transportes e na saúde, com o sistema da Segurança Social a ganhar uma capacidade sem precedentes e os impostos a recuar.
Já na visão do PSD e do CDS-PP, os serviços públicos estão cada vez mais “degradados”, sendo Portugal agora uma “nação à espera” das consultas médicas, dos transportes, das pensões da Segurança Social, onde os contribuintes veem os seus rendimentos “engolidos” pela carga fiscal.
O Portugal de António Costa
Para o primeiro-ministro, durante esta legislatura, os portugueses “deixaram de viver na incerteza do aumento dos impostos”. “Aliviámos em mil milhões de euros o IRS”, lembrou António Costa, referindo ainda recuos no IVA da restauração e do IRC. Sobre o aumento da carga fiscal, o líder do Executivo explicou que essa evolução está ligada “única e exclusivamente” ao crescimento da economia e do emprego, o que se reflete numa subida também das contribuições para a Segurança Social.
O Portugal da oposição
Em contraste com o Portugal “aliviado” em termos fiscais apresentado por António Costa, surgiu o Portugal onde os contribuintes estão “esmagados” pelos impostos trazido a plenário pelo deputado do PSD António Leitão Amaro. Já o líder do grupo parlamentar do CDS também fez questão de frisar este ponto, defendendo que o país vive atualmente uma “carga fiscal máxima”, o que contrasta com os “serviços mínimos” disponibilizados. “Onde é que tinha inscrito como meta que Portugal fosse ter a maior carga fiscal de sempre durante o seu Governo?”, acrescentou ainda Cecília Meireles. “E até a prometida recuperação de rendimentos foi engolida por taxas e taxinhas”, rematou o social-democrata Fernando Negrão, defendendo a redução da carga fiscal e da taxa de IRS.
O Portugal de António Costa
No final da sua intervenção inicial, António Costa dedicou uns momentos à saúde, sublinhado que este Executivo “procurou” dar resposta aos “problemas históricos” e “sazonais” do setor, nomeadamente com a recente estratégia para a gestão do tempo de férias das maternidades de Lisboa, tema que acabou por gerar uma polémica significativa. Além disso, o primeiro-ministro salientou que, até ao termo do legislatura, 97% dos portugueses terão médico de família. “Não conseguimos chegar aos 100% por falta de candidatos [ao concurso]. Ficamos a três pontos percentuais (p.p) desse objetivo e seguramente que o vamos cumprir no início da próxima legislatura”, explicou António Costa, já piscando o olho às eleições de outubro.
O Portugal da oposição
“Portugal tornou-se uma nação à espera”. Estas palavras foram ditas pelo deputado António Leitão Amaro, que se referia aos atrasos não só nos transportes, mas também nas consultas no Serviço Nacional de Saúde. O social-democrata reforçou que os serviços públicos portugueses estão “degradados e arrasados”. Mais à direita, Nuno Magalhães insistiu, na mesma linha, que atualmente há “cirurgias adiadas como nunca, mais equipamentos por substituir e cada vez mais tempo à espera da primeira consulta”. O líder da bancada do CDS-PP acusou ainda o Governo de não ter cumprido o seu objetivo relativamente à cobertura dos médicos de família, referindo que há ainda 740 mil portugueses sem acesso a este serviço. “Quatro anos depois, as vacas não voaram e estão cada vez mais enterradas na lama, especialmente na saúde”, atirou ainda Ricardo Baptista Leite, do PSD. Fernando Negrão rematou as críticas ao Executivo, defendendo que a “narrativa” apresentada por Costa é “desmentida” assim que os portugueses vão ao hospital.
O Portugal de António Costa
“Nesta legislatura, já investimos quatro vezes mais do que na anterior, no setor dos transportes”, garantiu o primeiro-ministro. António Costa adiantou ainda que “já não há composições paradas” no Metropolitano de Lisboa, quando antes 30 estavam nessa situação. Sobre os concursos públicos abertos para reforçar a frota dos diversos setores dos transportes, o governante lembrou que estes processos levam o seu tempo e é, portanto, preciso aguardar. O líder do Executivo aproveitou também para reforçar que, durante esta legislatura, o investimento público (nomeadamente nos transportes, mas não só) subiu 45%, uma evolução que foi financiada pelo Orçamento do Estado e pelos fundos comunitários.
O Portugal da oposição
“Toma uma medida que promove a procura, mas não cuida da oferta”. Estas palavras foram ditas por Nuno Magalhães e dizem respeito ao passe social lançado por este Executivo, que acabou por provocar algum “caos” nos transportes face à oferta insuficiente para o boom de utentes. “Barcos que não partem, comboios suprimidos, comboios que não andam porque não têm motor, reclamações que estão no ponto mais elevado de sempre”, criticou o líder da bancada do CDS. Do grupo parlamentar do PSD, também se ouviram ataques deste género, com o deputado Emídio Guerreiro a considerar este Governo um “inimigo do investimento público”, o que se espelha na degradação do setor em causa. Pior, disse o deputado, foram as soluções adotadas, como a retirada de bancos para acolher mais clientes nos mesmos transportes. Os portugueses com o seu Governo foram os sócios minoritários”. “Nos transportes, o caos é a normalidade. Há supressão constante de carreiras”, rematou Fernando Negrão.
O Portugal de António Costa
O emprego foi uma das grandes áreas escolhidas por António Costa para arrancar o debate. “Foram criados 350 mil postos de trabalho”, disse o primeiro-ministro, referindo-se ao período desta legislatura. Esta subida foi acompanhada por um aumento do rendimento dos trabalhadores de 8,2% e uma subida de quase 20% do salário mínimo nacional, salientou o mesmo político. E mais: “89% dos novos empregos por conta de outrem foram contratos sem termo”. Os mesmos dados foram salientados por Vieira da Silva, que acrescentou que o crescimento do emprego provocou um reforço da “coesão social e territorial”. O governante destacou também o recuo do desemprego de longa duração e o desemprego jovem.
O Portugal da oposição
Ainda que não tenha referido diretamente o emprego, Fernando Negrão deixou duas notas sobre a matéria: a recuperação de rendimentos anunciada pelo Governo foi “engolida” pela carga fiscal; e ainda há 2,2 milhões portugueses a viver ainda “em risco de pobreza e exclusão social”.
O Portugal de António Costa
O primeiro-ministro lembrou que este Executivo “reverteu” os cortes das pensões e fez aumentar estas prestações sociais, sintoma de que nem o “diabo apareceu, nem se disfarçou a austeridade”. Sobre os atrasos na atribuição das pensões, António Costa nada disse, mas Vieira da Silva logo adiantou explicações, justificando a situação com a redução de quase 40% dos recursos humanos do Centro Nacional de Pensões, durante o anterior Governo. “O sistema tem hoje uma capacidade de resposta como nunca teve no passado”, insistiu o ministro, recuperando o que já tinha dito na Comissão de Trabalho.
O Portugal da oposição
“Uma nação à espera” também dos pagamentos da Segurança Social, sublinhou António Leitão Amaro, do PSD. Clara Marques Mendes, do CDS, fez questão ainda de notar que, ao contrário do que o Governo tinha prometido, estes atrasos ainda não estão resolvidos. “Na Segurança Social, vive-se uma situação insustentável. Veja-se os atrasos na atribuição das pensões”, acrescentou Fernando Negrão.
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