Lego no trabalho. A brincar a brincar, um jogo sério
Há mais de 10 anos em Portugal, o trabalho com a Lego Serious Play tem como única ferramenta as mãos e a imaginação. Para que todos se sintam parte da mudança e do “sistema vivo” de uma organização.
“É possível descobrir mais sobre uma pessoa numa hora de brincadeira, do que num ano de conversa”, já dizia Platão. O LEGO® Serious Play® é uma ferramenta para as pessoas nas organizações, que tem como objetivo facilitar a comunicação e promover a inclusão dos colaboradores na resolução de problemas e na projeção do futuro da empresa. Para aplicar a metodologia, os participantes têm à disposição um kit de Lego, com peças de várias cores, tamanhos e feitios, e a ajuda de um facilitador. Eles são meros mediadores numa reunião hands on, sem hierarquias e que se divide em três etapas. As sessões podem durar uma manhã, ou até dois dias, e ninguém fica de fora. Todas as respostas serão encontradas na sala onde se juntam os participantes.
Para começar o desafio Lego Serious Play, o facilitador distribui o mesmo número de peças por todos os participantes, e lança questões, consoante o objetivo de cada encontro. “O que é para si um líder?”, “Como classifica um dia frustrante no seu trabalho?”, “Como acrescenta valor à organização?”. A pergunta serve como ponto de partida do que se segue. Numa segunda fase, cada participante tem um tempo limite para contar a sua história, construindo o seu modelo com as peças de Lego. No final, todos os envolvidos vão atribuir significados às construções e partilhá-los, abrindo espaço para uma reflexão conjunta sobre os problemas da organização.
“É uma das formas mais democráticas de se entregar a um assunto. Toda a gente fala e toda a gente ouve, por oposição àquelas reuniões mais convencionais em que há 20% das pessoas que falam 80% do tempo”, começa por explicar Rita Pelica, CEO da OnYou – Empowering and Learning Experiences, em conversa com a Pessoas. Rita é facilitadora de Lego Serious Play desde 2017 e, com a sua empresa, tem aplicado a metodologia em organizações de norte a sul do país e a nível internacional. “É uma forma muito interessante de quebrar o gelo, de começarmos a entender certas barreiras que muitas vezes as próprias organizações não admitem que existem”. “O Lego é muito emocional. Muitos de nós brincaram com eles e as pessoas, no mínimo, têm curiosidade”, frisa.
“As cores, o tipo de peças e de construção que se utilizam dizem muito sobre a pessoa. Há pessoas que têm muita dificuldade em construir do zero. São ótimas a criticar mas, muitas vezes nestes exercícios de construção e representação, bloqueiam”, explica Sandra Matos, facilitadora certificada desde 2017.
"Toda a gente fala e toda a gente ouve, por oposição àquelas reuniões mais convencionais em que há 20% das pessoas que falam 80% do tempo.
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Nestas sessões, os facilitadores são apenas observadores e há revelações marcantes. “Armas em todas as mãos, capacetes, ou bonecos em altos de pedestal”. Um dos exercícios mais famosos é o “desafio da torre”. “Vão surgir torres altas com uma base menos estável, uma torre mais baixa com uma base mais estável, instáveis, aerodinâmicas”, revelando subtilmente a própria personalidade de cada colaborador, conta Sandra. Todas as construções podem ser interpretadas de forma diferente e representam coisas diferentes. “Como as pessoas estão a brincar, não estão condicionadas com o politicamente correto, estão muito soltas. Num curto espaço de tempo conseguimos ir a uma grande profundidade dos problemas da empresa ou da área”, relata.
“Não deixamos de brincar quando ficamos velhos. Ficamos velhos quando deixamos de brincar”, metaforiza Bruno Soares. Professor na área de transformações digitais em programas executivos e de MBA, também certificado em Lego Serious Play, Bruno viu neste método uma forma de conhecer melhor os alunos e criar dinâmicas na sala de aula. “O facto de todos serem obrigados a participar é extraordinariamente importante, tanto nas organizações como nas salas”, defende. “Não é que as organizações não consigam perceber o futuro, às vezes não conseguem é imaginá-lo. Esta ferramenta deve ser, em última análise, uma das mais importantes para que as pessoas se sintam parte do processo de transformação que as empresas estão a fazer”.
O LSP tem sido aplicado em todo o tipo de empresas, desde pequenos negócios até multinacionais. “Esta dinâmica foi uma excelente oportunidade para que toda uma equipa financeira pudesse abordar temas que parecem ser muito simples e fechados mas que acabam por se revelar complexos”, revela ao Luís Ferreira, manager na Deloitte. “São um movimento de ‘gamificação à moda antiga’, que alavancam competências relacionais e comunicacionais muito importantes para qualquer pessoa, equipa ou organização”, testemunha Marisa Aguiar, do grupo Ageas. O facto de se jogar com legos traz “um mix de sensações do ponto de vista emocional”, assinala Rita Pelica. Neste “jogo sério” com um fim sempre imprevisível usam-se metáforas, desenvolve-se a escuta ativa, a comunicação e a criatividade, tudo através das famosas peças de plástico coloridas.
Mas para que este método produza os resultados desejados, a organização tem de estar comprometida em encontrar a solução no ativo humano. No entanto, alerta Rita, é aqui que o processo estagna. É que “muitas das culturas organizacionais não estão preparadas, porque não querem ouvir o que as pessoas têm a dizer. É uma cultura de medo, não é uma cultura de feedback”, alerta. Para as duas facilitadoras, o mercado português está mais aberto a novas metodologias, mas ainda há um caminho a percorrer. “Convidava as organizações a serem mais proativas, no sentido de se exporem e usufruírem de todo o know-how que existe dentro das organizações e que muitas vezes não é aproveitado”, remata Rita Pelica.
Legos não são (só) para meninos
O LEGO® SERIOUS PLAY® surgiu em 1996 com o objetivo de ser uma nova ferramenta para definir estratégias nas organizações. Johan Roos e Bart Victor, dois professores suecos, e Kjeld Kirk Kristiansen, CEO da LEGO, viram nos famosos brinquedos de plástico uma oportunidade de envolver os colaboradores num “jogo sério” através de construções a três dimensões, tendo por base uma dinâmica participativa e inclusiva. O Lego tem inspirado criações entre os mais novos ao longos dos tempos e, nesta metodologia, é para os graúdos uma forma de projetar o futuro de uma organização. Robert Rasmussen, cocriador do LSP, lidera a Association of Master Trainers, que certificou o primeiro Facilitador Lego Serious Play no mundo, em 2001. Esta metodologia chegou a Portugal há quase dez anos e tem vindo a ganhar adeptos.
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