Ministra admite recuar na obrigação de juízes aplicarem dispensa de pena caso arguidos confessem
Francisca Van Dunem diz que "Governo não é uma concha fechada" e admite que a obrigatoriedade de um juiz dispensar pena a um arguido confesso possa ser repensada.
A ministra da Justiça admite que está aberta a diálogo e que o Governo não é uma “concha fechada” no que toca ao plano estratégico contra a corrupção — aprovado em Conselho de Ministros há uma semana. Questionada, em entrevista ao ECO, sobre uma das medidas que o setor já apelidou de “inconstitucional”, a Francisca Van Dunen garante que o documento ainda vai a consulta pública e que o setor pode contribuir. E que este pacote “ainda não esta fechado”.
E que medida é esta? A norma em causa prevê que no caso em que um arguido vá, por iniciativa própria, às autoridades denunciar o crime ou retratar-se (mostrar arrependimento), há uma obrigatoriedade de que o juiz (na fase de julgamento) dispense ou suspenda a pena de prisão.
Na altura que o pacote foi aprovado em Conselho de Ministros, logo as vozes representativas da magistratura judicial acusaram esta medida de inconstitucional, já que a CRP exige que os juízes sejam independentes e decidam caso a caso, sem obedecer a regras ou diretivas.
“No meu ponto de vista, esta medida não é inconstitucional mas… pronto, é legítimo que essa questão seja colocada”, explica a ministra, em entrevista ao ECO.
Mas admite: “Este e é um documento aberto. Queremos que seja o mais debatido possível. Porque, obviamente, podemos de facto fazer mais à frente alterações. Mas este é o momento em que as pessoas que são da área são convidadas a dar a sua opinião para podermos construir um documento melhor. O Governo não tem opções fechadas e não está fechado na sua concha”.
Com esta regra, o Governo retira a condição de que a denúncia tenha de ser feita no período de 30 dias e retira a incerteza sobre a aplicação da dispensa da pena. Já que o juiz, verificados estes pressupostos — confissão integral da pena — passa a ser obrigado. Segundo o Ministério da Justiça, não é uma novidade face ao regime atual, mas sim “um aprofundamento”.
Manuel Ramos Soares, presidente da Associação Sindical de Juízes Portugueses, garante que esta norma é inconstitucional e exemplifica: um arguido que, apesar de ter arquitetado um grande esquema de corrupção, não é punido porque denuncia apenas o elo mais fraco desse esquema. “Se a nova lei que o Governo quer fazer aprovar não der margem de manobra suficiente ao juiz para apreciar e decidir cada caso concreto será inconstitucional. “Sem revisão constitucional não estou a ver como possa ser possível”, acrescenta Manuel Ramos Soares.
Outra das prioridades apresentadas pela ministra Francisca Van Dunem é a área da contratação pública. “Uma das áreas em que se justificam alterações ao quadro legal, para tornar os procedimentos mais transparentes e assim reduzir os contextos facilitadores da corrupção”, explica o documento, disponível para consulta pública desde segunda-feira.
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