PS admite que patrões possam exigir relatórios diários a quem está em teletrabalho

Depois de BE e PCP, foi a vez do PS apresentar a sua proposta, no Parlamento, sobre o teletrabalho, na qual sublinha que a adoção dessa modalidade tem sempre de ter por base um acordo entre as partes.

O PS apresentou, esta sexta-feira, na Assembleia da República uma proposta de “regulamentação complementar” do teletrabalho, na qual está previsto que os empregadores possam, nesse âmbito, exigir aos trabalhadores “relatórios diários ou semanais simples ou sucintos” a dar conta dos “assuntos tratados” pelo empregado e os “respetivos resultados”. Isto “mediante preenchimento de formulário previamente definido“.

Depois do Bloco de Esquerda e do PCP, esta sexta-feira foi a vez do grupo parlamentar socialista apresentar a sua proposta relativamente ao teletrabalho. Ao contrário das referidas bancadas, o PS escolheu, contudo, avançar com regulamentação complementar, em vez de alterar o Código do Trabalho.

Nesse diploma, os socialistas definem que o teletrabalho deve ser sempre de adesão voluntária e ter por base um acordo entre as partes. “Não haverá teletrabalho sem acordo. Isso é absolutamente essencial”, defendeu Ana Catarina Mendes, em declarações aos jornalistas.

O diploma do PS prevê que nesse acordo — que poderá constar do contrato de trabalho inicial ou ser autónomo deste — fique estipulado o “regime de permanência e de alternância de períodos de trabalho a distância e de trabalho presencial”, bem como o local onde o trabalhador exerce habitualmente as suas funções, a duração normal do trabalho, o horário, a atividade contratada, a retribuição e a periodicidade dos contactos presenciais do empregador. No acordo, deve ficar claro também se os instrumentos de trabalho são fornecidos pelo empregador ou adquiridos pelo trabalhador.

Ao abrigo da proposta do PS, o teletrabalho pode partir da iniciativa tanto do empregador, como do trabalhador, mas em caso de recusa só o primeiro tem de se justificar (e a fundamentação tem de ser feita por escrito). Já se for o trabalhador a recusar a modalidade remota, não tem de fundamentar a sua decisão e essa posição não pode ser causa para despedimento ou qualquer outra sanção.

O PS detalha, na sua proposta, que esse acordo entre as partes pode ser feito a termo (no máximo, por períodos de seis meses, que renovam automaticamente, na ausência de vontade em contrário) ou com duração incerta (podendo cessar, neste caso, mediante comunicação dessa vontade de uma parte à outra, o que produz efeitos no 60º dia posterior).

O PS dedica, por outro lado, um artigo aos poderes de direção e controlo, que diz que deverão ser exercidos por “meio dos equipamentos e sistemas de comunicação e informação afetos à atividade do trabalhador, segundo procedimentos conhecidos por ele e compatíveis com o respeito pela sua privacidade“, ou seja, fica vedada, por exemplo, a “captura de imagem, de registo de som, de registo de escrita, de acesso ao histórico, ou o recurso a outros meios de controlo que possam afetar” esse direito.

Nesse mesmo artigo, os socialistas propõem que o empregador possa exigir aos teletrabalhadores relatório diários ou semanais, mediante preenchimento de formulário previamente definido, sobre os “assuntos tratados na sua atividade e os respetivos resultados”.

Já no que diz respeito aos equipamentos e sistemas necessários ao exercício das funções profissionais, o PS define, na sua proposta, que deverá caber ao empregador assegurar esses materiais, ainda que possa ficar à responsabilidade do trabalhador a sua aquisição, mediante acordo. Além disso, todas as despesas adicionais decorrentes da aquisição e uso dos equipamentos e sistemas informáticos (como energia e internet) devem, diz o PS, ser compensadas pelo empregador, também mediante acordo e desde que sejam comprovadas.

“A compensação a que se refere o número anterior pode consistir numa importância certa, fixada no acordo de teletrabalho ou em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, e ajustável ao longo da vigência do acordo conforme a evolução comprovada das despesas adicionais”, acrescentam os socialistas, o que responde até à dificuldade que tem sido denunciada pelas empresas e advogados de calcular esse apoio com base na faturação dos trabalhadores.

Questionada sobre o acréscimo nas demais despesas implicadas no teletrabalho, a líder do grupo parlamentar socialista salientou que não acha que o legislador deva impor esse pagamento, atirando essas questões para o acordo entre trabalhador e empregador e para a negociação coletiva. Aliás, disse Ana Catarina Mendes: “A negociação coletiva tem peso absolutamente essencial neste diploma”.

Na proposta apresentada esta sexta-feira, o PS define, também, que em teletrabalho cabe ao trabalhador organizar os seus tempos de trabalho de modo adequado aos objetivos, ainda que tenha de ter em conta a regulamentação interna do empregador.

Já no que diz respeito ao direito a desligar, os socialistas fixam como dever dos empregadores absterem-se de contactar o teletrabalhador no período de desligamento. “O trabalhador em regime de teletrabalho tem o direito de desligar todos os sistemas de comunicação de serviço com o empregador, ou de não atender solicitações de contacto por parte deste, não podendo daí resultar qualquer desvantagem ou sanção”, lê-se no documento entregue no Parlamento. “Temos que garantir que o descanso é um direito dos trabalhadores“, frisou ainda Ana Catarina Mendes, esta sexta-feira, em conferência de imprensa.

Por outro lado, no que respeito à saúde, o empregador promove, propõem os socialistas, a realização de exames de saúde no trabalho antes de aplicação do teletrabalho e, posteriormente, de exames anuais para a avaliação física e psíquica do trabalhador. Além disso, o trabalhador tem de facultar “o acesso ao local onde presta trabalho aos profissionais designados pelo empregador” para que seja feito uma “avaliação e o controlo das condições de segurança e saúde no trabalho”.

Além disso, o PS esclarece que o regime legal de reparação dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais deve ser aplicado às situações de teletrabalho, considerando-se o local de trabalho como o local escolhido pelo trabalhador para exercer habitualmente a sua atividade e tempo de trabalho.

Num outro artigo do diploma, o PS determina que ao empregador cabe “promover, com a periodicidade estabelecida no acordo de teletrabalho, ou, em caso de omissão, com intervalos não superiores a dois meses, contactos presenciais com o trabalhador“. Isto para “reexame das condições de trabalho e do modo por que o regime de teletrabalho está a influenciar a sua organização de vida”.

O o PS quer, por outro lado, ver vedada a aplicação do teletrabalho em “atividades que impliquem o uso ou contacto com substâncias e materiais perigosos para a saúde ou a integridade física do trabalhador”.

Tudo somado e segundo explicou aos jornalistas a líder da bancada socialista, este é um “diploma equilibrado“, não só porque se baseia num acordo entre as partes, mas também porque promove a igualdade entre privado e público e entre os trabalhadores remotos e os trabalhadores presenciais, em termos de salários, horários, direitos sindicais, equipamentos, descanso e oportunidades de conciliação da vida pessoal e profissional.

De acordo com Ana Catarina Mendes, este diploma seguirá agora para os parceiros sociais. Está marcada para 5 de maio a discussão, em plenário, das propostas do BE e PCP sobre o teletrabalho.

Atualmente, a adoção do teletrabalho é obrigatória em todo o país, ao abrigo do estado de emergência. Não é, contudo, a esta situação que este diploma se dirige, uma vez que hoje o trabalho remoto não tem de partir de qualquer acordo entre as partes.

(Notícia atualizada às 13h40)

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