Julgamento de Salgado retoma com última testemunha a ser ouvida

Na nova sessão de julgamento de Ricardo Salgado, no âmbito da Operação Marquês, o suíço Jean-Luc Schneider vai ser ouvido pelo juiz. Decisão final está à vista.

Nesta quinta-feira Ricardo Salgado terá mais uma sessão de julgamento no âmbito do caso que derivou do processo Operação Marquês. Não se sabe se o ex-líder do Banco Espírito Santo (BES) vai comparecer na sessão que terá lugar no Campus da Justiça, em Lisboa.

Apesar da semana de contenção devido à pandemia e do apelo da Ordem dos Advogados para a prorrogação do período de férias judiciais até ao dia 9 de janeiro, a sessão vai decorrer normalmente. Este julgamento estava marcado inicialmente para dia 25 de novembro de 2021, mas atrasou-se devido a um envio de uma carta rogatória para a Suíça que tinha como objetivo ouvir uma das testemunhas de defesa, o suíço Jean-Luc Schneider.

Desta forma, esta quinta-feira Jean-Luc Schneider irá ser ouvido pelo juiz e, posteriormente em data a marcar, deverão ser feitas as alegações finais.

Ricardo Salgado está a ser julgado por três crimes de abuso de confiança relacionados com a Espírito Santo Enterprises, o já conhecido “saco azul” do GES, envolvendo um valor superior a dez milhões de euros. O julgamento está a decorrer de forma autónoma face aos restantes arguidos da Operação Marquês, já que Ivo Rosa, na altura da decisão instrutória, anunciou que iria proceder à separação de processos de Salgado, Vara, Carlos Santos Silva, João Perna e José Sócrates.

Juiz recusou suspender julgamento devido a Alzheimer

Em outubro, o juiz Francisco Henriques não aceitou o pedido da defesa de Salgado para suspender o julgamento, atendendo ao relatório médico que concluía por um diagnóstico de Alzheimer que os advogados apresentaram no dia 12 de outubro ao tribunal. E admitiram que esta doença não é razão suficiente para que “as capacidades de defesa do arguido estejam limitadas de tal forma que o impeçam de se defender de forma plena. Não parece decorrer do teor do atestado médico que o arguido esteja mental ou fisicamente ausente”, explica o despacho do juiz Francisco Henriques, a que o ECO teve acesso.

“A deficiência cognitiva, ou seja, a capacidade de reproduzir memórias, não é de todo impeditiva do exercício do direito de apresentar pessoalmente em julgamento a versão dos factos passados”, argumenta o juiz.

O relatório médico enviado ao tribunal confirmava os “sintomas de declínio cognitivo progressivo”, segundo o médico neurologista Joaquim Ferreira, que assume ainda que “após toda a investigação realizada, podemos agora concluir pelo diagnóstico de doença de Alzheimer”, segundo o relatório do médico.

Um diagnóstico que se tem vindo a agravar nos últimos três meses e que o médico considera irreversível. Porém, o juiz não rejeita este relatório como meio de prova: “Os atestados médicos constituem meios de prova e como tal devem ser valorados pelo Tribunal”, tal como não põe em causa a qualificação da doença de Alzheimer como uma doença neurológica. “Trata-se de matéria factual”, diz o tribunal.

O médico que seguiu o ex-presidente do Grupo Espírito Santo sustenta ainda que “Ricardo Salgado tem apresentado um agravamento progressivo das limitações cognitivas e motoras descritas” desde julho de 2021 e que “o quadro clínico de defeito cognitivo que apresenta atualmente, nomeadamente o defeito de memória, limita a sua capacidade para prestar declarações em pleno uso das suas faculdades cognitivas”. E, por isso, pediram a suspensão ou arquivamento determinados pelo tribunal. Caso não seja possível, os advogados do ex-presidente do GES defendem que “no limite, a execução de qualquer pena de prisão que viesse, eventualmente, a ser determinada (…) teria de ser imediatamente suspensa” perante o diagnóstico de doença de Alzheimer.

Mas os argumentos — mesmo os médicos — não convenceram o juiz Francisco Henriques que defendeu que “a degradação das faculdades cognitivas são consequência natural da longevidade humana. Em regra, o ser humano na faixa etária do arguido sofre de natural decréscimo das capacidades cognitivas”.

O advogado de Ricardo Salgado, Francisco Proença de Carvalho, referiu na altura que não foi o seu cliente que decidiu ter Alzheimer. “Não é o arguido que decide ter Alzheimer. Não foi o Dr. Ricardo Salgado que decidiu ter esta doença nem autolimitar o seu direito de defesa, a sua possibilidade de prestar declarações, é a doença de Alzheimer”, disse.

O advogado disse esperar dos Tribunais “que sejam Tribunais e que não julguem como se estivessem numa rede social, como se estivessem numa caixa de comentários de um tablóide”. “Peço respeito por isso. O Dr. Ricardo Salgado, ao longo dos últimos sete anos, batalhou e tem batalhado pela sua defesa. Infelizmente neste momento aconteceu o que aconteceu, está demonstrado, é inequívoco”, acrescentou, garantindo que a defesa vai “batalhar” pela “demonstração da verdade” e pela “preservação da dignidade humana”.

Três crimes de abuso de confiança

Ricardo Salgado está a ser julgado por três crimes de abuso de confiança. Este tipo de crime é imputado a quem “ilegitimamente se apropriar de coisa móvel ou animal que lhe tenha sido entregue por título não translativo da propriedade”, sendo punido com pena de prisão até três anos ou com pena de multa.

Caso o objeto deste crime seja de valor “consideravelmente elevado” e se “o agente tiver recebido a coisa ou o animal em depósito imposto por lei em razão de emprego ou profissão”, a pena poderá ser de um a oito anos.

Os três crimes do ex-líder do BES estão relacionados com a Espírito Santo Enterprises, o já conhecido “saco azul” do GES, envolvendo um valor superior a dez milhões de euros.

Acusado em novo processo ligado ao universo BES/GES

O Ministério Público (MP) deduziu no final do ano passado uma acusação contra oito arguidos num novo processo associado ao universo BES/GES, entre os quais se encontra Ricardo Salgado. O ex-líder do BES está a ser acusado de, alegadamente, ter corrompido um ex-vice-presidente do Banco do Brasil.

Nesta acusação, estão em causa pagamentos feitos pela offshore Espírito Santo Enterprises de cerca de dois milhões de euros a Allan Simões Toledo, ex-banqueiro brasileiro que, segundo o Observador, está ligado ao PT de Lula da Silva. Segundo a acusação do MP, estes pagamentos terão sido efetuados por ordens de Salgado e teriam como objetivo que o ex-banqueiro brasileiro, alegadamente, exercesse a sua influência enquanto administrador do Banco do Brasil, para que fosse aprovada uma linha de crédito de cerca de 200 milhões de dólares para financiar o BES.

Em comunicado, o Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) sublinha que deduziu acusação contra uma sociedade de advogados e sete pessoas singulares, nomeadamente elementos de entidades financeiras do Grupo Espírito Santo (GES), um elemento da área da gestão de fortunas (GESTAR/ICG) e dois advogados.

O DCIAP referiu ainda que em causa estarão crimes de corrupção ativa com prejuízo do comércio internacional, branqueamento, corrupção passiva no setor privado e falsificação de documento que decorreram entre 2011 e 2014. Estes crimes representaram vantagens num valor superior a 12,2 milhões euros.

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