Da segurança no trabalho à assessoria jurídica. Como é que os fornecedores de RH veem o futuro da gestão de pessoas
Na semana em que a APG revelou os "Melhores fornecedores RH 2022", a Pessoas foi falar com as empresas vencedoras para saber como veem o futuro da gestão de pessoas, e de forma contribuem para ele.
Cada um à sua maneira, os fornecedores de RH assumem um papel fundamental na gestão de pessoas, e o futuro dos recursos humanos também depende deles. Se, por um lado, os fornecedores de segurança e saúde no trabalho são, talvez mais do que nunca, das peças principais do jogo — atualmente deles depende até mesmo o regresso ao escritório –, as empresas que fornecem serviços de formação, coaching e desenvolvimento profissional são também como cruciais, começando desde logo pela necessidade de capacitação para os novos modelos de trabalho remoto e híbrido. E a assessoria jurídica torna-se fundamental para garantir a segurança jurídica e legal neste percurso de transformação. Na semana em que foram anunciados os vencedores da iniciativa “Melhores Fornecedores RH 2022”, promovida pela Associação Portuguesa de Gestão de Pessoas (APG), a Pessoas foi falar com cada uma das empresas distinguidas pela forma exemplar como lidam com estas temáticas.
“Olhando para o atual contexto empresarial, a transformação digital dos RH é uma necessidade real e imperiosa. No entanto, a transformação digital ao nível dos departamentos de RH tem implicações relevantes nas empresas. Esta mudança envolve naturalmente todas as pessoas da empresa, bem como os processos e procedimentos internos”, começa por dizer Ana Cláudia Rangel, responsável pelo departamento de direito laboral da Raposo Bernardo & Associados – Sociedade de Advogados, a única empresa distinguida na categoria de “Serviços de Assessoria Jurídica”.
“A transformação digital permitiu alcançar inúmeros benefícios, entre os quais ao nível da melhoria da produtividade, da automatização dos processos de trabalho, no que respeita a ferramentas inovadoras que permitem inclusivamente a redução do erro e uma maior flexibilidade da realização do trabalho. Mas permanecem alguns desafios que, em alguns casos, ainda precisam de ser ultrapassados, como o investimento que tal implica e a necessidade de atualização constante, dado que são meios em permanente evolução”, salienta.
Assessoria jurídica e segurança e saúde no trabalho. Peças fundamentais no futuro dos RH
É precisamente com as novas formas de comunicação e de trabalho, sustentadas nas novas tecnologias, que emerge a necessidade de uma assessoria jurídica especializada e amplamente preparada para a dar o devido suporte legal à transformação digital e aos desafios e problemas que esta pode implicar. “A internet, a ciência de dados e os canais digitais são catalisadores de novas problemáticas jurídicas, de novas possibilidades de relacionamento e de formas de realizar o trabalho nas empresas, que devem ser juridicamente enquadradas e legalmente asseguradas”, defende Ana Cláudia Rangel.
A internet, a ciência de dados e os canais digitais são catalisadores de novas problemáticas jurídicas, de novas possibilidades de relacionamento e de formas de realizar o trabalho nas empresas, que devem ser juridicamente enquadradas e legalmente asseguradas.
Neste sentido, a assessoria jurídica também precisou atualizar-se, estando assim em condições de contribuir para um futuro digital, prevenindo problemas e, sobretudo, abrindo horizontes lado a lado dos departamentos de gestão de pessoas na exploração de novas plataformas de tratamento de dados, na digitalização da contratação laboral, na interação online ou nas novas formas de realização do trabalho, conferindo sempre a necessária segurança jurídica nesse percurso.
Outro área que fornece serviços aos RH que precisou de atualizar-se rapidamente e que hoje assume uma importância ainda maior é a da segurança e saúde no trabalho. Primeiro foi a necessidade de garantir todas as medidas de segurança para evitar a propagação da Covid-19 entre os colaboradores, agora o desafio de tornar os espaços de trabalho ambientes seguros para o regresso das pessoas e, já se espera outro desafio, não mais pequeno: “conseguir garantir o equilíbrio emocional dos colaboradores”, antecipa Pedro Malpique, diretor comercial e de marketing da Atlanticare, que voltou a vencer o troféu na categoria “Segurança e Saúde no Trabalho”.
“Para isso os serviços de segurança e saúde no trabalho terão um importante contributo a dar, nomeadamente através da avaliação dos riscos psicossociais, da formação em áreas comportamentais e atividades de promoção de saúde e bem-estar nas empresas”, defende.
Garantir bons níveis de saúde, segurança e bem-estar nos locais de trabalho influencia diretamente a própria performance da empresa e sustentabilidade dos negócios. “Revela-se indispensável à manutenção da capacidade de trabalho, à confiança, à motivação e à produtividade dos trabalhadores, aspetos essenciais para o funcionamento, desenvolvimento e competitividade de qualquer empresa”, acrescenta Rute Castanheiro, diretora-geral da Centralmed, que venceu na mesma categoria.
Capacitar para as novas formas de trabalhar
Nesta questão do bem-estar e da saúde mental, os próprios fornecedores de formação assumem um papel fundamental. “A par da formação, do coaching e do desenvolvimento profissional, será necessário incrementar competências inerentes aos novos modelos de trabalho híbrido, prestando especial atenção ao bem-estar dos colaboradores, com foco no well-being, resiliência ou inteligência emocional”, considera Ricardo Martins, diretor-geral da Cegoc, distinguida nesta área, juntamente com a Dynargie, a MTW Portugal, a Olisipo e a Rumos.
“Algumas das disrupções que eram idealizadas a dez anos de distância chegaram bem mais cedo do que o que alguém imaginava. A pandemia forçou o distanciamento entre as pessoas, empurrou o trabalho remoto para organizações que nunca o tinham considerado e até a área da formação foi obrigada a reinventar-se e a encontrar soluções para permitir a continuidade dos planos de formação (os poucos que não foram congelados) e o desenvolvimento dos profissionais e das organizações”, explica Sandra Viegas, diretora comercial da Olisipo.
No caso da Cegoc, os últimos dois anos foram de experimentação. As salas de formação passaram a ser estúdios, o recurso a plataformas digitais colaborativas em contexto de formação diversificou-se… Mas sempre com um único objetivo em mente: “Contribuir para o desenvolvimento crítico de competências e a adaptação de todos num mundo eminentemente digital e em constante mudança”, assegura Ricardo Martins.
Para o futuro dos RH, ganham relevo questões como a flexibilização da força de trabalho, a polivalência e cultura de equipa com feedback e autonomia, os temas de bem-estar, a preparação de chefias para uma liderança ‘à distância’ e as dinâmicas das equipas remotas com o impacto na cultura da organização.
“As pessoas continuam a ter que lidar, cada vez mais, com novos desafios que obrigam ao (re)alinhamento do seu mindset e ao desenvolvimento e aperfeiçoamento das suas competências”, reforça João Barbosa , country manager da Dynargie. “Enquanto existir espaço para o elemento humano nas organizações, a Dynargie sente estar cada vez melhor equipada para intervir no ‘human side of business‘ e, desta forma, apoiar as organizações nos seus processos de transformação e mudança”, acrescenta.
Quanto às novas competências exigidas no mercado de trabalho, João Barbosa acredita que a provocou “uma aceleração brutal na forma como, mesmo na área das soft skills, passámos a olhar para a tecnologia, toda a dimensão digital, de uma forma complementar”.
Jorge Lopes, diretor da Rumos para a área da formação, detalha ainda mais: “Para o futuro dos RH, ganham relevo questões como a flexibilização da força de trabalho, a polivalência e cultura de equipa com feedback e autonomia, os temas de bem-estar, a preparação de chefias para uma liderança ‘à distância’ e as dinâmicas das equipas remotas com o impacto na cultura da organização”.
Temas como a qualificação das pessoas e o desenvolvimento das suas competências digitais, sobretudo com foco na programação, cloud, data & analytics e cybersecurity, vão ganhar importâncias acrescida e até mesmo decisiva, prevê Jorge Lopes.
Adapta-se quem recruta, mas também quem é recrutado
Ao nível do recrutamento, a pandemia acabou por abrir uma oportunidade para a criação de novos postos de trabalho, obrigando as empresas a repensar as suas estratégias. “A pandemia e as alterações que da mesma resultaram apenas vieram ditar que mercados, setores e posições passaram a ser foco em Portugal e no mundo, e que posições passaram previsivelmente a ter menos potencial a médio e longo prazo”, começa por dizer Miguel Almeida, lead operations manager – specialized recruitment da Kelly Services.
“A área do recrutamento e seleção terá sempre um papel crucial no processo de integração de novo capital humano nas empresas, que deve ser feito de forma profissional, isenta, com base numa amostra de candidatos significativa e com recurso a variadas fontes de pesquisa de profissionais no mercado, que garantam um recrutamento com o menor risco possível para as empresas. O futuro será sempre pensado estrategicamente na adaptação e otimização de todo este processo”, continua o manager, representando uma das vencedoras da categoria “Recrutamento, Seleção, Avaliação de Competências e Outplacement”.
De igual forma, o mundo digital e o foco cada vez maior na dinâmica virtual vieram obrigar as empresas a uma adaptação dos seus processos de recrutamento. As entrevistas migraram para o ecrã e até mesmo, pelo menos durante os períodos de confinamento obrigatório, os processos de onboarding ficaram à distância de um clique. Mas, apesar de fisicamente (e momentaneamente) mais distantes, abriram-se portas a que diversas plataformas e meios digitais otimizassem a sua dinâmica no mercado, e que possíveis profissionais passassem a estar mais ativos neste meio, o que, explica Miguel Almeida, tem resultado num aumento cada vez maior de candidatos e acesso eficaz a estes excelentes profissionais.
“Caminhamos para um modelo híbrido, assente na flexibilidade laboral, em que se avaliam performances e não horas e local de trabalho. No fundo empresas mais rentáveis e colaboradores mais felizes. Uma das mudanças mais prementes é a utilização da tecnologia de vídeo para realizar entrevistas, pelo que um dos desafios é e será adaptar a abordagem ao modelo remoto”, acredita o diretor-geral da Michael Page, Álvaro Fernández. “É também preciso ter muito cuidado com a integração”, acrescenta.
Ao nível das lideranças, Álvaro Fernández acredita que promover a autonomia dos colaboradores e definir indicadores de atividade concretos será essencial para gerir equipas de uma forma adaptada às circunstâncias. Também a comunicação, orientada à confiança e proximidade e não ao controlo do colaborador, será uma competência que as chefias não devem descurar.
Caminhamos para um modelo híbrido, assente na flexibilidade laboral, em que se avaliam performances e não horas e local de trabalho. No fundo empresas mais rentáveis e colaboradores mais felizes.
“À medida que o trabalho remoto ou híbrido se torna cada vez mais a norma, é muito importante que os colaboradores continuem a sentir-se ouvidos e acompanhados. Continuará a ser fundamental recorrer às ferramentas para continuar a partilhar experiências e trabalhar em equipa, virtualmente. Utilizar videoconferências ou o email para reconhecer publicamente esforços e resultados ajudará os colaboradores a sentirem que o seu trabalho é valorizado e que são parte da equipa”, sugere o diretor-geral da Michael Page, distinguida na categoria que diz respeito ao recrutamento.
Por outro lado, depois do reinado das competências técnicas, as competências comportamentais ganham destaque, sendo cada vez mais importantes na seleção de talento. Soft skills como resiliência, flexibilidade, trabalho em equipa ou orientação para resultados são valorizadas mais do que nunca, assim como a capacidade de inovar e a criatividade. “Trata-se de encontrar soluções para novos problemas”, refere. Ao mesmo tempo, as competências digitais, serão “um requisito praticamente imprescindível para trabalhar num ambiente cada vez mais online”.
Olhando para a área do trabalho temporário, na qual a Success Work mereceu distinção, António Duarte, administrador da empresa, acredita que o trabalho temporário e as empresas especializadas em RH têm um papel fundamental no contexto atual.
“Vivemos momentos conturbados e de incerteza em termos económicos. Ainda a recuperar de uma pandemia, o mundo vê-se agora a braços com uma guerra na Ucrânia. Para além da crise humanitária, deparamo-nos novamente com uma crise em termos económicos, resultante em parte pela subida do preço da energia. No âmbito dos recursos humanos, é necessário que as empresas efetuem um planeamento rigoroso das suas estratégias tendo em consideração o panorama atual. Acreditamos que nesse campo, o trabalho temporário e as empresas especializadas no setor dos RH sejam parceiros estratégicos de bastante relevância”, defende.
“Além disso, devemos ter em consideração que o mercado de trabalhou sofreu alterações nos últimos dois anos. Hoje em dia, é exigido pessoas mais resilientes, autónomas e com sentido crítico. A inteligência emocional revela-se cada vez mais essencial e imperativa. Aliado a tudo isso, é necessário ter em conta a burocracia que advêm da contratação de um novo recurso humano”, resume António Duarte.
Consultoria para “alinhar” quem “não fala a mesma linguagem”
Para fazer a ligação entre departamentos diferentes, mas que precisam — mais do que nunca — de estar sintonizados, está a consultoria. “Consegue alinhar departamentos que não falam a mesma linguagem, desde gestão a recursos humanos até ao marketing e comunicação. Pilares do futuro de uma cultura interna que se requer que seja de (re)aprendizagem constante”, diz Sara Batalha, CEO da MTW Portugal.
Mas os grandes impactos da consultoria no mercado estão relacionados com o “boost na rendibilidade sustentável das empresas”, a “melhoria da estabilidade” e a “identificação de oportunidades de negócio e de progressão de carreira”.
O maior desafio para o futuro, acredita Sara Batalha, é “estar disposto a recomeçar, renovar e reaprender todos os dias, bem como inspirar a nossa equipa para viver em desconforto e crescimento”. Assim, a consultoria, sendo o “trusted advisor” será capaz de ajudar as empresas a navegar num futuro incerto e num ritmo de transformação acelerado.
“A área de consultoria vai contribuir, decisivamente, para o futuro dos RH das organizações pois tem, cada vez mais, uma importância estratégica para o desenvolvimento do negócio. Em particular, no que respeita a procurement consulting, será de esperar um sustentado investimento na especialização e desenvolvimento dos seus RH”, salienta Sofia Quelhas, consultora e formadora da OnSynergy, que venceu, juntamente com a MTW, na categoria de “Consultoria”.
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