COP27 precisa de “pacto histórico” entre os países mais ricos e mais pobres
Os países ricos têm de assinar “um pacto histórico” do clima com os países mais pobres, ou “estaremos condenados”, afirmou o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres.
A 27ª Conferência das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas de 2022 (COP 27) começa, este domingo, em Sharm el-Sheikh, no Egito. O desafio é grande. Para já, as ações em curso não permitem cumprir com as metas acordadas em Paris, de conter o aquecimento global abaixo dos 2 graus centígrados (°C), e preferencialmente não exceder o limiar dos 1,5°C, indica o recentemente publicado “Emissions Gap Report 2022” do Programa das Nações Unidas para o Ambiente. Ao passo atual, o mundo caminha para uma subida da temperatura média de 2,8°C.
Neste cenário, os grandes temas para a COP27, tal como descritos pelo país anfitrião, são a mitigação, adaptação, o financiamento e a colaboração para colmatar a crise climática. Em todas as frentes, está em causa a aliança entre países mais ricos e os mais pobres, que será essencial para alcançar os objetivos globais. Os países ricos têm de assinar “um pacto histórico” do clima com os países mais pobres, ou “estaremos condenados”, afirmou o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres.
Na última cimeira, em Glasgow, o texto final notava “com preocupação” que o financiamento climático para medidas de adaptação “continua a ser insuficiente” e incitava os países desenvolvidos a duplicar o financiamento até 2025.
Em 2009, os países mais ricos, e que beneficiam financeiramente do investimento nos combustíveis fósseis que contribuíram para a crise climática, comprometeram-se a alocar 100 mil milhões de dólares para ajudar os países mais vulneráveis a adaptar e mitigar os riscos das alterações climáticas, e a investir na transição energética e na redução de emissões de dióxido de carbono (CO2). Mas esse valor nunca foi atingido. “Ainda não chegámos lá“, referiu o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres.
A associação ambientalista Zero, num comunicado enviado às redações, considera o valor como “inadequado, injusto e problemático”. “Os países desenvolvidos têm de compensar a falta de entrega dos 100 mil milhões a tempo”, garantindo um montante global coletivo de, pelo menos, 600 mil milhões de dólares para o período 2020-2025, com 50% desse valor a ser alocado à adaptação”, apelam.
A realidade está muito longe daquilo que se estima ser necessário. No Adaptation Gap Report 2022, o relatório do Programa das Nações Unidas para o Ambiente (PNUA), lançado a 1 de novembro, os custos anuais de adaptação para os países em desenvolvimento são estimados entre os 160 mil milhões de dólares e os 340 mil milhões de euros, até 2030. Estas verbas têm tendência a aumentar até 2050 e, só se os objetivos de Paris forem concretizados, é que poderão entrar numa trajetória descendente. No mesmo documento, relata-se que os países em desenvolvimento receberam 29 mil milhões de dólares em 2020, 4% acima dos níveis de 2019.
Além do financiamento climático, será importante concretizar o fundo Perdas e Danos (Loss and Damage), destinado a cobrir mais diretamente os prejuízos imediatos de catástrofes agravadas pelas alterações climáticas, como ciclones, cheias, ondas de calor ou vagas de frio, as quais implicam necessidades de reconstrução de habitações, infraestruturas, fornecimento de abrigo ou alimentos para as vítimas.
“Penso que a COP 27 vai ser bastante dominada pela questão das Perdas e Danos, que visa proteger os países mais vulneráveis das consequências das alterações climáticas“, explica Filipe Duarte Santos, presidente do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável (CNADS) ao ECO/Capital Verde, referindo a título de exemplo os países mais dependentes da agricultura — cujo nível de produção “diminui em situação de cheias ou de seca” –, ou os insulares, no Índico e no Pacífico, estão perante “um problema existencial”: “com a subida do nível do mar torna-se impossível viver naquelas ilhas que estão assentes em recifes de corais que são muito baixos e, portanto, facilmente inundáveis”, explica o responsável e investigador na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.
“Não restam dúvidas de que estamos na era das Perdas e Danos causadas pelas alterações climáticas, e esta COP será decisiva em termos de estabelecer um Mecanismo de Financiamento para Perdas e Danos que seja robusto, justo e adaptado às necessidades das populações mais afetadas” considera a Zero.
Na mesma nota, a associação ambientalista defende ser “crucial que se aplique o princípio do poluidor-pagador e se efetive a justiça climática”, sobretudo quando as últimas notícias dão conta de que, pelo menos, “seis empresas de combustíveis fósseis ganharam o suficiente para cobrir os custos dos maiores eventos climáticos e meteorológicos extremos nos países em desenvolvimento”. “O financiamento está lá, mas os maiores responsáveis pela crise ainda não pagaram”, sublinham.
O ministro do Ambiente, Duarte Cordeiro, vai representar Portugal na COP 27. Em entrevista à Lusa, o ministro reconhece que esta conferência é intercalar, no sentido de prolongar o diálogo estabelecido na COP 26, mas considera que isso não lhe retira importância. Quanto a compromissos da parte de Portugal e da União Europeia, Cordeiro aponta para a reafirmação daqueles já existentes, rejeitando quaisquer recuos. No sentido de avançar na concretização, o Governo está a estudar a possibilidade de reforçar os 4 milhões de euros por ano que tem reservados para responder aos desafios de mitigação e adaptação. “Não fazer nada é caminhar para a catástrofe ambiental”, sublinhou o ministro.
A Comissão Europeia terá também uma presença alargada no evento, com a presidente Ursula von der Leyen e vários comissários a participar no evento. A expectativa do bloco europeu é que a conferência sirva para que os líderes mundiais “demonstrem o compromisso” na causa climática. Será também o espaço para “convencer os maiores emissores do mundo a agirem urgentemente e mais rapidamente no corte das emissões poluentes”, lê-se num comunicado publicado pela entidade. Numa das linhas de ação, o apoio aos países em desenvolvimento, a UE espera que outros países aumentem a contribuição – a UE já entrega a mais larga contribuição, de 23 mil milhões de euros em 2020 e 2021.
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