SNS aposta na natalidade: vai pagar mais a profissionais e investir em blocos de parto

  • Lusa
  • 5 Janeiro 2023

Será atualizado o valor pago por exames de pré-natal e de exames ligados à área da infertilidade. Governo irá ainda disponibilizar 10 milhões para a requalificação de blocos de parto.

O valor que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) paga pelos exames de diagnóstico pré-natal e dedicados à Procriação Medicamente Assistida (PMA) vai subir, uma medida que pretende incentivar à fixação de profissionais no SNS.

“Vamos atualizar o valor nos exames de pré-natal (ecografias, por exemplo) e de exames ligados à PMA (área da infertilidade). Estamos a falar de atualizações extremamente significativas. O objetivo é aumentar a capacidade de resposta para as utentes e a atração de médicos que possam fazer esses exames no SNS”, disse o diretor da Direção Executiva do SNS (DE-SNS), Fernando Araújo.

Reconhecendo que tem havido muitas limitações nos hospitais na realização destes exames, situação que motiva frequentemente queixas de grávidas e de médicos de família, e que os valores atualmente praticados tinham vários anos, não sendo competitivos quando comparados com o que o setor privado pratica, Fernando Araújo avançou que “no caso das ecografias, há valores que crescem 200 a 500%”.

“A capacidade de pagarmos melhor vai fixar médicos no SNS que podem fazer este tipo de exames após o horário normal de trabalho, em produção adicional, e receber dessa forma por cada exame que façam. Para as utentes representa mais capacidade de resposta”, descreveu o diretor. A portaria que define os novos preços será publicada nos próximos dias.

No que diz respeito a exames ligados à PMA, os novos valores poderão beneficiar não só médicos, como biólogos, psicólogos, enfermeiros, entre outros profissionais. “Estamos a olhar para os preços, interpretando o mercado. Se não seria algo meramente administrativo. Aumentávamos 10% ou 15%, que é o normal, mas o certo é que continuaríamos sem capacidade de resposta porque os preços estavam longe da realidade”, descreveu Fernando Araújo.

Em entrevista à agência Lusa, o diretor da DE-SNS disse que além de cativar médicos “de forma diferenciada”, esta medida permite a criação de Centros de Responsabilidade Integrados (CRIS) nesta área, dar resposta aos utentes, fomentar a formação e ter equipas mais reforçadas para as urgências e para os blocos de partos.

“Há médicos que gostam de fazer diagnóstico pré-natal, especializaram-se nisso, e outros são da PMA, e vão poder trabalhar grande parte do tempo na área que mais os realiza e dar apoio em outras, como nos blocos de partos”, explicou.

Recusando referir-se a esta atualização da tabela de preços como “aumento da despesa” do SNS, Fernando Araújo frisou que encara a medida como um investimento, estando expectante em relação à adesão dos profissionais. “É provável que, neste primeiro ano, tenhamos aumento de despesa de um a dois milhões de euros apenas para recursos humanos”, referiu.

A procura por PMA tem sido crescente, até porque dados nacionais e internacionais mostram que a infertilidade no mundo ocidental tem aumentado, razão pela qual também o SNS português se debate com listas de espera que são variáveis conforme o procedimento recomendado a cada caso.

A infertilidade é, aliás, reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como um problema de saúde pública mundial, que afeta significativamente a esfera da saúde individual, a dimensão relacional, os direitos humanos e a integração social. “Estima-se que 15% a 20% dos casais em idade reprodutiva sofram de infertilidade”, lê-se na nova portaria do Governo de atualização de preços, à qual a Lusa teve acesso.

Além deste fator, a Covid-19 atrasou processos, porque obrigou os hospitais a privilegiar o tratamento de doenças agudas e emergentes, algo que com esta medida a DE-SNS quer reverter.

Temos de aumentar espaços e equipas”, disse Fernando Araújo, sem esconder que em Portugal também existe uma “enorme assimetria” de resposta a nível geográfico. “Um casal não pode depender do código postal para ter uma resposta”, afirmou.

Quanto à possibilidade de replicar esta medida a outras áreas do SNS para cativar profissionais, Fernando Araújo foi direto: “Poderemos pagar de forma diferenciada em áreas em que haja mais necessidade”.

Governo disponibiliza 10 milhões para requalificar blocos de partos

O Governo vai lançar uma linha de financiamento de 10 milhões de euros para requalificação de blocos de partos, obras a executar este ano mediante candidatura das unidades hospitalares, avançou esta quinta-feira Fernando Araújo.

O despacho que definirá as regras para atribuição de financiamento será publicado “nos próximos dias”, acrescentou o líder da Direção Executiva do Serviço Nacional de Saúde (DE-SNS).

“Existem blocos de partos do SNS com várias dezenas de anos nunca intervencionadas. As condições, quer de humanização de cuidados, quer de segurança para os profissionais, têm limitações e constrangimentos e temos de as melhorar”, referiu.

Fernando Araújo anunciou o investimento de 10 milhões de euros, uma medida que se enquadra, disse, na estratégia que está a ser levada a cabo no país de melhoramento das condições assistenciais dadas às grávidas no SNS. “Quando falamos em blocos de partos e olhamos para fechos e quando falamos de escalas de equipas, devemos também ver que há um conjunto de estratégias e medidas que estão a ser delineadas para, em conjunto, trazer mais capacidade de resposta ao SNS”, disse.

Já no despacho, ao qual a Lusa teve acesso, lê-se que esta linha de financiamento surge no âmbito da criação da Comissão de Acompanhamento da Resposta em Urgência de Ginecologia/Obstetrícia e Bloco de Partos que foi criada em junho do ano passado. O despacho é acompanhado do Regulamento do Programa de Incentivo Financeiro à Qualificação dos Blocos de Parto do SNS.

As obras a realizar terão de ser efetuadas durante 2023 e serão privilegiados os locais que tenham piores condições. “Esta é uma medida emblemática. É a primeira aposta específica em blocos de partos em muitos anos”, considerou Fernando Araújo.

Convidado a dar exemplos práticos que podem resultar desta medida, o médico contou que visitou o Hospital de Santa Maria, em Lisboa, um “hospital diferenciado e com profissionais excelentes”, mas que tem “um bloco de partos com 50 ou 60 anos”. “Isso em nada beneficia os cuidados de saúde que sofreram uma enorme evolução nas últimas décadas. Temos de apostar seriamente nas requalificações”, acrescentou.

Outro exemplo dado foi o do Hospital do Algarve que tem, considerou Fernando Araújo, “condições muito complexas”.

Mas, salvaguardando que esta linha de financiamento é para todo o país, o diretor da DE-SNS referiu que as candidaturas terão de ser apresentadas pelos conselhos de administração dos hospitais e que sabe já que alguns têm “projetos feitos e ideias para melhorar, mas faltava-lhes capacidade de investimento”.

Fernando Araújo espera receber propostas ainda este mês e no início de fevereiro, prometendo “respostas muito céleres”.

Os 10 milhões de euros advêm do Orçamento do Estado. Questionado se este valor chega para fazer face a todas as necessidades, Fernando Araújo disse apenas: “Para as necessidades mais urgentes é um valor extremamente interessante”.

Segundo Fernando Araújo o modelo de candidaturas por iniciativa dos próprios hospitais insere-se na lógica de “dar autonomia e responsabilidade” aos conselhos de administração. A melhoria dos blocos de partos serve, ainda, para ir ao encontro das exigências cada vez mais atuais que as futuras mães têm na hora de ter um filho.

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