Limite de crédito para a compra de casa aumenta até 18% com alívio da taxa de esforço do Banco de Portugal

O corte em 50% da taxa de esforço para aceder ao crédito à habitação vai permitir às famílias obter até mais 18,4% de crédito junto do banco para comprar casa face ao que acontece hoje.

O Banco de Portugal quer tornar a contratação de crédito à habitação mais acessível. Foi nesse sentido que, na sexta-feira, anunciou um alívio de 50% da taxa de esforço que é aplicada sobre a taxa de juro dos empréstimos à habitação. Se até agora os bancos aplicavam um “teste de stress” de 3% sobre a taxa de juro contratualizada no crédito à habitação, a partir de outubro essa “pressão” passa para 1,5%, no caso dos empréstimos a mais de 10 anos.

Para as famílias com crédito à habitação, essa mudança tem pouco ou mesmo nenhum significado, pois com esta folga não se traduz numa redução da prestação ou em qualquer outra alteração do contrato. Mas para quem está à procura de casa, o alívio do Banco de Portugal irá traduzir-se numa maior margem de manobra na negociação do empréstimo à habitação que, segundo cálculos do ECO, poderá traduzir-se num montante de financiamento até 18,4% superior ao valor que poderá ambicionar atualmente.

Por exemplo, uma família com um rendimento médio disponível de 2.768 euros por mês (média do país), sem outros créditos bancários, contratualizasse hoje um crédito à habitação pelo prazo de 32 anos indexado à Euribor a 12 meses e um spread de 1,1% (perfil típico dos créditos à habitação realizados em 2022), poderia obter um financiamento até 187 mil euros, por forma a cumprir o limite de 50% da taxa de esforço — calculada através do rácio debt service-to-income (DSTI), exigido pelo Banco de Portugal no âmbito das medidas macroprudenciais que estão em vigor desde 1 de julho de 2018.

No entanto, em breve, como resultado do alívio da “taxa de stress” que o regulador pretende colocar em prática a partir de setembro, poderá contar com um crédito até 217 mil euros (mais 16,4%), mantendo o limite do DSTI abaixo dos 50%, e desde que cumpra todos os outros requisitos exigidos pelo Banco de Portugal pelo próprio banco.


O impacto na carteira das famílias é considerável e aumenta quando mais largo for o prazo do contrato do empréstimo bancário.
Se em vez de ter uma maturidade de 32 anos o crédito à habitação fosse feito a 40 anos (limite máximo permitido, desde que os mutuários não tenham mais de 30 anos no momento da celebração do contrato), o montante que o banco estaria disponível a emprestar aumentaria 18,4% face aos valores atuais, passando de 194 mil euros para 229 mil euros.

Naturalmente que os montantes de financiamento variam consoante o rendimento das famílias, mas os aumentos percentuais sobre o limite de crédito como resultado do alívio da taxa de esforço proposto pelo Banco de Portugal são os mesmos, assumindo para o efeito a celebração de um crédito à habitação indexado à atual taxa Euribor a 12 meses e um spread de 1,1%. Caso seja tido em conta uma taxa de juro e um spread mais baixo, o incremento do limite de crédito será maior, e menor caso a taxa de juro e o spread sejam maiores.

Segundo os nossos números, 74% dos processos acabaram por não avançar devido aos limites impostos pelo Banco de Portugal e desse número mais de metade (cerca de 56%) seriam aprovadas com a taxa de stress fixada a 1,5%”, revela João Melo do ComparaJá.

João Melo

Diretor de crédito habitação do ComparaJá

Crédito à habitação com margem para aumentar

Apesar da contínua subida das taxas de juro, o crédito à habitação não está a abrandar. Pelo contrário: desde o início do ano que o montante de novos empréstimos à habitação tem registado taxas homólogas médias de 7%. Segundo dados do Banco de Portugal, com exceção do mês de abril, que registou uma contração homóloga de 4% face a abril de 2022, todos os outros meses tiveram aumentos anuais — maio e junho contabilizaram mesmo subidas homólogas de quase 9%.

É certo que em termos de stock, o crédito à habitação está a abrandar, somando atualmente cerca de 99,45 mil milhões de euros de crédito, o valor mais baixo desde junho do ano passado. Mas isso deve-se, em larga medida, ao aumento dos reembolsos antecipados dos créditos. Por isso, o mercado de crédito à habitação está longe de estar em crise e a necessitar de estímulos para o revitalizar. Mas é justamente isso que anteveem a maioria dos intermediários de crédito à habitação contactados pelo ECO, como resposta ao alívio da taxa de esforço por parte do Banco de Portugal.

“É possível que a concessão do crédito aumente sem que o ritmo da procura sofra uma alteração significativa”, refere João Melo, diretor de crédito habitação do ComparaJá, que trabalha com 13 instituições bancárias, notando que “é seguro afirmar que esta medida não fará com que as pessoas procurem mais a solução do crédito, mas fará com que os bancos concedam o crédito mais facilmente.

A mesma expectativa é partilhada por Hugo Pinheiro, CEO da Credível, um intermediário de crédito à habitação que trabalha com 12 bancos, que considera que a medida do regulador “vem ajudar e peca por tardia”, notando que, apesar de não antecipar um aumento substancial na concessão de crédito “vai permitir que clientes que até agora só conseguiam ir à taxa fixa possam novamente considerar a solução de taxa variável.

Rui Bairrada, CEO do Doutor Finanças, um intermediário de crédito à habitação que tem parcerias com 11 instituições financeiras, nota também que mais do que visar um aumento da concessão de crédito para a compra da casa, a folga do Banco de Portugal vai “garantir que as famílias com condições financeiras não são penalizadas por uma medida que estava desajustada à realidade de hoje.”

Essa realidade é sentida por todos os intermediários financeiros, notando que, nos últimos seis meses, foram muitas as propostas que não avançaram por conta da aplicação de um “teste de stress” de 3% que poderiam ter chegado a bom porto caso o teste de esforço tivesse ficado pelos 1,5%, como propõe agora o Banco de Portugal para créditos a mais de 10 anos.

“Segundo os nossos números, 74% dos processos acabaram por não avançar devido aos limites impostos pelo Banco de Portugal e desse número mais de metade (cerca de 56%) seriam aprovadas com a taxa de stress fixada a 1,5%“, revela João Melo do ComparaJá.

A mesma barreira é notada pela Twinkloo, um intermediário financeiro conta com parcerias com 12 bancos. “Estimamos que aproximadamente 20% dos créditos não foram aprovados por falta de capacidade dos clientes em cumprirem o rácio de taxa de esforço/DSTI“, revela fonte oficial da empresa ao ECO.

Para os bancos e para as famílias, o alívio da taxa de esforço proposto pelo Banco de Portugal são boas notícias. Recorde-se que as medidas macroprudenciais do Banco de Portugal foram colocadas em prática numa altura em que as taxas de juro estavam em valores negativos e num ambiente de menor restritividade dos critérios de concessão de crédito por parte das instituições financeiras.

Atualmente, nenhuma dessas condições de mercado persiste: as taxas de juro deixaram de estar em valores negativos e negoceiam em máximos de quase 15 anos; e a gestão do risco por parte dos bancos é mais apertada. E, por essas razões, tanto os intermediários de crédito à habitação como os próprios bancos aplaudem a medida do Banco de Portugal.

Mas é também muito importante haver prudência por parte das famílias na utilização de crédito e dos bancos na sua concessão, para não abrir a porta a situações de sobre-endividamento como se assistiu no passado.

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