Aumento das visitas da ACT pode prejudicar qualidade da inspeção, avisa sindicato

Os inspetores do trabalho têm "elevado espírito de missão", mas o aumento das visitas pretendidas pela ACT poderá "levar a uma diminuição da qualidade do trabalho", adianta sindicato ao ECO.

A Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) quer fazer mais dez mil visitas inspetivas em 2024 do que fez no último ano e pretende que sejam abrangidos mais 100 mil trabalhadores do que em 2023, mas o sindicato que representa os inspetores está reticente quanto à sustentabilidade dessas metas. Ao ECO, Carla Cardoso, presidente do Sindicato dos Inspetores do Trabalho (SIT), alerta que essa “exigência numérica” poderá resultar mesmo numa “diminuição da qualidade do trabalho“.

O SIT não pode, obviamente, concordar com esta medida de exigência, uma vez que tal acarreta para os inspetores do trabalho um aumento significativo de trabalho“, sublinha a sindicalista, que acrescenta que, ano após ano, tem aumentado o objetivo de visitas inspetivas.

Assim, ao ECO, Carla Cardoso garante que os inspetores do trabalho têm “um elevado espírito de missão” e “têm consciência da importância do seu papel na regulação das relações de trabalho”, mas avisa que, “a continuar este aumento de exigência numérica, poderá levar a uma diminuição da qualidade do trabalho“.

“Não é uma medida que nos surpreenda. No entanto, este aumento nunca tem em consideração o trabalho já acumulado por cada inspetor, nem em termos quantitativos nem em termos de complexidade”, atira Carla Cardoso.

A sindicalista destaca ainda que o trabalho inspetiva “não é apenas proceder à visita ao local de trabalho“, mas também analisar as “matérias subjacentes” e os respetivos documentos, bem como “efetuar procedimentos e tratamento administrativos”, ir a tribunal, fazer ações de sensibilização e atuar no contact center da ACT.

De acordo com o balanço feito recentemente pela inspetora-geral, Fernanda Campos, a ACT conta, neste momento, com 455 inspetores, um número expressivo face ao registado noutros anos, mas abaixo do total de postos de trabalho previstos neste âmbito (493).

Com estes quadros, em 2023 a ACT fez cerca de 40 mil visitas inspetivas, cumprindo a meta que tinha fixado. No total, foram visitadas 28 mil entidades empregadoras (acima do objetivo de 26 mil empresas) e abrangidos 300 mil trabalhadores (abaixo da meta de 350 mil indivíduos).

Já para 2024, Fernanda Campos anunciou ter a “proposta muito ambiciosa” de chegar às 50 mil visitas inspetivas, ou seja, mais dez mil que em 2023, o equivalente a uma subida de 25%.

Quanto às entidades intervencionadas, o objetivo é cobrir 35 mil do que em 2023, isto é, mais sete mil (cerca de 25%) do que no ano passado. “Temos a certeza que a equipa consegue fazer“, garantiu a inspetora-geral, salientando que a ACT quer ampliar o seu radar e dar respostas “assertivas e competentes”.

Já no que diz respeito aos trabalhadores abrangidos, a meta é chegar a 400 mil indivíduos, mais 100 mil do que em 2023 (e apesar de a meta do último ano não ter sido cumprida).

De acordo com Fernanda Campos, um dos grandes focos da ação da ACT foi o trabalho nas plataformas digitais. Entre junho e dezembro, os inspetores identificaram 2.609 “alegados prestadores de serviços” relativos a 16 plataformas.

Foram desencadeadas mais de mil notificações, mas as plataformas recusaram integrar esses estafetas. Resultado: até ao momento, já chegaram ao Ministério Público quase 900 participações. Cabe agora a essa entidade, “nos termos legais, impulsionar a ação de reconhecimento da existência de um contrato de trabalho”.

Em reação a estes dados, a ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, deixou claro: “Não podemos permitir que as novas formas de trabalho sejam velhas formas de escravatura“. Também o secretário de Estado do Trabalho, Miguel Fontes, comentou estes dados, sublinhando que “há espaço para as plataformas”, mas é preciso que respeitem as boas práticas.

Da parte das plataformas, tem chegado a mensagem de que estão a cumprir a lei e que esta não proíbe o trabalho independente, modelo que dizem ser de muitos dos estafetas, que procuram flexibilidade e autonomia.

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