Das pensões aos apoios parentais, direitos sociais dos advogados variam na Europa
Um estudo da FBE analisou os direitos sociais dos advogados. Alemanha, Bélgica, Espanha, França, Itália, Países Baixos, Polónia, Reino Unido, República Checa e Roménia são os países participantes.
Os direitos sociais dos advogados variam nos vários países europeus. Esta conclusão é do estudo da Fédération des Barreaux d’Europe (FBE), que analisou esses direitos junto das diversas Ordem dos Advogados . As jurisdições participantes foram Alemanha, Bélgica, Espanha, França, Itália, Países Baixos, Portugal, Polónia, Reino Unido, República Checa e Roménia. Apesar das conclusões relativas a Portugal não estarem no documento.
“A maioria dos ordenamentos jurídicos não dispõe de disposições legais específicas para o tratamento dos prazos judiciais durante a licença parental ou por doença. Os advogados têm muitas vezes de arranjar substitutos ou pedir adiamentos, sendo a Espanha uma exceção, onde as diligências processuais e os prazos legais são assegurados durante a licença parental”, refere o relatório.
Outra das conclusões do estudo é sobre o regime de pensões. Entre as várias jurisdições existe uma grande mistura entre regimes privados e públicos. Por exemplo, no país vizinho, em Espanha, o tipo de regime de pensão depende do facto de os profissionais estarem inscritos no regime geral ou mutualista.
“O cálculo das quotizações varia consoante se trate de um sistema de segurança social ou de uma mutualidade. No sistema de segurança social, o cálculo é efetuado com base na base regulamentar e nos anos de contribuição. No seguro mútuo, os membros constroem as suas pensões com base nas suas contribuições”, lê-se.
Em Espanha, todos os advogados, quer sejam trabalhadores assalariados ou independentes, devem estar cobertos por um sistema de segurança social. Para os advogados assalariados, o Regime Geral de Segurança Social é o padrão, sendo a empresa responsável pela inscrição. Os advogados independentes podem escolher entre o RETA e as mutualidades de segurança social alternativas, que oferecem uma cobertura complementar mas não substituem o regime de segurança social.
Também na Alemanha, existe um regime de pensões mistas, sendo as contribuições calculadas, atualmente, em 18,6% do salário bruto, até ao limite máximo de contribuição atual de 4.987,50 euros. Já em Itália, os advogados têm uma pensão pública “especial”. Esta é composta por duas partes: quota base, que é calculada segundo o critério retributivo; e quota modular, calculada com base no método contributivo.
Na Bélgica, os advogados estão sujeitos ao regime público de pensões, “à semelhança de outros trabalhadores independentes”. “As contribuições para o regime de pensões fazem parte da quotização para a segurança social, que corresponde normalmente a 20,5% do rendimento líquido, com um mínimo de 875 euros por cada três meses”, lê-se no estudo. As pensões são pagas a partir dos 67 anos e o seu montante depende da duração da carreira, variando entre 1.700 euros e 2.125 euros para uma carreira completa de 45 anos.
Já na Roménia existe um regime de pensões para advogados e as contribuições são calculadas com base nos montantes pagos em função do ano de atividade e de um valor por defeito. Por outro lado, na República Checa não existe um regime especial de pensões, aplicando-se as regras gerais aos advogados, tal como os Países Baixos.
Outro dos países em análise é a França. Em terras francesas, todos os advogados devem contribuir obrigatoriamente para a organização Caisse Nationale des Barreaux Français (CNBF), que faz parte da caixa nacional de seguro de velhice das profissões liberais. Estas contribuições são efetuadas para o regime de base do CNBF e assumem três formas diferentes: honorários advocatícios ou uma contribuição equivalente; uma quotização fixa – progressiva e que atinge 1.774 euros a partir do sexto ano de atividade jurídica -; e uma contribuição baseada nos rendimentos profissionais.
“A licença de maternidade e a presença de filhos contam para o cálculo da pensão. As contribuições efetuadas durante os períodos de licença de maternidade e a presença de filhos são tidas em conta no cálculo das prestações de pensão da advogada. Assim, tanto a duração da licença de maternidade como a responsabilidade pela educação dos filhos são reconhecidas como fatores que contribuem para o direito à pensão de uma advogada”, referem.
Na Polónia os advogados estão cobertos pelo regime público de pensões, que abrange os trabalhadores independentes e os assalariados. As contribuições são calculadas com base em declarações individuais para os trabalhadores por conta própria e com base no salário e nas contribuições para a segurança social para os trabalhadores por conta de outrem.
Por fim, no Reino Unido, os advogados independentes contribuem para o seguro nacional de categoria 2 ou de categoria 4. “Podem verificar as contribuições e os créditos para garantir os anos de qualificação para a pensão do estado”, referem. Segundo o estudo, o montante da pensão varia entre 93,50 euros e 169,50 euros, em função das quotizações. Os advogados independentes podem também contribuir para os regimes privados de seguro de maternidade e de reforma.
Em Portugal, os advogados descontam para a Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores (CPAS). Uma vez que os advogados não descontam para a Segurança Social – e é a única classe profissional que tem um regime de previdência autónomo – estes profissionais não têm direito aos apoios do Estado. Atualmente, os advogados pagam por mês no mínimo 277,76 euros.
Direitos e licenças parentais
Em termos de direitos e licenças parentais, a maior parte das jurisdições concede licença parental, variando a duração e os valores pagos. “A duração da licença parental e os níveis de indemnização variam significativamente. A Itália oferece cinco meses com uma indemnização de 80%, enquanto a Bélgica oferece 12 semanas com um subsídio semanal. Em contrapartida, a licença alargada da Roménia oferece 85% do rendimento líquido médio durante dois anos”, explicam.
Das jurisdições em análise é na República Checa que a licença parental remunerada é de maior duração, uma vez que os pais poderem requerer o subsídio durante um período máximo de três anos. “Um progenitor pode receber uma prestação máxima de 300.000 CZK, que pode aumentar para 450.000 CZK no caso de gémeos ou nascimentos múltiplos” referem.
Também a Roménia é um dos países com uma licença com maior duração. Os advogados têm uma licença parental remunerada durante dois anos. “O subsídio mensal corresponde a 85% do rendimento líquido médio obtido nos últimos 12 meses dos últimos dois anos anteriores à data de nascimento da criança”, explicam. A licença é paga pelo Estado e pela Caixa de Previdência dos Advogados, que paga um subsídio mensal de 1,048 RON, cerca de 211 euros.
Já na Alemanha, os advogados o período de licença parental remunerada é de 14 meses, máximo de 12 meses por pessoa e mínimo de dois meses por pessoa. É o Estado que paga as prestações que podem ascender a 67% do último salário durante 12 meses (de 300 euros a 1.800 euros por mês).
No Reino Unido o subsídio de maternidade para advogados independentes é pago durante 39 semanas, no máximo. Mas para ser elegível é necessário um registo de autoavaliação durante 26 semanas nas 66 semanas anteriores ao nascimento do bebé. O montante, que está isento de imposto, varia entre 27 e 172,48 libras por semana, com base nas contribuições para o seguro nacional de classe 2. No entanto, o subsídio de maternidade Sure Start em terras britânicas, um apoio local, é pago uma vez, no valor de 500 libras.
Com cerca de cinco meses cada, está a Itália e a Polónia. Na bota da Europa, os advogados têm direito a uma licença parental remunerada que inclui dois meses antes do parto e três meses pós-parto. Assegurada pela Organização Nacional de Segurança Social dos Advogados, a prestação recebida é um subsídio único igual a 80% de 5/12 do rendimento profissional líquido produzido no 2.º ano anterior ao nascimento da criança.
Também na Polónia a licença de maternidade para as mães tem a duração de 20 semanas, enquanto os pais têm direito a duas semanas. Existe ainda a alternativa da licença parental partilhada de 41 semanas. O subsídio é calculado com base nas taxas de segurança pagas ou no salário, variando as especificidades em função das circunstâncias individuais. “Estas prestações são concedidas através do sistema público de segurança social”, explicam.
Já em Espanha, os profissionais, independentemente do regime, têm direitos parentais. As mães biológicas têm direito a 16 semanas de licença, com seis semanas obrigatórias imediatamente após o nascimento e 10 semanas voluntárias nos primeiros 12 meses de vida da criança. No âmbito do sistema de Segurança Social, é atribuído um subsídio equivalente a 100% da base regulamentar. Já no âmbito da Mutualidad de la Abogacía, as prestações variam em função da situação, com montantes máximos específicos.
“Tanto o sistema de segurança social como as mutualidades partilham a responsabilidade pelo pagamento das prestações. O Instituto de Segurança Social assegura a gestão das prestações do regime geral. As companhias de seguros mútuos são responsáveis pelas prestações do regime mútuo”, referem.
Nos Países Baixos as mães têm quatro meses de licença e os pais cinco semanas. O montante é pago pelo Estado. Por outro lado, na Bélgica o período de licença parental remunerada é de 12 semanas. As prestações, que são pagas pelo sistema nacional de pensões, ascendem aos 800 euros por semana, sem impostos.
Por fim, em Franca, os advogados independentes têm direito a uma licença de maternidade que está sujeita a condições específicas. Assim, para terem um subsídio têm de gozar pelo menos oito semanas de licença de maternidade, incluindo seis semanas de licença pós-natal. Se esta condição não for cumprida, não há lugar a indemnização.
Segundo o estudo, a duração máxima da licença de maternidade é de 16 semanas, das quais seis semanas antes da data prevista para o parto (licença pré-natal) e 10 semanas depois. No entanto, esta duração pode variar em função de circunstâncias específicas. O outro progenitor também pode gozar a licença, suspendendo o trabalho durante quatro a cinco semanas.
“A licença de maternidade das juristas é coberta pelo regime geral de seguro de doença. A compensação inclui duas componentes: ajudas de custo diárias e um subsídio fixo. As ajudas de custo diárias são calculadas com base no rendimento anual do advogado. Se o rendimento anual do advogado for inferior a um determinado limiar, aplica-se um subsídio diário mais elevado”, lê-se.
Ainda assim, existem certas garantias para as advogadas. Durante e após a maternidade, os seus contratos não podem ser rescindidos devido à gravidez, exceto em caso de violação grave das regras profissionais não relacionada com a maternidade. Além disso, o contrato de trabalho da advogada com a sociedade não pode ser rescindido antes de decorridas oito semanas após o seu regresso ao trabalho após a licença de maternidade.
E em caso de doença?
Bem, em caso de doença, há uma tendência geral para a concessão de subsídios, variando a duração e compensação. Nos Países Baixos, os advogados têm direito a dois anos de baixa por doença com 100% do salário no primeiro ano e 70% no segundo. “As entidades patronais devem seguir etapas específicas; em caso de incumprimento, são aplicadas sanções”, refere o relatório.
Já na Alemanha, onde todos os advogados são obrigatoriamente membros da caixa de pensões dos advogados, os profissionais podem requerer uma pensão por invalidez profissional. O subsídio ou baixa depende do valor pago à caixa de pensões. Mas para os trabalhadores por conta de outrem, o subsídio de doença ascende a 70% do salário.
Tanto na Roménia, como em Espanha, os advogados tem direito a licença. Na Roménia o montante corresponde a 75% da soma dos rendimentos brutos dos 12 meses anterior à ocorrência do risco dividido por 12 e é pago pela Caixa de Previdência dos Advogados. Em Espanha, as prestações variam em função do motivo, com percentagens e subsídios específicos.
Na Polónia a duração dos subsídios por doença pagos pode prolongar-se até 182 dias, estando o montante da prestação dependente das contribuições para a segurança social. “O montante do subsídio de doença do empresário depende da base de cálculo das quotizações. O segurado pode declarar qualquer base de quotização, mas esta não pode ser inferior à base mínima de quotização ZUS aplicável às empresas. Em 2023, esta base ascende a 4.161,00 zlotys (cerca de 1.000 euros)”, lê-se. A base de cálculo do subsídio de doença é a base de cálculo média das contribuições dos últimos 12 meses, reduzido por um índice de 13,71%.
A Bélgica dá apoio em caso de doença, mas o primeiro mês de baixa não é pago, variando a indemnização entre os 46 e 76 euros por dia, consoante o estatuto familiar. Já na República Checa esse apoio pode ser requerido a partir do 15.º dia da incapacidade temporária, com uma duração máxima de 380 dias. Assim, durante as duas primeiras semanas de incapacidade, a entidade patronal paga uma indemnização salarial.
Por fim, na Itália, os advogados têm direito a um subsídio de doença, mas este aplica-se principalmente a doenças graves e a grandes cirurgias e baseia-se no último rendimento anual do doente. “A duração e o montante do subsídio de doença dependem da gravidade e da previsibilidade da doença. O advogado em situação de incapacidade total e permanente é apoiado por uma pensão especial”, explicam.
Do luto à quebra de rendimento
No que concerne a situações de queda abrupta de rendimentos, nem todos os países têm apoios disponíveis. Espanha, Bélgica, Roménia e Alemanha são alguns dos que não preveem qualquer tipo de apoio. Ainda assim, na Bélgica os advogados podem pedir uma isenção do pagamento da contribuição para a segurança social, que é normalmente de 20,5% do rendimento líquido, com um mínimo de 875 euros por cada três meses.
Em contraponto, na Itália os advogados podem receber um apoio financeiro que consiste num pagamento único, geralmente concedido em caso de graves dificuldades económicas. Também na República Checa a contribuição pode atingir o triplo da taxa de base do salário mínimo mensal fixado pela legislação. Já nos Países Baixos, todos os cidadãos têm direito a uma prestação mínima de segurança social, cerca de 1.200 nett por mês para os indivíduos e 1.700 nett para os agregados familiares com duas pessoas.
Na Polónia os advogados podem pedir apoios, mas através de um seguro privado. “As Ordens de Advogados podem também prestar assistência financeira em situações de emergência, financiada pelas contribuições dos advogados para a Ordem”, referem.
No caso de morte de um familiar próximo, apenas a Alemanha e a Polónia não preveem qualquer tipo de apoio. Já países como Itália, Bélgica, Roménia, República Checa e Países Baixos ajudam os profissionais.
Por exemplo, na Bélgica, em caso de morte de um familiar próximo, os advogados podem receber 100 euros por dia, durante um máximo de 10 dias, se houver uma paragem total da atividade. Na Roménia, o valor pago ascende aos 1.511 euros.
“A resolução da Ordem dos Advogados checa prevê uma contribuição social única para cobrir as despesas de funeral de um advogado ou estagiário jurídico falecido”, refere o relatório.
Reação da Ordem dos Advogados portuguesa
O estudo apresentado lança luz sobre uma realidade: “a posição da advocacia portuguesa em termos de direitos sociais é notavelmente inferior em comparação com os seus homólogos europeus. Este estudo destacou, em particular, a singularidade do sistema português, onde a existência de uma caixa de previdência privada, a CPAS, não garante aos advogados os mesmos direitos sociais disponíveis para os trabalhadores independentes”, refere comunicado da bastonária, Fernanda de Almeida Pinheiro. Embora nas conclusões não haja qualquer referência ao regime português.
“Contrastando com sistemas existentes em países como Espanha e Alemanha, onde mesmo em regimes de segurança social privados, são assegurados direitos essenciais como apoio na doença e parentalidade, Portugal destaca-se, na negativa, pela ausência destes direitos fundamentais”, diz o mesmo comunicado.
Perante esta disparidade, “a Ordem dos Advogados Portugueses reitera o seu firme compromisso em encontrar a equidade e justiça para a nossa classe. Estamos empenhados em promover ações concretas e em trabalhar ativamente com as autoridades competentes, tanto a nível nacional como europeu, para assegurar que os advogados portugueses recebam o tratamento justo e digno que merecem”, conclui.
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