Empresários “amarram” Pedro Nuno à sobrevivência do próximo Governo de direita
Empresários dramatizam entendimentos ao centro para conferir estabilidade a um Executivo minoritário liderado por Luís Montenegro. Aplicação dos fundos europeus e atração do investimento preocupam.
Assustados com os resultados das eleições legislativas, que fazem perspetivar para os próximos meses a continuação do cenário de instabilidade política com que têm lidado nos últimos meses, a maioria dos empresários ouvidos pelo ECO defende que a viabilização do próximo Governo liderado por Luís Montenegro e, em particular, a negociação dos Orçamentos do Estado, deve ser assegurada preferencialmente com o Partido Socialista, “amarrando” Pedro Nuno Santos à sobrevivência do Executivo minoritário de centro-direita.
O presidente da Associação das Empresas Familiares, Peter Villax, aponta que Montenegro vai ter de mostrar “competência” e “fazer tudo certo — aumentar o PIB de forma sustentada para aumentar salários e fortalecer o Estado Social”. Sem maioria no Parlamento, o empresário “preferiria que a viabilização fosse feita em parceria com um partido com experiência e tradição de poder (PS), em vez de um partido vocalmente anti poder (Chega)”.
Preferiria que a viabilização fosse feita em parceria com um partido com experiência e tradição de poder (PS), em vez de um partido vocalmente anti poder (Chega).
Peter Villax, que a 21 de março vai ser substituído neste cargo associativo por José Germano de Sousa, lembra que anteriores moções de censura e rejeições de Orçamentos acabaram por beneficiar eleitoralmente o partido visado e, portanto, “o PS deverá ser muito cauteloso na sua relação com o PSD”. Assim como o Chega. “Não espero que o PS ou o Chega queiram, para já, ser fonte de instabilidade no governo da Aliança Democrática. (…) Quem deita governos abaixo paga sempre um custo elevado”, resume.
“Defendemos preferencialmente entendimentos ao centro, ainda que não preconizemos, de forma nenhuma, qualquer espécie de bloco central. Preferimos estabilidade e entendimentos ao centro, mas não sabemos se o atual PS estará disponível para esse efeito. De qualquer modo, o ónus será do PS e do Chega. Só se ambos se unirem o executivo da AD será impedido de governar”, concorda o vice-presidente executivo da AIMMAP (industriais da metalurgia e metalomecânica), aconselhando Pedro Nuno Santos a adotar uma “postura colaborante”.
Depois de ter afirmado e reafirmado que “não é não”, Montenegro “não tem quaisquer condições para coligações ou acordos com o Chega”, pois “perderia totalmente a credibilidade”. Rafael Campos Pereira, porta-voz do setor mais exportador da economia portuguesa — vendeu mais de 24 mil milhões de euros no estrangeiro em 2023 – entende que “há condições para que o novo Governo faça o seu trabalho, pelo menos, até ao final do ano”. Nesse período “terá de governar bem, com ministros competentes e credíveis, no sentido de tentar mobilizar o mais possível todos aqueles que agora exerceram votos de protesto”.
Preferimos estabilidade e entendimentos ao centro, mas não sabemos se o atual PS estará disponível.
“Bom senso e sentido de Estado” é o que pedem também os patrões minhotos, sublinhando que “o momento do país impõe máxima responsabilidade política a todos”, o que incluiu a “obrigação política de ter esse espírito aberto” para negociar a viabilização do documento orçamental. Qual deve ser a postura do PS, agora na oposição e liderado por Pedro Nuno Santos? “Responsabilidade política e respeito democrático, ou seja, ser parte crítica, mas construtiva de estabilidade, que é o que o país necessita neste momento”, responde Ricardo Costa, presidente da Associação Empresarial do Minho e do grupo bracarense Bernardo da Costa.
A poucos quilómetros, em Vila Nova de Famalicão, o presidente da gigante têxtil Riopele, que emprega mais de 1.000 pessoas, confia que as dificuldades de governação terão de ser ultrapassadas, pois “situações de renúncia e não entendimentos não levam a lado nenhum” e “Portugal precisa de andar para a frente”. “Quem ganhou foi a AD e o PS terá de tentar colaborar em termos de governação do país. Não podemos ir novamente a eleições”, dramatiza José Alexandre Oliveira.
Quem ganhou foi a AD e o PS terá de tentar colaborar em termos de governação do país. Não podemos ir novamente a eleições.
Insistindo que “as pessoas que foram eleitas têm de encontrar um entendimento, até porque o país tem que avançar”, o líder da histórica indústria têxtil fundada em 1927 e especializada em tecidos para coleções de moda e de vestuário traça um paralelismo com o mundo empresarial. “Muitas vezes nas empresas temos problemas em atingir os objetivos a que nos propomos e fazemos entendimentos e conseguimos resolver as nossas situações. Por isso, os políticos não devem fincar o pé e negar acordos, isso prejudica o futuro do país”, expõe José Alexandre Oliveira.
Luís Miguel Guimarães, outro grande industrial do setor do têxtil e vestuário, antevê igualmente como “muito difícil ou quase impossível” que haja condições de governação e de aprovação de Orçamentos do Estado, sobretudo depois de ouvir Pedro Nuno Santos dizer na noite eleitoral que pretendia “fazer oposição à séria”. E por ser um governo de curto prazo, o líder da Polopiqué acha que Montenegro vai ter também “dificuldade em arranjar gente capaz” para integrar o Executivo, sabendo que “à partida estão condenados a estar meia dúzia de meses” no cargo.
“Isto é mau para o país. Para a indústria e para os serviços públicos como a educação e a saúde, que precisam de reformas estruturais sérias. Infelizmente, os políticos não pensam. Se não houver um entendimento com o PS e se o PS não se abrir a esse entendimento, é impossível que o Governo de Luís Montenegro tenha hipóteses de se aguentar e teremos novas eleições” em breve, desabafa o empresário de Santo Tirso.
Infelizmente, os políticos não pensam. Se não houver um entendimento com o PS e se o PS não se abrir a esse entendimento, será impossível o Governo de Luís Montenegro aguentar-se.
Esta segunda-feira, em declarações à TSF, o ex-Presidente da Assembleia da República, Eduardo Ferro Rodrigues, disse que “é preciso dar tempo” ao líder da AD para conduzir o Governo e a Pedro Nuno Santos “para reconstruir a esquerda”. O antigo líder socialista desaconselha pressas aos dois maiores partidos, acreditando que “combater a extrema-direita não se faz em poucos meses”. Também Augusto Santos Silva defende a negociação entre PS e PSD em matérias essenciais, dando o exemplo da área da Justiça.
Fundos prioritários para economia
Sem perspetivas de estabilidade política, face à reduzida margem de vantagem obtida pela coligação de direita em relação ao PS, as associações patronais pedem que seja dada prioridade à execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e ao Portugal 2020 e 2030.
“Qualquer que seja o contexto, o país precisa de equilíbrio. Numa conjuntura tão delicada como a que enfrentamos essa necessidade é ainda maior”, argumenta Luís Miguel Ribeiro. Para o presidente do conselho de administração da AEP, a “instabilidade política afetará a economia em diversos aspetos, designadamente ao nível de uma menor celeridade na execução dos fundos europeus e de uma desconfiança dos investidores, condicionando a atratividade do país na captação de investimento, nacional e estrangeiro”.
A instabilidade política afetará a economia ao nível de uma menor celeridade na execução dos fundos europeus e de uma desconfiança dos investidores.
Luís Miguel Ribeiro reconhece que, face aos resultados eleitorais, “as condições de partida não são as ideais e podem não oferecer a robustez que a economia nacional necessita”. Lembra que a “diferença entre o primeiro e o segundo partido, ambos de distintos quadrantes políticos, não é significativa, pelo que as condições de governação serão um contínuo desafio“.
Sem querer avançar com cenários de entendimentos ou coligações, Luís Miguel Ribeiro realça que “é com séria preocupação que a AEP olha para a situação da economia portuguesa, num período que coincide com a aplicação da maior dotação de fundos europeus“. “É preciso contar com uma envolvente favorável ao bom desenvolvimento da atividade empresarial, onde as corretas políticas públicas de curto, médio e longo prazos são fundamentais”, defende.
Também para a Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), “o mais relevante será que a instabilidade política decorrente da ausência de uma maioria parlamentar expressiva não coloque em causa a prossecução dos objetivos anunciados pelos principais partidos para a promoção da competitividade das empresas e o crescimento económico e da produtividade, tendo em conta as necessidades do país”.
João Vieira Lopes, presidente da CCP, refere ainda que “em tudo o que necessite de aprovação parlamentar — e em particular para as necessárias alterações em matéria fiscal ou ao Orçamento do Estado em vigor –, terão necessariamente de existir acordos pontuais ou compromissos maioritários que, em função do novo quadro parlamentar, serão muito provavelmente de geometria variável em função das propostas em aprovação”.
"Temos a expectativa de que os objetivos de incentivar o crescimento económico manifestado pelos dois principais partidos se mantenham vivos ao longo da próxima legislatura e que sejam encontradas soluções que permitam desenvolver a economia.”
“Para as empresas, que preferem a estabilidade e a previsibilidade para a prossecução da sua atividade, esta não será obviamente a situação mais desejável”, continua. Mas procurarão “adaptar-se à nova conjuntura, como sempre o têm feito nas diferentes circunstâncias”. Esta segunda-feira, na ressaca eleitoral, o ministro das Finanças, Fernando Medina, rejeitou um bloco central, mas admitiu entendimentos pontuais com PSD.
“A CCP tem, assim, a expectativa que os objetivos de incentivar o crescimento económico manifestado pelos dois principais partidos se mantenham vivos ao longo da próxima legislatura e que sejam encontradas soluções que permitam desenvolver a economia e, em particular, recuperar vários atrasos na concretização dos vários projetos com fundos europeus, de que são exemplo o PRR e o Portugal 2030″.
O ECO contactou também a CIP – Confederação Empresarial de Portugal, mas a organização presidida por Armindo Monteiro por não se quis pronunciar antes dos resultados finais das eleições, já com os votos dos círculos da emigração.
Esta preocupação é partilhada por César Araújo, presidente da Associação Nacional das Industrias de Vestuário e de Confeção (ANIVEC) e CEO da Calvelex, que emprega 600 trabalhadores. Antecipa uma “governação muito difícil”. Espera que “as instituições financeiras façam o seu caminho independentemente das políticas”, realçando o papel de entidades como a AICEP, IAPMEI e o COMPETE na implementação dos fundos europeus. “É importante que essas instituições consigam não atrasar ou pôr em causa o país e a economia”, atira.
Quanto ao novo Governo diz que “é preciso dar tempo à política para ela se reorganizar — e que essas instituições façam o seu papel”. Quanto ao papel do Chega refere que o crescimento de partidos “muito radicais” em Portugal e na Europa não é positivo para a economia. Mesmo assim, “o país precisa de fazer uma grande reflexão: o Chega obteve quase 20% dos votos e isso é muito preocupante“.
A perspetiva de dificuldades em ter um Governo estável e a eventualidade de novas eleições deixa os empresários do turismo na expectativa, com um sentimento de incerteza.
No setor do turismo, o presidente da Confederação do Turismo de Portugal (CTP), Francisco Calheiros, mostra-se apreensivo com um eventual adiamento da decisão sobre o novo aeroporto face ao cenário “incerto” de governabilidade que resultou das eleições legislativas. “Algo que seria muitíssimo prejudicial para o turismo e para o país”, afirma Francisco Calheiros, numa nota enviada às redações em que antecipa um “panorama político incerto em termos de governabilidade e estabilidade”.
“Num momento de grande incerteza internacional, com as conhecidas consequências económicas e sociais, a perspetiva de dificuldades em ter um Governo estável e a eventualidade de novas eleições, deixa os empresários do turismo na expectativa, com um sentimento de incerteza, que em nada beneficia a atividade turística”, refere a confederação.
Espero que o futuro do país se possa sobrepor a ideologias políticas ou à falta de consenso entre esquerda e direita. Espero que venha a acontecer, pelo menos em algumas políticas, esse acordo entre PSD e PS.
Para o diretor da ColchaoNet, Luís Fialho, “não vai ser fácil o próximo Executivo aplicar o seu programa, uma vez que estamos com um Parlamento muito dividido, embora com uma maioria à direita”. “Mas uma direita que já deu informação que não vai ser possível um entendimento para governação”, acrescenta o empresário, esperando que os dois maiores partidos se entendam “pelo menos para algumas políticas que permitam alterar o rumo do país”.
“Espero que o futuro do país se possa sobrepor a ideologias políticas ou à falta de consenso que, à partida, não permitiriam um acordo entre a esquerda e a direita”, aponta Luís Fialho. “Espero que seja possível e que venha a acontecer, pelo menos em algumas políticas, esse acordo entre PSD e PS“, remata o empresário.
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