O papel da Arbitragem Tributária em debate

  • ADVOCATUS
  • 19 Março 2024

Vários especialistas reuniram-se, no passado dia 12 de março, para discutirem os resultados de um estudo, desenvolvido pela Lisbon Public Law, sobre a Arbitragem Tributária em Portugal.

No dia 12 de março realizou-se uma conferência no estúdio do ECO, com o objetivo de debater o papel da Arbitragem Tributária em Portugal, que juntou vários especialistas para partilharem as suas opiniões sobre os resultados de um estudo sobre a Arbitragem Tributária, realizado pela Lisbon Public Law.

Este estudo foi coordenado por Carlos Blanco de Morais, professor Catedrático da Faculdade de Direito de Lisboa e Coordenador Científico do Lisbon Public Law, que apresentou, no início da sessão, os quatro eixos de investigação da análise: “O primeiro tinha a ver com a seleção dos árbitros, os critérios de escolha, para garantir a imparcialidade e a independência dos árbitros face ao regime que vincula o CAAD. O segundo visava comparar as decisões dos tribunais tributários estaduais com as dos tribunais arbitrais, tendo em conta um conjunto de dados relacionados com o número e o sentido dos recursos. O terceiro pretendia avaliar o impacto das decisões dos tribunais arbitrais noutras jurisdições, na Autoridade Tributária, e, também, no Tribunal de Justiça da UE. O quarto baseou-se em saber se a arbitragem institucionalizada na área tributária implicou algum desinvestimento na jurisdição estadual“.

O professor catedrático partilhou, ainda, algumas conclusões do estudo. Uma delas afirma que “o CAAD, comparativamente a outros centros de arbitragem voluntária, tem um regime particularmente reforçado, seja por via legal, seja através do código deontológico, e é, até, mais exigente em matéria de impedimentos”. Outra diz ainda que, “quanto à designação dos árbitros, o sistema inspira-se um pouco no que toca ao algoritmo, no caráter aleatório, que também está presente na distribuição de processos pelos juízes dos tribunais administrativos e fiscais. Isto, obviamente, que limita, em parte, a escolha dos árbitros pelas partes, e, por isso mesmo, a percentagem de árbitros escolhidos pelas partes, na totalidade da escolha da designação dos árbitros, é relativamente baixa”.

Ainda dentro das conclusões, o mesmo estudo verificou, também, que “o CAAD incorpora, em matéria de impedimentos, muitas das diretrizes da International Bar Assotiation (IBA), sobretudo no que toca às listas vermelhas, o que mostra que também está um pouco up-to-date relativamente a essa matéria de investimentos“.

Quais as recomendações do estudo?

A consolidação de critérios normativos em matéria de impedimentos foi uma das recomendações do estudo. “Efetivamente, há uma certa dispersão de critérios, tanto no regime jurídico de arbitragem tributária, como no código deontológico. Eu penso que, até para efeitos de pedidos de escusa, de revelação, era importante haver uma consolidação, num único instrumento, de critérios, porque isso pode ser relevante, quer para a ação do conselho deontológico, mas, sobretudo, para os próprios árbitros. Este processo de consolidação seria particularmente importante por razões de segurança e de certeza jurídica e, dentro deste processo de consolidação, seria também oportuno que algumas das decisões que foram tomadas pelo conselho deontológico, e que têm um caráter mais construtivo e mais inovador, figurassem também o critério dessa decisão”, disse Carlos Blanco de Morais.

“Também no processo de consolidação, não seria de menos tentar ajustar as regras em matéria de impedimentos às outras listas do IBA, nomeadamente as listas laranja. E, para isso, entre outras sugestões, consideramos que a representação da Autoridade Tributária por parte de um árbitro que tenha um vínculo duradouro relativamente à mesma autoridade, deveria, se ultrapassasse dois anos com consecutivas designações, dar origem a um dever de revelação por parte do próprio e, até, de impedimento, se a outra parte se manifestar em sentido contrário”, continuou.

Outra recomendação apontada pelo estudo é o dever de revelação, “no caso de o árbitro ser designado mais de cinco vezes em dois anos, pela mesma parte, e de impedimento, caso essa designação respeite a questões da mesma natureza jurídica e com o mesmo objeto de litígio e, também, um impedimento no caso de, num período de três a cinco anos, o mesmo árbitro ter sido designado pela parte mais de 15 vezes, independentemente do objeto do litígio, dado que importaria promover a diversificação dos árbitros“.

“Em particular, quanto ao árbitro presidente, nós sustentamos a necessidade de haver uma lista com numerus clausus de 15 a 18 árbitros, que possa limitar a designação dos árbitros existentes a uma lista que tenha sido aprovada pelo Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais. Depois, quer o regime jurídico da arbitragem tributária, quer o código deontológico do CAAD, preveem fundamentos para a cessação de um mandato de um árbitro. Nós entendemos que, perante situações em que haja um árbitro que falte reiteradamente a deveres de cuidado ou viole disposições normativas aplicáveis, que não cumpra prazos de decisão, que manifeste várias vezes uma indisponibilidade injustificada para o exercício de funções, que tenha sido objeto de afastamento em mais do que um caso, eventualmente, poderia aplicar-se um novo mecanismo que permitisse a sua exclusão da lista. Caberia ao conselho deontológico fazê-lo, através de um reexame da lista de árbitros, de quatro em quatro anos, baseada em critérios que têm de estar positivos e, depois, competindo à direção do CAAD tomar uma decisão em relação ao afastamento ou não desses mesmos árbitros”, acrescentou.

O professor catedrático considerou, ainda, a hipótese de se estabelecerem limitações às renúncias de árbitros, “isto porque, muitas vezes, há renúncias que são, por vezes, um pouco levianas, ou que dão origem a algum incómodo ou excesso de zelo. É importante, quando se aceita ser árbitro, mesmo que haja oposição de uma das partes, a partir do momento em que se entende que não existem razões para se duvidar da imparcialidade, não deve haver renúncias demasiado fluidas ou demasiado fáceis“.

O CAAD em análise

Depois da primeira intervenção de Carlos Blanco de Morais, seguiu-se um painel de debate, moderado por Filipa Ambrósio, editora da Advocatus, cujo tema foi “O CAAD em análise”. Deste debate fizeram parte Carla Castelo Trindade, professora da Faculdade de Direito da Católica e árbitra presidente na área da arbitragem fiscal; Sérgio Vasques, professor da Faculdade de Direito da Católica e ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais; e Tânia Carvalhais Pereira, professora da Faculdade de Direito da Católica e coordenadora do departamento jurídico do CAAD.

De acordo com os oradores do debate, uma das grandes vantagens do CAAD face aos tribunais estaduais, é a sua celeridade na resolução dos processos. “O tempo médio é de quatro meses e meio. Portanto, a celeridade é o grande argumento da arbitragem. Eu diria que a qualidade das decisões também é uma vantagem, no sentido em que, tendencialmente, os árbitros presidentes são juízes, ou juízes jubilados, ou pessoas com uma formação de doutoramento em direito fiscal, jurídico-económico. Portanto, pelo menos numa decisão de primeira instância, eu diria que os dois grandes argumentos são celeridade e a qualidade das decisões“, começou por dizer Carla Castelo Trindade.

A mesma opinião foi partilhada por Sérgio Vasques, que afirmou: “Os números que são compilados pelo CAAD e que constam neste estudo mostram-nos que os contribuintes têm vindo a recorrer maciçamente à arbitragem. Temos 800 a 900 processos novos por ano e isso significa que a arbitragem vingou junto dos contribuintes pela celeridade, que permite não só uma decisão rápida, mas o acesso rápido às instâncias europeias, ao Tribunal de Justiça da UE. E foi uma solução de sucesso porque permitiu trazer para dentro do sistema pessoas que têm uma experiência e um background diferentes dos colegas que estão nos tribunais judiciais. Não é um background melhor, mas é uma experiência de vida diferente, são pessoas que passaram pela consultoria, pela advocacia, pelo mundo académico. E julgo que uma coisa e outra têm feito da arbitragem uma experiência de sucesso, o que não nos deve dispensar de ter sobre ela um juízo crítico e de ir aperfeiçoando aquilo que sintamos que não está tão bem”.

Esta procura dos contribuintes pelo CAAD poderá ser justificada pelo facto de serem os contribuintes que mais ganham na arbitragem, o que, de acordo com Tânia Carvalhais Pereira, deve-se ao recurso à arbitragem ter sido construído como um exercício de direito protestativo dos contribuintes. Portanto, “o contribuinte, quando decide recorrer à arbitragem, é porque, eventualmente, já existe um sentido de decisão, já existe uma decisão no Tribunal Superior e, na formação da sua decisão de recorrer à arbitragem, tem uma expectativa maior de haver vencimento“.

Falta de meios

Ainda assim, Carla Castelo Trindade revelou que “não tem havido o investimento necessário para fazer face à demanda que representa o contencioso tributário em Portugal. A arbitragem, sendo um direito protestativo dos contribuintes, é a alternativa à impugnação judicial. E, portanto, parte do conselho que é dado pela equipa de advogados que acompanha os contribuintes direcionarem-nos para os tribunais judiciais ou para a arbitragem“.

Por sua vez, Sérgio Vasques explicou que, “no que toca a arbitragem fiscal, estamos além daquilo que a Europa faz. Somos os pioneiros para o bem e para o mal, e esta experiência tem suscitado o interesse de colegas tributaristas de outras jurisdições. É claro que para se implementar um sistema deste tipo é preciso um certo conserto político e um acordo de vontades que nem sempre é fácil”.

Neste ponto, Tânia Carvalhais Pereira partilhou, ainda, que o CAAD tem participado em vários projetos de investigação a nível internacional: “De facto, somos um exemplo que está a ser estudado a nível internacional. Nós temos participado num estudo internacional do Instituto Internacional de Direito Tributário da Universidade de Viena, onde temos colaborado dando a nossa perspetiva, e uma das questões que, por acaso, foi abordada nessa reunião foi que a arbitragem é uma das formas mais céleres, se não a mais célere, de aceder ao tribunal de justiça da UE. Portanto, Portugal tem sido pioneiro na arbitragem tributária, mas também tem sido estudado a nível internacional“.

Contudo, uma das grandes falhas que Portugal teve neste percurso, segundo Sérgio Vasques, “foi a de não construir um sistema de justiça eficiente. Eficiente e capaz de responder às necessidades dos cidadãos, dos contribuintes, dos investidores e dos operadores económicos. A arbitragem é uma peça disso, não é um puzzle inteiro. Mas, olhando para diante, não tenho dúvidas que temos de repensar a justiça fiscal, a justiça tributária no seu conjunto, e fazer os melhoramentos possíveis dentro do sistema de arbitragem, eventualmente alargando o âmbito de incidência objetiva de arbitragem, revendo o regime dos recursos”.

“É-nos solicitado todos os dias que certifiquemos o trânsito em julgado das decisões, mas os recursos não são apresentados no CAAD e os tribunais superiores não têm a obrigação de comunicar a admissão do recurso, ainda que o façam. Apenas se prevê no regime a obrigatoriedade das partes comunicarem, mas não há nem nenhum prazo nem nenhuma sanção. E isso coloca-nos um problema complexo, sobretudo agora que houve o alargamento da possibilidade de recurso para o Supremo quando haja oposição entre duas decisões arbitrais. Às vezes, as pessoas até acham que é má vontade nossa, que não queremos certificar o trânsito em julgado da decisão, quando não é de todo. Para nós seria muito mais fácil que os recursos fossem apresentados no CAAD. A lei já foi alterada três vezes e ainda não se conseguiu corrigir esse aspeto. Portanto, a minha prioridade aqui é que essa questão seja resolvida”, referiu Tânia Carvalhais Pereira.

Investimento nos tribunais tributários estaduais

Depois deste primeiro debate, José Duarte Coimbra, assistente convidado da Faculdade de Direito de Lisboa e investigador do Lisbon Public Law, fez uma breve apresentação, na qual se focou, exclusivamente, em responder à seguinte questão: “Como as coisas correm muito bem e muito rápido no CAAD, pode-se assumir, em tese, que o Estado deixa de investir na justiça tributária tradicional?”.

“Nós centramos a nossa análise naquilo que podem ser consideradas medidas de investimento na justiça administrativa e tributária, especialmente na tributária, de 2011 em diante. E a resposta que nós obtivemos foi que o funcionamento célere e eficiente da justiça tributária arbitral não provocou uma falta de investimento na justiça tributária estadual“, começou por dizer o investigador.

José Duarte Coimbra fez uma análise em três eixos – ao nível da estrutura institucional; dos recursos humanos; e das reformas legislativas. No que diz respeito à estrutura institucional, “num plano mais macro, pouca coisa mudou desde 2011. A justiça tributária estadual continua a ser composta como era à data de início da atividade do CAAD, por uma estrutura tripartida em três instâncias, que congrega, no total, 19 tribunais – 16 de base; dois tribunais centrais; e um Supremo Tribunal Administrativo – e, nestes últimos dois casos, com as respetivas secções de contencioso tributário. Mas a verdade é que, no quadro desta estrutura constitucional, algumas coisas foram feitas, especificamente na justiça tributária, onde o Estado acabou por criar equipas extraordinárias de recuperação e de liquidação – primeiro, em 2011, com objeto limitado à litigância tributária e em processos de valor superior a um milhão de euros, depois, em 2018, para a totalidade da jurisdição para a recuperação de processos anteriores a 2012″.

“Em 2019/2020 foi finalmente cumprida uma antiquíssima promessa legislativa de especialização no âmbito da jurisdição administrativa e tributária, com a criação de juízes mais especializados em matéria de execuções e de contraordenações tributárias. Mais recentemente, essa especialização foi alargada à segunda instância, aos tribunais centrais administrativos Norte e Sul e, ainda mais recentemente, foi prevista, mas ainda não concretizada, a criação de um terceiro tribunal de segunda instância, que será o futuro Tribunal Central Administrativo Centro. Ainda neste plano, destaco a reformulação por completo do modelo de gestão e de presidência dos tribunais administrativos e fiscais, sobretudo a partir de 2019, com a criação das zonas geográficas e a nomeação de presidentes para cada uma dessas zonas. E, também, a concretização de uma antiquíssima promessa, que era a da consagração formal e efetiva da autonomia orgânica e financeira do Conselho Superior dos Tribunais Administrativos, que apenas foi cumprida em 2023, com a aprovação do respetivo diploma orgânico”, acrescentou.

No plano dos recursos humanos, foram analisados vários parâmetros: “Em primeiro lugar, quanto aos concursos de ingresso de juízes na jurisdição, eles são verdadeiramente incomparáveis porque, inexplicavelmente, a partir daquele momento refundador de 2004, houve como que um esquecimento da jurisdição e, portanto, o número de ingressos de 2004 a 2011 é bastante inferior àquele que se verificou de 2011 em diante, sobretudo a partir de 2014. Sendo que, a partir de 2016, os concursos de ingresso nos centros judiciários passaram a ter uma cadência. Disso resulta que, até 2011, em novos concursos, tinham sido abertas 100 vagas, enquanto de 2011 em diante, não contando com o último que foi aberto no final de 2023, tinham sido já abertas 258 vagas. Houve um aumento de 83 lugares nos quadros legais de vagas existentes nos tribunais. São, hoje, para as instâncias tributárias de jurisdição, 145. Quanto aos quadros efetivos, houve também um aumento significativo. Eles eram 60 no final de 2010, e, no final de 2022, 128. Hoje serão mais“.

“Um aspeto que continua em falta e que também se trata de uma promessa legislativa antiquíssima, situa-se no domínio da assessoria aos magistrados. Ela está prevista há anos nos diplomas orgânicos da jurisdição administrativa e fiscal, já avançou no domínio da jurisdição comum, mas, inexplicavelmente, continua por concretizar na jurisdição tributária“, disse, ainda.

Por último, no que respeita às reformas legislativas que foram feitas neste domínio, o investigador do Lisbon Public Law explicou que a análise focou-se apenas na legislação processual: “Aí é certo que, de 2011 em diante, o código de procedimento e processo tributário sofreu mais de uma vintena de alterações, as principais em 2019 e em 2021. Mas a verdade é que nenhuma delas ainda atingiu o core daquilo que devia ser atingido, que continua muito atrás da modernidade de uma legislação processual. Portanto, nesse parâmetro talvez possa dizer que o investimento na reforma legislativa da legislação processual tributária não foi suficientemente concretizado. Tudo somado e dividido, o estudo não conclui que o investimento feito na jurisdição tributária estadual foi o devido, ele apenas conclui que é falsa a ideia de que o funcionamento de uma justiça tributária arbitral, desde 2011 até agora, significou a paralisia no investimento na justiça tributária estadual“.

A Arbitragem Tributária ao Raio-X

A conferência terminou com uma entrevista a Nuno Villa-Lobos, presidente do CAAD, dedicada ao tema “A Arbitragem Tributária ao Raio-X”, moderada por António Costa, diretor do ECO.

O presidente do CAAD começou por justificar a razão por trás do pedido deste estudo, que está relacionada, sobretudo, com a necessidade de reforçar a transparência e a integridade, “um ponto muito sensível e nunca é demais fazê-lo”. Este ponto já tinha sido trabalhado antes, quando o CAAD apresentou à Comissão de Orçamento e Finanças da Assembleia um projeto para introduzir alterações no diploma das garantias dos contribuintes, nas quais introduziram o sorteio público dos árbitros, a criação da figura do árbitro presidente com um conjunto de garantias acrescidas e, ainda, um cordão sanitário entre as funções de árbitro e as funções de árbitro quando a formação profissional seja a de advogado, “impedindo que haja uma simultaneidade entre o exercício das funções de árbitro e a possibilidade de esse árbitro ser elegível se ele próprio ou alguém do escritório de advogados tiver um processo no CAAD para ser resolvido”.

“Depois tivemos um segundo capítulo de transparência e integridade, que passou pela publicitação dos nossos relatórios anuais de atividade, com uma informação detalhada sobre o sentido de decisão. Também publicamos o sentido de decisão dos recursos e enviamos toda essa informação detalhada de cada ano de atividade, entregámo-la pessoalmente aos grupos parlamentares, entregamos também à Procuradora da República, à presidente do Supremo, à Ministra da Justiça, e ao Tribunal de Contas, portanto, aquilo que nós fazemos é prestar contas, é essa a nossa função, é isso que temos de fazer, é a nossa obrigação. E este estudo é mais uma etapa neste objetivo de transparência e de informação“, continuou.

Quanto às conclusões do estudo, Nuno Villa-Lobos acabou por tecer alguns comentários sobre cada uma. Começou pela conclusão que mostra que os contribuintes ganham mais nos tribunais arbitrais: “O estudo analisou cerca de três mil decisões dos tribunais estaduais e cerca de três mil da arbitragem tributária, no período compreendido entre 2019 e 2022. Dessas três mil decisões arbitrais, 701 não podiam ter sido decididas de outra maneira porque ou assentaram em revogações da própria administração tributária na pendência do processo, ou assentaram no cumprimento de acórdãos de uniformização de jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, ou assentaram em acórdãos do Tribunal de Justiça. Ora, se retirar o peso estatístico destas 701 decisões, o sentido de decisão passa pela ordem dos 60/40. Isso sugere que, nas decisões dos tribunais do Estado, à medida que o processo sobe, há um desfasamento de 10%. Ganha mais o Estado na primeira instância e, à medida que o processo sobe, há 10% adicionais”.

Relativamente à independência dos árbitros, o presidente do CAAD explicou que, enquanto os juízes dos tribunais do Estado estão em exclusividade, os árbitros no CAAD não estão. “Isso é uma diferença que nos obriga a sermos mais exigentes. E nós assumimos essa exigência desde o arranque da nossa atividade e temos vindo a dar passos consecutivos no sentido desse reforço. Esse trabalho está permanentemente inacabado e claro que temos estado a discutir internamente as várias recomendações do estudo, que é bastante pormenorizado e detalhado. A informação está a ser objeto de análise de vários órgãos, um deles que envolve o próprio Ministério da Justiça, mas haverá uma proposta emanada do Conselho Deontológico“, explicou.

Quais as soluções?

Quando questionado sobre possíveis soluções para apresentar aos tribunais arbitrais, Nuno Villa-Lobos prontificou-se em dizer: “Tenho propostas para melhorar o desempenho dos tribunais arbitrais que atuam em direito público, não os do CAAD. São aqueles tribunais arbitrais que existem em qualquer sítio e que podem resolver quaisquer litígios que envolvam o dinheiro público e que não estão regulamentados. E é absolutamente urgente que sejam regulamentados“.

Nesse sentido, o presidente do CAAD afirmou que já apresentou um memorando à ministra da Justiça, com um conjunto de propostas de envolvimento do próprio Tribunal de Contas na resolução dos litígios nos tribunais arbitrais, no âmbito das PPP. “Apresentei esse memorando e as minhas ideias e as ideias do CAAD estão expressas nesse documento, acho que seria fundamental”, revelou.

Em relação à justiça fiscal em geral, Nuno Villa-Lobos afirmou, ainda: “Eu acho que já não é necessário, neste momento, alterar a lei. Só é preciso uma coisa: cumpri-la. Os assessores para os juízes dos tribunais do Estado estão previstos na lei, bem como os gabinetes de apoio para os magistrados. O Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais estava previsto na lei há 20 anos, mas sabe quando foi criado? No ano passado”.

Este Conselho é, de acordo com o presidente do CAAD, “absolutamente essencial, desde logo para garantir o processo de recrutamento de juízes. Por isso, estas são as medidas para o próximo ano: regular a arbitragem, precisamente em alguns âmbitos específicos, como o das PPP, conferir-lhe publicidade, transparência, requisitos de elegibilidade para se ser árbitro, e aplicar a lei em matéria dos Tribunais Administrativos e Fiscais. Só isso: aplicar a lei“, concluiu.

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