Chamadas 760, passivo e canais concorrentes. Conheça os riscos da emissão de obrigações da SIC

A SIC anunciou uma nova emissão de dívida sustentável no valor de 30 milhões de euros. O canal de televisão da Impresa paga uma taxa bruta de 5,95%. Saiba quais são os riscos da oferta.

A SIC lançou uma oferta pública de subscrição (OPS) de obrigações sustentáveis a quatro anos, com uma taxa de cupão bruta de 5,95%. A emissão destina-se a novos investidores e a quem comprou títulos emitidos em 2021, com uma taxa de 3,95%, e os deseje trocar na operação que decorre entre os dias 16 e 28 de junho.

Antes de emprestar dinheiro a uma empresa convém conhecer os riscos de mercado, mas também do lado do emitente. Uma contração da economia, com impacto na geração de receitas associadas à utilização da linha 760, quebras de publicidade ou o surgimento de canais concorrentes, assim como riscos de liquidez de curto prazo devido ao elevado passivo são alguns dos riscos enumerados pela SIC no prospeto da OPS de obrigações.

A evolução da economia é um dos fatores que pode ter impacto nas receitas de publicidade e na participação em passatempos e programas televisivos, afetando a capacidade de geração de receitas da SIC. “O aumento da taxa de desemprego e correspondente redução do rendimento das famílias poderá resultar numa redução da procura de assinaturas de canais de televisão e de serviços conexos, bem como numa quebra nas participações nos concursos televisivos e iniciativas com participação telefónica geradoras de receitas“, aponta a empresa, no prospeto da emissão, no site da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM).

O ambiente económico e a incerteza quanto à evolução do mesmo colocam desafios ao Emitente e Oferente, na medida em que podem afetar os seus negócios, perspetivas, situação financeira e resultados operacionais, podendo ainda afetar adversamente o valor e a liquidez das Obrigações SIC 2024-2028 e a capacidade do Emitente e Oferente cumprir as suas obrigações relativamente às Obrigações SIC 2024-2028 e, em termos gerais, as suas obrigações pecuniárias.

Prospeto da OPS de obrigações da SIC

A SIC refere que “o recurso à gama de numeração “760”, no âmbito de concursos e passatempos televisivos, tem um impacto significativo nos resultados do Emitente e Oferente, já que corresponde à terceira maior fonte de receitas”. O canal de televisão recorda que a participação dos telespectadores através destas chamadas, com um custo fixo, gerou receitas de 10,7 milhões de euros, em 2023, menos 27,3% que no ano anterior. “As receitas associadas à gama de numeração “760” são voláteis, pelo que não é possível ao Emitente e Oferente garantir a respetiva manutenção em 2024 e nos exercícios subsequentes”, avisa.

Quanto às receitas de publicidade, estas representaram mais de dois terços (68%) dos proveitos operacionais consolidados da SIC, ascendendo a 106.840.771 euros, ligeiramente abaixo dos 107.792.609 euros gerados em 2022. O canal de televisão destaca que a faturação em publicidade depende da liderança de audiências, da capacidade para produzir e/ou adquirir direitos de difusão de conteúdos do interesse generalizado do grande público e atrair espetadores, bem como da disponibilidade das empresas que procuram o Emitente e Oferente para, através dos Canais SIC, realizar atividades publicitárias das suas marcas, produtos e serviços e continuar a efetuar investimentos publicitários utilizando para o efeito Canais SIC. E este ano a SIC perdeu a liderança para a TVI, já pelo quarto mês consecutivo, desde fevereiro deste ano.

“O ambiente económico e a incerteza quanto à evolução do mesmo colocam desafios ao Emitente e Oferente, na medida em que podem afetar os seus negócios, perspetivas, situação financeira e resultados operacionais, podendo ainda afetar adversamente o valor e a liquidez das Obrigações SIC 2024-2028 e a capacidade do Emitente e Oferente cumprir as suas obrigações relativamente às Obrigações SIC 2024-2028 e, em termos gerais, as suas obrigações pecuniárias”, alerta o prospeto.

Uma vez que a liderança de audiências – a SIC liderou as audiências durante 60 meses consecutivos – é um fator que “tem uma relevância muito significativa no negócio, nomeadamente como fator gerador de receitas decorrentes de publicidade”, “o sucesso do seu negócio está, por conseguinte, muito dependente da sua posição face aos seus concorrentes diretos no mercado televisivo, bem como da eventual entrada de novos concorrentes no mercado audiovisual nacional, independentemente dos meios e das plataformas de distribuição utilizadas, ou da natureza dos serviços em causa”.

A SIC detalha ainda riscos relativos a instalações e infraestruturas e o risco de interrupção de emissão dos canais de televisão SIC, uma vez que é fundamental assegurar a transmissão e “continuidade da emissão de canais SIC é essencial para o normal desenvolvimento das atividades e do negócio“.

Passivo elevado pode causar problemas de liquidez

Outro dos fatores que poderá originar problemas na atividade da empresa e, eventualmente, no reembolso futuro do dinheiro das obrigações está relacionado com o elevado passivo detido pela dona da SIC, a Impresa. “Por referência a 31 de dezembro de 2023, o ativo corrente correspondia a €53.110.244, enquanto o passivo corrente ascendia a €128.175.873. Em 31 de dezembro de 2023, o passivo corrente consolidado do Acionista Único é superior ao ativo corrente consolidado em €75.065.629″, aponta o prospeto. “Acresce referir que parte significativa do passivo corrente respeita a contas correntes caucionadas e descobertos bancários (16,5% em 2023), automaticamente renováveis, não obstante poderem ser canceladas ou denunciadas pelos bancos“.

Há outro risco relevante identificado no prospeto da operação: A Impresa tem um empréstimo contraído em 2005 junto do BPI da ordem dos 21 milhões de euros, primeiro através de uma sociedade que, em 2015, foi integrada na Impresa. “Para
garantir o integral cumprimento pelo Acionista Único das obrigações emergentes deste empréstimo, o Acionista Único subscreveu uma livrança em branco e foi adicionalmente constituído penhor sobre as ações representativas de 100% do capital social da SIC”. Acresce que a família Balsemão deve manter o controlo da SIC através da holding pessoal, Impreger, nunca “abaixo de 50,01% do seu capital social”.

A existência de um passivo corrente superior ao ativo corrente tem consequências adversas no que respeita à liquidez financeira do Acionista Único, na medida em que qualquer destas entidades poderá não dispor da liquidez necessária para fazer face aos seus compromissos de curto prazo.

Prospeto da OPS de obrigações da SIC

A empresa justifica esta situação financeira com o ciclo financeiro de exploração das empresas do setor de media, em virtude de o prazo médio dos recebimentos ser substancialmente inferior ao prazo médio dos pagamentos. No entanto, admite que “a existência de um passivo corrente superior ao ativo corrente tem consequências adversas no que respeita à liquidez financeira do Acionista Único, na medida em que qualquer destas entidades poderá não dispor da liquidez necessária para fazer face aos seus compromissos de curto prazo”.

Ainda no que diz respeito à atividade da empresa, a SIC nota que, segundo o Observatório Europeu do Audiovisual, a expectativa é que a tendência de expansão dos serviços video on demand (VOD) em termos de adesão por parte dos consumidores europeus e de crescimento em termos assinantes e receitas se mantenha durante o ano de 2024, o que coloca desafios à televisão tradicional. Para responder a estas tendências, a SIC lançou “no mercado a Opto, uma plataforma de streaming pioneira na venda de subscrições de conteúdos audiovisuais exclusivos cujo sucesso depende da diversidade e atratividade dos conteúdos a divulgar”.

Risco de taxas de juro e mercado

Outro dos riscos apontados pela SIC tem que ver com o agravamento das taxas de juro, o que poderá forçar a empresa ou o seu acionista, a Impresa, “a contratar financiamentos e/ou refinanciamentos com condições menos favoráveis do que os atuais, o que, por sua vez, pode ter um impacto negativo nos resultados”.

“Caso as taxas de juro de mercado tivessem sido superiores ou inferiores em 1% durante os exercícios findos em 31 de dezembro de 2023, o resultado líquido daqueles exercícios teria diminuído ou aumentado em aproximadamente €453.000, não considerando o respetivo efeito fiscal”, quantifica.

A existência de processos judiciais contra o canal de televisão também pode penalizar as contas do grupo de media. “O desfecho adverso deste ou de qualquer outro processo judicial, arbitral ou administrativo, em curso no presente ou que venha a ser iniciado no futuro, poderá afetar negativamente a sua reputação e ter um impacto adverso nos negócios“, reconhece.

Sendo a Impresa uma empresa cotada em bolsa, uma eventual mudança de controlo acionista “poderá ter impacto na estratégia societária, nos principais mercados onde atua, e nas suas operações, negócios e recursos, podendo ter um efeito adverso nos negócios”.

A SIC destaca ainda riscos decorrentes da inter-relação entre a performance económica e financeira do Emitente e Oferente e do Acionista Único (Impresa). “O Emitente e Oferente integra-se no Grupo Impresa e estabelece relações com várias empresas compreendidas no Grupo Impresa. Fruto dessa integração, e da consequente relação de grupo ou de domínio estabelecida entre o Emitente e Oferente e outras sociedades com a Impresa, o Emitente e Oferente concedeu dois financiamentos ao Acionista Único que, por referência a 31 de dezembro de 2023, ascendem a €55.000.000 e €30.000.000, que vencem em 31 de maio e 31 de dezembro de 2029, respetivamente”, aponta a empresa. O total dos dois financiamentos ascende a 85 milhões de euros, o equivalente a cerca de 4 vezes o valor dos capitais próprios da SIC.

O período de subscrição das obrigações da SIC arranca na próxima segunda-feira e decorre nas duas semanas seguintes.

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