BRANDS' ECO “A independência energética na Europa é um tema relevante e atual”

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  • 3 Setembro 2024

"Implica reduzir a dependência de fontes externas de energia que, na grande maioria, são importadas de regiões politicamente instáveis", analisa Luis Pinho, Country Director Helexia.

Luis Pinho, Country Director Helexia

O desenho de novas regras, a diversificação de investimentos e a incorporação das tecnologias mais recentes pelos principais stakeholders da área da energia vão trazer impactos no futuro deste setor. Entre os principais temas em discussão está a independência energética da Europa ou a participação de Portugal nas redes/interconexões internacionais e na integração de renováveis na rede elétrica.

A Conferência Energy 2024, que vai acontecer já no dia 12 de setembro, das 9 horas às 13h00, no CCB, em Lisboa, pretende debater todas estas questões relacionadas com a transição energética. Para isso, contará com vários especialistas da área, nomeadamente Luis Pinho, Country Director Helexia, que partilhou o seu ponto de vista sobre alguns dos temas que irão ser debatidos na conferência.

A Conferência Energy 2024 vai abordar vários temas, entre eles o das novas tecnologias e da transição energética. Com todo o avanço tecnológico que se tem vindo a fazer, o que justifica não haver uma maior rapidez na transição energética?

Colocar a questão do lado da tecnologia parece-me demasiado simplista. Já existe tecnologia suficientemente madura e com preços competitivos para dar suporte através de várias fontes renováveis (sol, vento e água). A transição energética é uma mudança e comporta em si mesmo a necessidade de vencer a nossa tendência natural – ou aversão – à mudança. Temos que falar dela, mais e mais. Temos que ser persistentes na aculturação da necessidade -nossa e das gerações seguintes – em fazer a transição! Temos, acima de tudo, que educar as novas gerações para esta necessidade, só assim iremos capacitar e promover a mudança que se nos impõe.

Naturalmente, existem entropias que atrasam a capacidade dos operadores de mercado de desenvolver e implementar projetos. Por exemplo, a capacidade de regular ou agilmente adaptar a regulação à evolução das tecnologias, por um lado, mas também, depois, a capacidade de resposta das várias entidades envolvidas (regulação, certificação, etc) em tempo útil, ou pelo menos em respeito dos prazos e tramites estipulados.

"Existem entropias que atrasam a capacidade dos operadores de mercado de desenvolver e implementar projetos.”

Luis Pinho, Country Director Helexia

Acima de tudo, entendo haver necessidade urgente de diálogo e capacidade que não nos isole a cada um nas “nossas” tecnologias e colaborarmos proativamente na criação de soluções multi-tecnologia, que otimizem a resposta, mitiguem a intermitência normal e anormal das fontes renováveis e, também, que não alimentem discussões que tendem a ser estéreis para este problema, que é tão transversal e que requer, por isso, complementaridade nas soluções a implementar. Enquanto estas questões estiverem em cima da mesa, a solução (aparentemente) mais fácil, será sempre o business as usual.

A independência energética na Europa será outro dos temas do evento. É possível que o caminho do futuro seja mesmo por aqui? E o que implica tomar essa direção?

A independência energética na Europa é um tema relevante e atual. Implica reduzir a dependência de fontes externas de energia, como o gás natural e o petróleo que, na grande maioria, são importadas de regiões politicamente instáveis. Este caminho pode ser o futuro, especialmente considerando os recentes desenvolvimentos geopolíticos e a necessidade urgente de combater as alterações climáticas.

Assumir o caminho da independência energética envolve várias implicações:

  1. Desenvolvimento e implementação de capacidade de produção renovável: A Europa terá que investir massivamente em energias renováveis, como a solar, eólica e hídrica, mas não só na instalação, como acima de tudo na capacidade de desenvolver e produzir a tecnologia. Pensarmos em independência energética e depender dos equipamentos de um qualquer outro concorrente europeu, parece-me utópico;
  2. Inovação Tecnológica: Será necessário promover a inovação tecnológica para melhorar a eficiência energética e desenvolver novas formas de armazenamento de energia. O armazenamento é um dos grandes desafios, para combater a intermitência das fontes renováveis. A capacidade de armazenar energia para uso posterior é crucial;
  3. Infraestruturas e Redes: A criação de infraestruturas adequadas para suportar a produção e distribuição de energia renovável é essencial. Isso inclui a modernização das redes elétricas e a integração de tecnologias inteligentes para gerir a oferta e a procura de energia de forma eficiente;

    "A transição energética é um equilíbrio delicado entre a necessidade de descarbonização e a garantia de segurança energética para os consumidores. Porém o “isolacionismo” energético representa também um enorme risco de segurança.”

    Luis Pinho, Country Director Helexia
  4. Políticas e Regulação: A implementação de políticas e regulamentos que incentivem a transição energética é fundamental. Isso pode incluir apoios para novas tecnologias, que devem resultar da transferência de impostos sobre emissões de carbono;
  5. Cooperação Internacional: A independência energética não pode significar isolamento. A Europa pode beneficiar de parcerias internacionais para partilhar tecnologias, recursos e conhecimentos. A participação de Portugal nas redes internacionais, por exemplo, pode trazer benefícios significativos, como o acesso a mercados mais amplos e a partilha de melhores práticas;
  6. Impacto Económico e Social: A transição para a independência energética terá impactos económicos e sociais. Vai criar novos empregos em setores como a energia renovável e a eficiência energética, mas também pode exigir a requalificação de trabalhadores de setores tradicionais. Acima de tudo, temos a obrigação de promover de forma rápida a requalificação de trabalhadores de setores menos atrativos ou em tendência decrescente de evolução, para suportar a necessidade massiva de recursos, competentes e motivados.

Em resumo, a independência energética na Europa é um caminho promissor, mas que exige um esforço coordenado e investimentos significativos. A transição energética é um equilíbrio delicado entre a necessidade de descarbonização e a garantia de segurança energética para os consumidores. Porém o “isolacionismo” energético representa também um enorme risco de segurança.

Também se coloca a hipótese da participação de Portugal nas redes internacionais. Quais os benefícios desta escolha?

Portugal tem vantagens exógenas incríveis, temos abundância de recursos renováveis que nos permitem construir capacidade e independência. Num mercado cada vez mais global, a participação nas redes internacionais será sempre um contributo para melhor gestão da nossa capacidade de geração, mas também melhor gestão das intermitências. Para além disso, a participação nestas redes internacionais, promove discussão, diálogo, partilha de conhecimento e experiências será sempre, por isso, um forte contributo ao desenvolvimento sustentável.

Ao longo do evento, haverá, ainda, espaço para alguns debates. O primeiro abordará o equilíbrio difícil entre transição e segurança elétrica. O que o torna um equilíbrio difícil?

Falamos de uma mudança, que é estrutural e, embora possa parecer irrelevante ou até passar despercebida para a grande maioria dos consumidores de energia, tem sérias implicações no equilíbrio do sistema tal como ele foi desenhado e na sua capacidade de adaptação. Dito de outra forma, tem que ser uma mudança ao mesmo ritmo, quer do lado da produção mas também da distribuição e da capacidade do operador da rede de garantir equilíbrio do fornecimento. Ninguém está preparado ou “disponível” para ficar às escuras se estivermos num ano de seca, num período sem vento, e ao mesmo tempo sem sol… É, por isso, absolutamente essencial que mecanismos de equilíbrio, como armazenamento e potência disponível, possam ser “ativados” em caso de outros recursos não estiverem disponíveis.

"É, por isso, absolutamente essencial que mecanismos de equilíbrio, como armazenamento e potência disponível, possam ser “ativados” em caso de outros recursos não estiverem disponíveis.”

Luis Pinho, Country Director Helexia

É também importante que o modo de operar do mercado e de definição do preço de energia seja revisto. O mix energético mudou e isso tem sérios impactos para todos os operadores em todas as fases da cadeia de valor. Por isso, para além da agilidade regulatória, temos que assegurar também a agilidade da evolução da rede de distribuição e dos mecanismos de preço de energia. Esta não é uma corrida de 100 metros unipessoal, é uma corrida de fundo em modo estafetas, e em que todos têm que estar bem coordenados para chegar à meta de forma rápida e segura.

Outro dos desafios a debater no evento será o do armazenamento. O que torna esta opção tão complicada?

O armazenamento de energia é um componente crucial, principalmente para dar resposta aos constrangimentos da intermitência da geração renovável. É também, atualmente, um dos maiores desafios na transição energética. Deixo aqui alguns dos desafios que entendo como pertinentes e que requerem esforços concertados para soluções eficazes, eficiente e equilibradas:

Desafios do Armazenamento de Energia:

  • Intermitência das Energias Renováveis: Fontes de energia como a solar e a eólica são intermitentes, ou seja, não produzem energia de forma constante. O armazenamento é necessário para garantir um fornecimento contínuo, mas as tecnologias atuais ainda enfrentam limitações em termos de capacidade e eficiência;
  • Custo Elevado: As tecnologias de armazenamento, como baterias de lítio, ainda são caras. Embora os custos estejam a diminuir, o investimento inicial é significativo, o que pode ser um obstáculo para a implementação em larga escala;
  • Infraestrutura e Logística: A criação de uma infraestrutura adequada para o armazenamento de energia requer tempo e recursos. Além disso, a logística de integrar sistemas de armazenamento com a rede elétrica existente ser seguramente complexa.
  • Durabilidade e Ciclo de Vida: As baterias e outros sistemas de armazenamento têm uma vida útil limitada e degradam-se com o tempo, e ciclos de utilização necessitando de substituições e manutenção frequentes.
  • Impacto Ambiental: A produção e o descarte de baterias podem ter impactos ambientais significativos. É imperativo assegurar métodos sustentáveis em toda a cadeia de valor desde a extração até à produção e reciclagem de baterias.

    "O armazenamento de energia é peça chave e essencial para a transição energética, mas enfrenta desafios significativos. No entanto, com investimentos contínuos em pesquisa e desenvolvimento, será possível superar estas barreiras e criar um sistema energético mais sustentável e eficiente.”

    Luis Pinho, Country Director Helexia

Soluções e Inovações:

  • Armazenamento com Bombagem Hidráulica: Utiliza a energia excedente para bombear água para um reservatório elevado, que depois é libertada para gerar eletricidade quando necessário.
  • Armazenamento Térmico: Armazena energia na forma de calor, que pode ser convertido em eletricidade posteriormente.
  • Baterias de Fluxo: Oferecem uma alternativa às baterias de lítio, com maior durabilidade e capacidade de armazenamento.

Concluo que o armazenamento de energia é peça chave e essencial para a transição energética, mas enfrenta desafios significativos. No entanto, com investimentos contínuos em pesquisa e desenvolvimento, será possível superar estas barreiras e criar um sistema energético mais sustentável e eficiente.

Descarbonização e preço para os consumidores serão outros temas em debate. Pode avançar algum detalhe do que será abordado nestes tópicos?

Acredito que a objetividade e transparência são fundamentais para assegurar a adesão à transição energética. Por um lado, já temos hoje tecnologias como o solar (centralizado ou descentralizado) com preços competitivos e assumimos como objetivo último a descarbonização e, no curto prazo, vamos necessitar de tecnologias ainda pouco maduras ou em desenvolvimento. Isso implicará necessariamente um custo que terá que ser transferido ao consumidor final. Como operadores globais da transição energética, quanto melhor formos capazes de fazer passar esta mensagem, mais os consumidores terão “disponibilidade” para aceitar estes custos adicionais. Falharmos este exercício implicará seguramente atraso na implementação e/ou necessidade de apoios ou subsídio. Aqui também são escolhas políticas, mas para as quais devemos ser parte interessada e comprometida no esclarecimento e boa informação.

Quais os frutos que se podem esperar deste evento?

Partilha, diálogo e formas cada vez mais colaborativas de ação entre diferentes players.

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