O relatório de Draghi sobre a competitividade na UE em 9 gráficos
Perante uma Europa que caminha para a estagnação, Draghi diz ser urgente fechar o 'gap' de inovação face aos EUA e à China, coordenar esforços e políticas entre os 27 e apostar na segurança e defesa.
A União Europeia está a perder terreno para a China e os Estados Unidos, não só em termos de investimento como também produtividade, sendo por isso necessário que os 27 Estados-membros se reinventem para voltar a estar em condições de competir com estes mercados.
Para tal, será necessário que o bloco europeu invista 5% do PIB por ano, cerca de 800 mil milhões de euros, em áreas estratégicas para que a produtividade aumente 6% num prazo de 15 anos. Como? A emissão de dívida regular conjunta é uma das soluções identificadas. Este é o diagnóstico foi feito por Mario Draghi, ex-presidente do Banco Central Europeu, e entregue à presidente da Comissão Ursula von der Leyen numa altura em que o novo executivo se prepara para iniciar funções no final do ano. A expectativa é de que as recomendações do antigo primeiro-ministro italiano sejam adotadas e comecem a produzir efeitos nos próximos cinco anos.
“O relatório pede por mudanças radicais que terão de ser implementadas de forma urgente e concreta”, apelou Mario Draghi, esta segunda-feira, durante a apresentação do documento de 400 páginas que contém 170 medidas que terão como objetivo “Não estaremos a começar do zero. Temos as bases, só temos de agir. Será uma questão de fazer isto ou será uma agonia lenta”, avisou.
Mas de que forma a Europa fica para trás em relação à China e aos Estados Unidos? O ECO explica em 9 gráficos
PIB
Os Estados Unidos são atualmente o mercado que representa a maior fatia do PIB mundial. São mais de 25%, distanciando-se da China e da União Europeia, ambos com 17%, cada um. Este intervalo nos valores tem vindo a agravar-se desde o início do milénio.
Desde 2002, que o intervalo do crescimento do PIB entre a União Europeia e os Estados Unidos tem vindo a aumentar. Draghi alerta no relatório que este abrandamento é impulsionado pelo enfraquecimento do crescimento da produtividade, pondo em causa a capacidade da Europa para realizar as suas ambições.
Desde logo, a neutralidade carbónica, a inclusão social e a relevância geopolítica, metas que dependem fortemente de taxas sólidas de crescimento económico. Olhando para os dados, é evidente que o crescimento económico da UE tem sido persistentemente mais lento do que o dos EUA, enquanto a China tem vindo a recuperar rapidamente o seu atraso.
O fosso entre a UE e os EUA no que respeita ao nível do PIB a preços de 2015 aumentou gradualmente, passando de pouco mais de 17% em 2002 para 30% em 2023, enquanto numa base de paridade do poder de compra (PPC), registou-se uma diferença de 12%.
Indústria
Segundo Draghi, um dos obstáculos que impedem um maior crescimento económico advém dos elevados preços de energia na Europa, isto numa altura em que as metas para a descarbonização aproximam-se de prazos relevantes (2030, 2040 e 2050). Desde o início da guerra na Ucrânia, que a UE tem vindo a reduzir a dependência do gás natural russo.
Dados mais recentes indicam que a a quota do gás russo nas importações da União Europeia (UE) caiu de 45% em 2021 para 18% em junho de 2024. E embora os preços da energia tenham baixado consideravelmente desde os picos verificados em 2022, as empresas europeias continuam a ter de suportar preços da eletricidade que são até três vezes superiores aos dos EUA. Já os preços do gás natural são até cinco vezes mais caros do que nos Estados Unidos.
Políticas comerciais
As décadas de globalização produziram um elevado nível de “interdependência estratégica” entre as principais economias. No entanto, este equilíbrio global está a mudar: todas as grandes economias estão atualmente a reduzir a sua dependência de outros mercados, procurando aumentar a sua margem de ação independente, alerta Draghi.
Sobretudo nos Estados Unidos e a China, que através de políticas combinam incentivos fiscais e apoios estatais. E isso está refletivo no crescimento das politicas comerciais de natureza protecionista a nível global.
População e produtividade
Um dos maiores alertas deixado por Draghi prende-se com a quebra de produtividade. Depois de a UE ter conseguido convergir com a produtividade dos EUA, em 1945, o bloco europeu viu este ritmo abrandar. E segundo Draghi, esta tendência deverá manter-se face às previsões de que a UE perderá cerca de dois milhões de trabalhadores por ano.
Perante esta trajetória, Draghi não deixa margens para dúvidas: “O crescimento na Europa irá estagnar”. “Num contexto de rácios da dívida pública em relação ao PIB historicamente elevados, de taxas de juro reais potencialmente mais elevadas do que as registadas na última década e necessidades crescentes de despesas com a descarbonização, a digitalização e a defesa, a estagnação do crescimento do PIB poderá levar a que os níveis da dívida pública se tornem insustentáveis e a Europa seja forçada a a desistir de um ou mais destes objetivos“, alerta o relatório.
Investimento e inovação
Além da quebra na produtividade, também a inovação está aquém do esperado, resultado de um fraco investimento. Segundo a análise de Draghi, nas últimas duas décadas, as três maiores empresas americanas que apostam em investigação e inovação (I&I) passaram das indústrias automóvel e indústria farmacêutica na década de 2000, para as empresas de software e hardware na década de 2010 e depois para o setor digital na década de 2020.
Em contrapartida, a estrutura industrial da Europa permaneceu estática, com as empresas do setor automóvel a dominarem sistematicamente o top 3 das empresas que mais gastam em I&I. Por outras palavras, a economia dos EUA fomentou tecnologias novas e inovadoras e o investimento acompanhou-as. Na Europa, o investimento manteve-se concentrado em tecnologias maduras e em setores em que as taxas de crescimento da produtividade das empresas de ponta estão a abrandar.
Empresas
Para Draghi, existe uma ausência inegável de um verdadeiro mercado único na União Europeia, o que, por seu turno, impede que um número suficiente de empresas da economia em geral atinja dimensão suficiente para acelerar a adoção de tecnologias avançadas. “A União Europeia está presa e povoada de empresas tecnológicas medianas que já estão maduras”, alertou o economista italiano.
A justificação para este problema prende-se com os elevados obstáculos que obrigam às empresas a “manterem-se pequenas”. Entre eles, a falta de harmonia entre as regulamentações nacionais e as exigências para o cumprimento das obrigações fiscais. Em consequência, a UE tem proporcionalmente menos pequenas e médias empresas do que os EUA e, proporcionalmente, mais microempresas.
Defesa
A indústria de defesa europeia não só sofre de um fraco nível de investimento, como também sai prejudicada por uma falta de desenvolvimento tecnológico. Os dados indicam que a despesa total com a defesa na UE é cerca de um terço da dos EUA e que esta não está orientada para a inovação, ao contrário dos EUA. Naquele país, foi dada prioridade às despesas de I&D em relação a todas as outras categorias de despesas militares desde 2014.
Em 2023, foram alocados 130 mil milhões de euros (140 mil milhões de dólares) à investigação, desenvolvimento, ensaios e avaliação, o que corresponde a cerca de 16% das despesas totais com a defesa. Assim, Draghi estima que se todos os Estados-membros da UE que são membros da NATO atingissem a meta de investir 2% do PIB em defesa já este ano, a capacidade de investimento aumentaria em 60 mil milhões de euros. Em junho de 2024, a Comissão estimou que são necessários investimentos adicionais na defesa de cerca de 500 mil milhões de euros durante a próxima década.
Dívida
As necessidades de financiamento para que a UE cumpra os objetivos assumidos pelo bloco são, de facto, enormes. Será necessário um investimento anual de 750 a 800 mil milhões de euros entre os 27 Estados-membros, o que corresponde a 4,4-4,7% do PIB da UE em 2023.
Assim, Mario Draghi sugere que se recupere o que se fez durante a pandemia, com o mecanismo de recuperação e resiliência, e que se volte a pedir aos 27 Estados-membros uma emissão de dívida conjunta fazendo deste instrumento uma solução para ajudar na recuperação da competitividade na UE.
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