Deco e associações de doentes apresentam queixa à Provedora de Justiça sobre lei do esquecimento
“Esta lei foi um passo importantíssimo, mas o processo está incompleto”, disse jurista Margarida Moura da DECO, questionando: “Para que serve um direito que não se consegue exercer”.
A Deco e organizações de doentes apresentam esta quinta-feira uma queixa à Provedora de Justiça a exigir a regulamentação da lei do “direito ao esquecimento” que assegura o acesso ao crédito e seguros associados a pessoas que superaram doenças graves.
“É uma lei do final de 2021, que entrou em vigor [1 de janeiro] em 2022, que visa reforçar o acesso ao crédito e a contratos de seguro que estão associados a contratos de crédito à habitação e também a contratos de crédito ao consumidor por parte de pessoas que tenham superado ou mitigado situações de risco agravado de saúde”, disse à agência Lusa a jurista Margarida Moura, da Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor (Deco).
Contudo, a lei ainda não foi regulamentada, o que levou a Deco, a Acreditar – Associação de Pais e Amigos das Crianças com Cancro, associação de pais e amigos das crianças com cancro, a Liga Portuguesa Contra o Cancro, o Grupo de Ativistas em Tratamentos (GAT) e a SER+ Associação Portuguesa para a prevenção e Desafio à Sida a apresentar a queixa, na semana em que é celebrado o Dia Mundial da Segurança do Doente.
Os subscritores pedem na queixa à Provedora de Justiça que emita uma recomendação ao Governo para regulamentar, por decreto-lei, a Lei do Esquecimento.
A lei previa que a regulamentação fosse feita através de um acordo nacional celebrado entre o Estado e as “partes envolvidas” (associações representativas das instituições financeiras e seguradoras e organizações de doentes). Na falta de acordo, a regulamentação seria aprovada por decreto-lei, mas não se estabelecia qualquer prazo para o efeito.
“O legislador ainda tentou corrigir a situação, porém, fê-lo de forma incompleta e tardia: a Lei do Orçamento do Estado para 2024 veio fixar um prazo de seis meses para a celebração do acordo, findo o qual, na sua ausência, a regulamentação deveria ser aprovada por decreto-lei. Esse prazo terminou a 30 de junho. Até hoje, nem acordo, nem decreto-lei”, alertam as organizações em comunicado.
À Deco e às organizações de doentes continuam a chegar pedidos de informação de pessoas que são sobreviventes de cancro ou que vivem com VIH e enfrentam dificuldades na contratação do seguro de vida associado ao crédito para habitação.
“Esta lei foi um passo importantíssimo, mas o processo está incompleto”, disse Margarida Moura, questionando: “Para que serve um direito que não se consegue exercer”.
“Se continuarmos a ter uma pessoa que seja, que superou ou mitigou uma situação de risco agravado de saúde (…) discriminada, é porque ainda falta alguma coisa por fazer”, sustentou.
Margarida Moura explicou que a lei “veio proibir que estas pessoas vejam os seguros agravados” e as garantias desses mesmos seguros excluídas.
Também vem proibir que, após determinado tempo de terem terminado os tratamentos ou de terem desenvolvido determinados tratamentos, sejam recolhidas informações médicas relativas à situação de risco agravado de saúde ou de deficiência, em contexto pré-contratual.
A regulamentação irá definir, entre outros, a informação obrigatória a divulgar nos sítios da internet pelas instituições de crédito e seguradoras e fixar uma grelha de referência que permitirá definir termos e prazos mais favoráveis do que os definidos na legislação, para cada patologia ou incapacidade.
“A ausência de regulamentação tem favorecido a adoção de práticas discriminatórias para com as pessoas que a lei do Esquecimento, supostamente, deveria proteger e beneficiar. Além disso, gera insegurança jurídica: estes cidadãos, quando vão contratar créditos e seguros associados, nunca sabem o que os espera”, realçam.
Para Margarida Moura, seria importante que as associações de doentes e Deco fossem também ouvidas no âmbito da aprovação desta regulamentação, “que é urgente”.
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